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terça-feira, 10 de dezembro de 2019

SÉRGIO MORO, PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA E OUTRAS QUESTÕES



Não sei se Sérgio Moro está arrependido de abrir mão de vinte e tantos anos de carreira na magistratura para assumir o ministério da Justiça com a promessa de ser indicado para a primeira vaga que se abrir no STF, ou se realmente pretende aproveitar sua enorme popularidade para disputar presidência (ou outro cargo eletivo qualquer) em 2022. Mas salta aos olhos que ele está cada vez menos "juiz" e mais "político".

Em vez de criticar os parlamentares que desidrataram seu pacote anticrime e anticorrupção, Moro prosseguiu em seu périplo pelo Congresso, buscando apoio para reincluir, no Senado, a prisão em segunda instância via alteração do Código de Processo Penal, que tem tramitação mais célere que a de uma PEC e pode ser terminativo na própria CCJ — a não ser que oito ou mais senadores peçam expressamente, o assunto não precisa ir a plenário.

Nada impede que o tema seja tratado das duas maneiras, sem que o projeto de lei do Senado prejudique a emenda constitucional da Câmara. A presidente da CCJ, senadora Simone Tebetpautou a votação para hoje, e um documento assinado por 43 senadores, pedindo que o assunto siga adiante sem esperar a decisão da Câmara, nos leva a supor que a aprovação ocorra sem maiores problemas.

Também foram de caráter eminentemente político a declaração do ex-juiz sobre sua intenção de não disputar a presidência em 2022 (segundo ele, o lugar é do general Mourão) e sua fala sobre a tragédia na favela de Paraisópolis (ou comunidade, como prefere a patrulha do politicamente correto), na qual ele favoreceu Bolsonaro, mas criou arestas com o governador João Doria (que lhe havia oferecido guarida quando sua relação com o instável e imprevisível capitão caverna parecia ter desandado).

Para encerrar, mais uma pergunta que não quer calar: Será que Bolsonaro recruta seus ministros e funcionários e membros do primeiro escalão em algum manicômio? A pastora Damares Alves levanta esta suspeita — aliás, por que cargas d'água precisamos de um Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos? Outro exemplo é o ministério da Educação, originalmente comandado pelo luminar Ricardo Vélez Rodríguez, posteriormente substituído por Abraham Weintraub, outro portento que só caiu porque a imprensa pediu sua cabeça e o presidente, por enquanto, não lhe quis dar esse gostinho.

Outros caso digno de nota: Sérgio de Camargo, nomeado para a Fundação Palmares, teve a posse suspensa pela Justiça por defender a extinção do movimento negro e afirmar que a escravidão foi terrível, mas benéfica para os descendentes, já que negros viveriam em condições melhores no Brasil do que na África. Ele defendeu também o fim do feriado do Dia da Consciência Negra, que, em sua opinião, foi instituído para o “preto babaca” que é um “idiota útil a serviço da pauta ideológica progressista”. Segundo Camargo, há no Brasil um racismo “Nutella”, enquanto nos Estados Unidos o racismo seria “real”. “A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”, disse.

Embora fuja ao escopo desta postagem, cito ainda o curioso caso do procurador do Ministério Público Estadual do Pará Ricardo Albuquerque, que causou polêmica ao dizer, numa palestra a alunos de direito de uma universidade privada que “a escravidão só existiu no Brasil porque os índios não gostavam de trabalhar" (e foi afastado do cargo no último dia 5). Classifico esse episódio de "curioso" porque era justamente isso que os professores ensinavam nos anos 1960. Vai ver que a patrulha do politicamente correto reescreveu esse capítulo da nossa história e eu não fiquei sabendo...

sexta-feira, 5 de abril de 2019

A PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA, A PEC DA PREVIDÊNCIA E A TCHUTCHUCA DE DIRCEU JÚNIOR



Ontem pela manhã o presidente do STF despautou o julgamento das ADCs que tratam da prisão após condenação em segunda instância. Oficialmente, Toffoli atendeu a um pedido da OAB — que é autora de uma das ações — que disse precisar de mais tempo para analisar o assunto. Nos bastidores, porém, fala-se que o adiamento se deveu, primeiro, ao fato de que Toffoli, quando pautou o julgamento, imaginava que até abril o STJ já teria apreciado o recurso de Lula; segundo, ao receio da ala garantista de que sus colegas punitivistas formassem maioria e mantivessem o entendimento atual (clique aqui para mais detalhes sobre as mudanças na jurisprudência e aqui para ouvir a opinião de Merval Pereira). Vamos ver se agora o STJ se mexe, porque esse indefinição já está enchendo o saco.

O ministro Paulo Guedes foi enxovalhado por um grupelho de esquerdopatas na audiência de quarta-feira na CCJ da Câmara dos Deputados — que, aliás, deveria focar a análise da  constitucionalidade da proposta de reforma previdenciária, já que o mérito será avaliado mais adiante, na Comissão Especial. Mas isso não impediu que os deputados de esquerda — alguns munidos de cartazes com os dizeres PEC da Morte, Pé na Cova e outras bobagens — tumultuassem a sessão de forma grotesca, aproveitando-se do absenteísmo dos parlamentares supostamente alinhados com o governo e que reconhecem a importância — ou a inevitabilidade — da reforma.

Guedes foi literalmente atirado às feras — não vou dizer leões para não ofender o rei dos animais — sem que ninguém o defendesse. Ele engoliu diversos sapos, mas paciência tem limite. Quando o deputado Zeca Dirceu — filho de certo dublê de guerrilheiro de araque, rapinador do Erário e condenado a quase 30 anos de cadeia — o acusou de ser “tigrão” para cortar aposentadorias de trabalhadores e “tchutchuca” para cortar privilégios de ricos e banqueiros do país, Guedes perdeu as estribeiras: "Tchutchuca é a mãe, é a avó, respeita as pessoas. […] Isso é ofensa. Eu respeito quem me respeita. Se você não me respeita, não merece meu respeito."  Ato contínuo, o ministro deixou o recinto, e o presidente da comissão encerrou a sessão (confira no vídeo que encabeça este post).

Dezessete dos 24 deputados que dirigiram perguntas ao ministro ao longo das intermináveis 7 horas de sessão eram da oposição. O centrão e seus satélites não deram um pio, porque ainda não ouviram de Bolsonaro o que o governo tem a lhes oferecer em troca de apoio à reforma. Guedes esfregou na fuça dos adversários os erros e as omissões dos governos de Lula e Dilma. Em outras circunstâncias, bate-bocas como esses serviriam para quebrar a monotonia; no cenário atual, todavia, dada a relevância da reforma em questão, eles são inadmissíveis.

Como bem resumiu Josias de Souza, ficou sobejamente demonstrado que do mato do PT já não sai coelho, saem cobras, lagartos e Zeca Dirceu. Quando falam, os petistas dão a impressão de que procuram ideias desesperadamente, como cachorros que esconderam ossos e esqueceram a localização do esconderijo. O PT não aprendeu a lição das urnas de 2018. Empenhada em desqualificar o ministro e a proposta de reforma previdenciária, a patuleia esqueceu de qualificar o partido como uma força política habilitada a retornar ao Planalto. Sobre o tema, o brilhante professor e candidato derrotado à presidência, Fernando Haddad, eterno boneco de ventríloquo do presidiário de Curitiba e sem emprego conhecido desde outubro, produziu a seguinte pérola em entrevista ao canal no YouTube inaugurado por Lindbergh Farias e Vanessa Grazziotin:

“O Brasil é muito maior que esse projeto que está no poder. O Bolsonaro representa um retrocesso muito grande no imaginário do brasileiro em relação ao seu próprio país. Eles não estão no poder há três meses: o que o Bolsonaro representa está há três anos no poder. O Paulo Guedes é um Michel Temer radical, um Henrique Meirelles radical. A gente cobra resultado porque faz três meses que eles prometeram que a PEC do Teto e a reforma trabalhista iam resolver os problemas. Eles vivem mentindo para as pessoas”. O ex-prefeito de um só mandato parece ter esquecido que Michel Temer foi duas vezes vice de Dilma, e que Henrique Meirelles presidiu o Banco Central nos 8 anos do governo Lula.  

Em algum momento de sua trajetória política, Bolsonaro disse que “o único erro [do governo militar] foi torturar e não matar” — referindo-se aos comunistas em geral e a FHC em particular. Diante de situações como a que presenciamos ontem, eu me pergunto se ele não tem razão.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

E LA NAVE VA — PARTE V



A audiência pública na CCJ da Câmara, convocada para Paulo Guedes esclarecer dúvidas dos deputados sobre a PEC da Previdência, virou um campo de batalha onde esquerdopatas inadjetiváveis massacrarem implacavelmente o ministro. 
Saltava aos olhos que o propósito de um grupelho, munido de cartazes com dizeres PEC da Morte, Pé na Cova e outras bobagens, era tumultuar a sessão e desestabilizar o convidado, mas ficou ainda mais claro (e foi ainda mais revoltante) o total absenteísmo dos deputados do PSL, do Centrão e outros que supostamente apoiam o governo. Guedes foi literalmente atirado às feras (não vou dizer leões para não ofender o rei dos animais) e ninguém acorreu para defendê-lo.
No início da noite, o deputado Zeca Dirceu — que acontece de ser filho do dublê de guerrilheiro de araque e rapinador do Erário José Dirceu, ex-ministro de Lula e condenado a quase 30 anos de cadeia — acusou o ministro de ser “tigrão” para cortar aposentadorias de trabalhadores e “tchutchuca” para cortar privilégios de ricos e banqueiros do país, e ouviu dele que tchutchuca eram “sua mãe e sua avó”. Em meio ao tumulto que se formou, o presidente da comissão, deputado Felipe Franceschini, encerrou a sessão.
Em algum momento de sua trajetória política, o hoje presidente da República afirmou que “o único erro [do governo militar] foi torturar e não matar” — referindo-se aos comunistas em geral e a FHC em particular. Em situações como a de ontem, eu fico pensando se sua excelência não tem uma certa razão.

No último dia primeiro (que acontece de ser 1ª de abril, o dia dos trouxas), o presidente Jair Messias Bolsonaro completou três meses no cargo. De janeiro até agora, ele esteve na Suíça, nos Estados Unidos, no Chile e em Israel, deu uma passadinha rápida em casa (no Rio), e outra no Hospital Sírio Libanês (em São Paulo). Em Brasília, foi cinema com a primeira dama e a ministra Damares na manhã da terça-feira, 26 de março (que, até onde se sabe, não era feriado no DF), em plena articulação da reforma da Previdência e em meio à estúpida guerra de egos que levaria o presidente da Câmara desengavetar e a pôr em votação a PEC do Orçamento Impositivo (detalhes no post anterior), criada originalmente para conter os arroubos dilmistas. A proposta foi aprovada em dois turnos em menos de 3 horas, com 3 votos contrários e 6 no segundo. O próprio partido do presidente contribuiu para a acachapante derrota do governo votando em peso a favor do projeto, talvez porque a maioria dos 54 deputados pesselistas esteja em seu primeiro mandato e não tinha a menor ideia do que estava fazendo.

Rodrigo Maia ergueu a bandeira branca — “Peço ao presidente que pare” — e depois disso os ânimos serenaram. O dólar parou de subir e o Ibovespa, mesmo longe da marca história dos 100 mil pontos que atingiu semanas atrás, quando tudo indicava que a PEC da Previdência caminhava a passos de gigante, ao menos parou de cair. Paulo Guedes explicou a reforma previdenciária aos senadores — depois de faltar ao compromisso marcado com os deputados, segundo ele porque ainda não havia um relator —, e as relações entre Maia e Moro mudaram de guerra quase declarada para paz armada. Mas já dizia o velho Magalhães Pinto que “política é como nuvem; você olha e ela está de um jeito, olha de novo e ela já mudou”.

O fato é que, se crises fosse tijolos, o presidente, seus filhos e alguns ministros que o chefe do Executivo foi buscar só Deus sabe onde seriam uma olaria. Com a oposição combalida no Congresso e nas ruas, o maior adversário do governo é a desarticulação de sua própria base. A eleição formou uma vasta maioria de centro-direita nas duas Casas do Legislativo. Na Câmara, os partidos de esquerda somados contabilizam pouco mais de 130 deputados, número que seria inofensivo para um governo bem articulado com suas bases. O problema é que, diante da implosão das pautas federais provocadas pelo próprio Bolsonaro, a minoria consegue fazer barulho e protelar discussões.

Diante da possibilidade de novas rusgas, aliados de Bolsonaro e de Rodrigo Maia devem agendar uma conversa entre os dois após a volta do presidente volte de Israel — onde, para alívio do agronegócio, ele anunciou apenas a abertura de um escritório em Jerusalém. Enfim, se não houver nenhuma intercorrência mais séria, a reforma previdenciária (ou o que restar dela depois de ser submetida ao crivo dos deputados e senadores) pode ser aprovada ainda no primeiro semestre. A expectativa é que o texto seja votado na CCJ no próximo dia 17, a fim de pressionar o início dos trabalhos na Comissão Especial (que ainda não foi instaurada), onde certamente haverá novos embates e negociações. Dois pontos do texto já estão na lista de mudanças dos parlamentares: a aposentadoria rural e o Benefício de Prestação Continuada. Esses itens são considerados muito caros, sobretudo, para a bancada do Nordeste, que vem ganhando força pela alteração das regras desses temas. É fundamental, portanto, que o relator da comissão especial seja alguém sensível à causa, ou haverá ainda mais divergência e demora na apreciação do texto.

Se quiser aprovar a “nova Previdência”, Bolsonaro terá de mostrar aos deputados como é a articulação na “nova política”. Mas a falta de diálogo com as lideranças é notória. Prova disso é que, durante a escolha da relatoria na CCJ, os parlamentares de partidos de centro e de direita se esquivaram da missão, que acabou caindo no colo do Delegado Marcelo Freitas, do PSL mineiro, que é um deputado de primeiro mandato, sem experiência legislativa anterior. Para que os parlamentares recuperem a confiança no Executivo, Bolsonaro e seu entorno precisam baixar o tom e tentar manter uma relação harmoniosa com o Congresso. Nunca é demais lembrar que bater de frente com o Legislativo custou o cargo a Collor e Dilma. Se não descer do palanque, não botar trela na filharada e nem passar a agir como o presidente de todos os brasileiros, e não dos 57,8 milhões que votaram contra o PT — dos quais uns 10% são bolsomínions legítimos — o presidente corre o risco de perder o bonde (e o cargo). Em conversas no Congresso, representantes de dois dos maiores Bancos do país chegaram a perguntar ao líder do Cidadania na Câmara, Daniel Coelho, se “a solução não seria Mourão”.

Observação: Dos 147,3 milhões de eleitores aptos a votar nas eleições passadas, apenas 39,2% votaram em Jair Bolsonaro. Ao todo, 31,3 milhões não compareceram às urnas, o equivalente a 21,3% do total de eleitores. Se a legitimidade de sua eleição é inquestionável, a da eleição e da reeleição de Dilma em 2010 e 2014 também foi, e ainda assim ela não conseguiu concluir seu segundo mandato. As pedaladas fiscais serviram de desculpa para derrubá-la. Ela caiu, de fato, porque perdeu as mínimas condições de governar.

Para encerrar, transcrevo o texto magistral que Dora Kramer publicou na revista Veja desta semana:

Não obstante o alarido do bolsonarês castiço que assola a República, a reforma da Previdência vai passar. Não porque o presidente Jair Bolsonaro esteja particularmente empenhado nisso. Não será uma obra dele nem de seus três auxiliares falastrões que por uma dessas conjunturas inusitadas são filhos com questões familiares um tanto mal resolvidas e detentores de mandato parlamentar. Se dependesse desses quatro, caminharíamos de modo irremediável para o “buraco” em que o general Rêgo Barros disse recentemente que cairemos caso a reforma não seja feita.

Ela será feita, cedo ou tarde, de um jeito ou de outro, porque o mundo do dinheiro, dos negócios e da alta esfera política concorda com a fala do porta-voz. Funciona mais ou menos como a derrubada da inflação no governo FHC e a manutenção da política econômica do antecessor na gestão Lula: ou é isso ou não tem governo. Quiçá país, na interpretação dos entendidos no assunto.

Prefeito do Rio por três vezes, Cesar Maia, pai do presidente da Câmara, aponta três eixos de sustentação efetiva do governo: Economia (Paulo Guedes), Justiça e Segurança (Sergio Moro) e administração substantiva (os militares do Planalto). Note agora o leitor que todos eles atuaram na última semana para desconstruir a barafunda que parecia levar a reforma a pique.

Moro e Guedes entenderam-se com Rodrigo Maia sobre a necessidade de a proposta da Previdência tramitar soberana, o vice-presidente Hamilton Mourão tranquilizou o PIB com encontro em São Paulo e o general Augusto Heleno certamente foi o autor oculto do apelo à “pacificação” feito por Bolsonaro em seguida a intenso tiroteio com o presidente da Câmara.

Os movimentos desse pessoal são o que realmente conta para medir a ampliação ou a redução de danos à reforma. O jogo aqui é de sobrevivência, uma vez que a aprovação do projeto é o primeiro passo, sem o qual não se vai a lugar algum. Sem ele, por exemplo, Moro não consegue nada com seu pacote de legislação anticrimes. Rodrigo Maia tampouco conseguirá imprimir relevância à sua terceira passagem pela presidência da Câmara (fundamental para o impulso do futuro) se a Previdência ficar empacada. Guedes também não levará adiante sua proposta de desvinculação constitucional das receitas da União.

Donde é de concluir que as coisas fluirão. A menos que o presidente da República resolva livrar-se de seus pilares, ou vice-versa, numa exacerbação de seu jeito rudimentar de ser, e, não sabendo exatamente do que se compõe a nova política, siga na trajetória malsã de negar-se ao exercício da boa política. Nesta, já apontaram diversos autores credenciados, existe um caminho do meio a ser trilhado entre a hostilidade e a ilegalidade. Para tanto, porém, há que ter visão estratégica, inteligência, paciência, ponderação, noção dos limites do poder e, sobretudo, plano de voo claro e detalhado. E é aí que a fêmea da espécie dos suínos corre o risco de retorcer a própria cauda e pôr tudo irremediavelmente a perder.

quinta-feira, 28 de março de 2019

E LA NAVE VA — PARTE III


OGNI ARANCIA HA L'ALTRA METÀ

A imagem que ilustra este post não é da ante-sala do Inferno, mas bem que parece. Como também parecem brigas de criança as rusgas entre o Executivo e o Legislativo — pena que não dá para resolvê-las com umas boas (ainda que politicamente incorretas) palmadas. E enquanto o Planalto e a Câmara medem forças e o cenário político muda como imagens de caleidoscópio, escrever sobre o tema passa a ser como narrar por escrito uma partida de futebol: a gente nem terminou de descrever a defesa do goleiro do time A e o time B já contra-atacou e virou o placar.

Fato é, caro leitor, que a situação vai de mal a pior (para não dizer que estamos fodidos, e mal pagos). Ao cabo de 90 dias no poder, o presidente vê — porque é impossível que não veja — os principais pilares do seu governo derreterem como sorvete sob o sol do meio-dia e nau dos insensatos adernar perigosamente... e aí resolve ir com a primeira-dama ao cinema (em plena manhã de terça-feira) e levar a tiracolo a ministra Damares Alves (só faltou levar também certo ministro que não tem vocação nem para educador, nem para administrador para ver se, pelo menos, ele serve para segurar a vela). Em cartaz: Superação, o Milagre da FéAinda bem que não era TITANIC.

O superministro Paulo Guedes disse ontem no Senado que se, não tiver apoio, deixará o posto. Depois emendou que seria irresponsabilidade sair se Previdência não for aprovada, mas acrescentou que não pretende permanecer se não houver colaboração do Legislativo para conter os gastos públicos. “Se o presidente apoiar as coisas que podem resolver o Brasil, estarei aqui. Agora, se ou o presidente ou a Câmara, ninguém quer aquilo, eu vou ser obstáculo para os senhores? De forma alguma, voltarei para onde sempre estive”, disse Guedes.

No mesmo dia, o também superministro Sérgio Moro declarou que prefere desistir da tramitação de todo o pacote anticrime apresentado ao Congresso se os parlamentares retirarem do texto trechos que versam sobre corrupção. Somada à “não ida” de Guedes à CCJ da Câmara, já que o presidente da comissão ainda não designou o relator, o Ibovespa, que tinha cravado 100 mil pontos na semana passada, vem sofrendo queda atrás de queda, enquanto o dólar sobe feito rojão em noite de Réveillon (tudo bem que há questões internacionais colaborando para isso, mas aí já é outra conversa).

Pelo visto, o único consolo que resta a quem apoiou Bolsonaro contra o boneco de ventríloquo do criminoso de Curitiba é o PT não ter voltado ao poder, porque aí, sim, a porca torceria o rabo. Mas somente os bolsomínions — que não passam de militantes petistas com o sinal trocado — conseguem aplaudir as estultices bolsonaristas em vez de enxergar o festival de incompetências que assola o país. Não que Rodriga Maia não tenha culpa nesse cartório, mas não foi no Bolinha que votamos para presidente.

Ontem, numa demonstração de força e revanchismo à toda prova, a Câmara levou poucos minutos para aprovar em dois turnos uma PEC que engessa o Orçamento (tornando obrigatório o pagamento de despesas hoje passíveis de adiamento, como emendas de bancadas estaduais e investimentos em obras), que havia sido apresentada em 2015 e esquecida desde então. Foi a prova provada de que, em havendo vontade política, a reforma da Previdência e as medidas anticrime e anticorrupção poderiam se aprovadas enquanto o diabo pisca um olho. Mas o presidente não tem apoio, não tem articulador político, não tem partido, enfim, não tem porra nenhuma. E ainda se preocupa em comemorar o aniversário da revolução de 1964, que deu início ao regime de exceção que durou 21 anos. Nem  o núcleo do governo se entusiasmou com a ideia, preferindo recomendar cautela no tom para evitar ruídos desnecessários e polêmicas indesejadas, sobretudo quando os ânimos na política estão tão acirrados. 

Bolsonaro não teve sequer o apoio do zero três, já que o filhote contribuiu com seu voto de deputado federal para a "derrota" do governo (derrota entre aspas, porque a proposta ainda precisa ser aprovada pelo Senado e, se o for, só entrará em vigor na próxima legislatura, o que faz dela um problema para o próximo presidente), a exemplo os demais deputados do PSL (com exceção de 6, entre os quais a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann).

Como dizem os evangélicos e assemelhados, “só com Jesus na causa”. Durma-se com um barulho desses!

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

TEMER, O PATÉTICO

Temer, homem de letras e poeta desde os verdes anos, endereçou, no final de 2015, uma carta à ex-presidente (de nada saudosa memória) Dilma Rousseff, reclamando, dentre outras coisas, de ser um “vice decorativo”. Quando a anta foi devidamente penabundada e ele ocupou seu posto, prometeu um ministério de notáveis que recolocaria o país nos trilhos e o entregaria recuperado a seu sucessor, em janeiro de 2019. No entanto, bastou assumir a presidência para se aliar ao que há de pior na política tupiniquim e se cercar de ministros e assessores de reputação duvidosa. Seu grande articulador político, o senador Romero Jucá, responde a 13 inquéritos, oito dos quais oriundos da Lava-Jato. Nos últimos 17 meses, viu seus ministros caírem feito moscas, à medida que os mais estarrecedores indícios de corrupção eram trazidos à luz pela Lava-Jato e seus desdobramentos.

Como sua predecessora ― e Lula antes dela ―, Temer insiste que nunca soube de nada ― discurso estapafúrdio que manteve até mesmo depois de sua conversa com Joesley Batista, gravada à sorrelfa pelo próprio moedor de carne bilionário, ser publicada em O Globo pelo jornalista Lauro Jardim.  Além de negar os fatos (boa parte deles incontestáveis), sua insolência disse com todas as letras que “a investigação no STF seria o território onde aflorariam as provas de sua inocência”. Ato contínuo, passou a mover mundos e fundos (principalmente fundos) para barrar as denúncias da PGR.

Agora, com apenas 3% de aprovação popular, mas mais do que nunca agarrado ao cargo ― talvez pela aterradora perspectiva de perder a prerrogativa de foro ―, Temer envia uma missiva aos parlamentares que decidirão o destino da segunda denúncia contra si e dois de seus acólitos, na qual fala em “conspiração” para derrubá-lo. Referindo-se à delação de Lúcio Funaro, preso na Lava-Jato, diz-se “vítima de torpezas e vilezas” e se vale de uma entrevista concedida por Eduardo Cunha ― seu suposto comparsa em boa parte dos atos espúrios de que é acusado ― para criticar a PGR.

Observação: Curiosamente, Lula, Temer e tantos outros enrolados na Justiça rechaçam sistematicamente o conteúdo das delações, quando este lhes é desfavorável, mas o tomam como a quintessência da verdade quando vem ao encontro de seus interesses.

Temer inicia a carta falando de sua “indignação” e diz que, por isso, decidiu se dirigir aos parlamentares, apesar de muitos o aconselharem a não se pronunciar. “Para mim é inadmissível. Não posso silenciar. Não devo silenciar. Tenho sido vítima desde maio de torpezas e vilezas que pouco a pouco, e agora até mais rapidamente, têm vindo à luz. Jamais poderia acreditar que houvesse uma conspiração para me derrubar da Presidência da República. Mas os fatos me convenceram. E são incontestáveis”.

Parte inferior do formulário
O presidente tece duras críticas ao ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que estaria mancomunado com Joesley Batista ― que não se furtou a receber num encontro cordial, mas a quem agora se refere como “delinquente” ― com o objetivo de “derrubar o presidente da República”. Reitera que é “vítima de uma campanha implacável com ataques torpes e mentirosos, que visam a enlamear seu nome e prejudicar a República”, diz estar “indignado” por “ser vítima de gente tão inescrupulosa” e afirma que “todos esses episódios estão sendo esclarecidos” ― aliás, nada muito diferente do que prometeu quando sua conversa com Joesley veio a público, lembram-se? Fica então a pergunta: por que tanto medo de a investigação seguir adiante?

Os fatos estão aí; a conclusão fica por conta de cada um.


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quinta-feira, 12 de outubro de 2017

LEIA UM TRECHO DA COLUNA DE MÍRIAM LEITÃO ― E DEPOIS, JOGUE-SE DEBAIXO DE UM TREM!



 “Não bastou ao relator [Bonifácio de Andrada] propor a rejeição da denúncia contra Temer. Ele estendeu sua defesa a Lula e Dilma. Disse que não há nada contra nenhum dos três. Culpados, na visão do deputado, são apenas o Ministério Público e a Polícia Federal. Formou-se uma grande aliança em que um tucano tenta criar uma barreira de proteção em torno do presidente e dos ex-presidentes.

A se fiar no relatório de Bonifácio, que vem prestando serviços aos governos desde o regime militar, tudo o que o Brasil tem vivido nos últimos tempos são apenas ‘ações espetaculosas’. Segundo ele, na denúncia, ‘a Presidência não é tratada com referida deferência que o cargo requer’. Quem não tratou a Presidência com o respeito que o cargo exige foi quem teve com um investigado pela Justiça, Joesley Batista, uma conversa como a que o presidente Temer teve naquela noite. Em mais uma inversão dos fatos, os investigadores é que são acusados de não respeitar a Presidência, e não o ocupante do cargo”.



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sábado, 30 de setembro de 2017

É POR ESSAS E OUTRAS...


A tramitação da segunda denúncia contra Michel Temer já teve início, e deverá proporcionar não somente um espetáculo circense tão lastimável quando o anterior, mas também idêntico resultado, pois o indigesto deputado Carlos Marun, chefe da tropa de choque do Planalto, já vem cooptando as marafonas da Câmara. Então, a pergunta não é se a denúncia vai passar ou não, mas quanto bilhões o seu arquivamento custará aos cofres públicos.

Na conjuntura atual, a substituição do Vampiro do Jaburu pelo Bolinha da Câmara ou outro colosso da nossa política talvez fizesse mais mal do que bem, por mais difícil que seja aturar a figura do presidente e o ramerrão de seus acólitos ― que, como Dilma durante o impeachment e Lula desde os tempos do Mensalão, tentam defender o indefensável. Além disso, a (pífia) recuperação da economia ― que só comprova que o Brasil avança a despeito do governo que tem, e não graças a ele ― não autoriza um presidente impopular a escancarar ainda mais o rombo nas contas públicas para barrar um processo cuja instauração ele próprio defendeu ― para quem não se lembra, quando sua conversa com Joesley veio a público, Temer disse que a investigação no Supremo seria o território onde surgiriam as provas de sua inocência.

Uma análise isenta e desapaixonada do cenário ― volto a lembrar que aqui não se defende este ou aquele político por simpatia a este ou aquele partido ou ideologia; aqui se pugna pela punição dos corruptos para o bem do país ― leva à conclusão de que o governo de Michel Temer produziu alguns resultados positivos, Para ficar apenas nos exemplos mais notórios, a despeito de apenas 3,5% da população aprovar o atual governo, nos últimos 16 meses o risco Brasil recuou de 400 pontos para 180, a SELIC baixou de 14,25% para 8,25%; a inflação atingiu o menor patamar em duas décadas e o PIB, o consumo das famílias e o saldo anualizado de admissões e demissões apresentaram resultados positivos (pífios, mas inegáveis).

A despeito das evidências de corrupção, o afastamento de Michel Temer a um ano das eleições ― e pouco mais de 14 meses do final do seu mandato tampão ― talvez fizesse mais mal do que bem: a instalação de um processo criminal ― desta vez pelo STF ―, a assunção de Rodrigo Maia ― que precisaria negociar nova maioria parlamentar e a subsequente disputa em torno do processo sucessório ―, a deliberação sobre como seria a eleição ― porque não há precedente e o respectivo preceito constitucional nunca foi regulamentado ― e a retração das atividades econômicas ― inevitável diante da instabilidade política, pois a mera expectativa de crise leva a bolsa a despencar e o dólar a se valorizar em relação ao real ― agravariam ainda mais a crise política e minariam os frágeis sustentáculos da incipiente recuperação da economia.

Por essas e outras, por mais que queiramos a punição dos corruptos ― sejam eles Lula, Dilma, Aécio, Temer, Padilha, Moreira Franco, Gleisi, DirceuCalheiros, Maluf, Collor, e por aí vai o cortejo suprapartidário de imprestáveis ―, talvez seja melhor (ou menos pior) que Temer seja processado e julgado após o término de seu mandato. A propósito, vale lembrar que a decisão da Câmara em barrar a abertura do inquérito não “sepulta” a denúncia ― embora essa expressão seja largamente utilizada na mídia ―, apenas adia a instauração da ação penal. É certo que Temer jamais dará uma desculpa convincente para a mala de dinheiro de Rodrigo Rocha Loures ou para os R$ 51 milhões encontrados no bunker de Geddel Vieira Lima ― pessoas de sua mais estrita confiança, que passaram de integrantes do primeiro escalão do seu governo a hóspedes do sistema prisional tupiniquim ―, até porque não dá para explicar o inexplicável.

Resta ao presidente continuar desempenhando seu papel ― com uma fleuma de dar inveja a lordes ingleses ― de inocente injustiçado, fingir que está governando o país e continuar tentando por todos os meios desqualificar a denúncia, Janot e o MPF e barrar a investigação, enquanto sua defesa busca respaldo na tese estapafúrdia de que o cancelamento da delação da JBS passa uma borracha em tudo ― das conversas espúrias às provas documentais apresentadas pelos irmãos Batista, Ricardo Saud e distintíssima companhia ― e sua tropa de choque atua nos bastidores para granjear os 172 votos que lhe garantirão sobrevida à derradeira flechada de Janot.

Observação: A rigor, Temer não precisa de voto algum, mas apenas impedir que a oposição consiga 342 votos pelo aceitamento da denúncia.

Resumo da ópera: A permanência de Temer no cargo é um desserviço ao país, pois, como Dilma em 2016, tudo o que ele tem feito ultimamente é lutar para continuar presidente, às favas com os interesses do país. As reformas estão em compasso de espera, mas isso se deve também ao fato de os 513 deputados e 2/3 dos 81 senadores disputarão eleições no ano que vem, e votar emendas impopulares a esta atura do campeonato é suicídio político. Nem mesmo a reforma política ― na qual os principais interessados são os próprios parlamentares ― será votada a tempo de valer para o próximo pleito ― com exceção de uma ou outra medida que viando o financiamento de suas campanhas milionárias, deputados e senadores deixarão para retomar o assunto quando ― e se ― forem reeleitos. Já o presidente Michel Miguel Elias Temer Lulia, que aspirava a ser lembrado como “o cara que recolocou o Brasil nos trilhos do crescimento”, entrará para a história como o chefe da quadrilha do PMDB na Câmara, como o primeiro presidente denunciado por crime comum no exercício do cargo e como o mais impopular chefe de governo de toda a nossa história.

É certo que o Brasil não merece ser presidido por alguém com um currículo desses ― embora os eleitores que votaram nessa caterva mereçam castigo ainda pior. Como diz um velho adágio, BETTER THE DEVIL YE KEN, THAN THE DEVIL YE DON'T (numa tradução livre, “melhor ficarmos com o diabo que conhecemos”).

Encerro por aqui. Que cada qual tire as próprias conclusões.

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quarta-feira, 2 de agosto de 2017

DÊ ADEUS AO MS PAINT

O CASAMENTO É UMA TRAGÉDIA EM DOIS ATOS: UM CIVIL E UM RELIGIOSO.

Embora jamais tenha sido um editor de imagens poderoso, pródigo em recursos e funções sofisticadas, o MS PAINT granjeou um fã-clube respeitável desde que foi integrado pela Microsoft à lista de componentes nativos do Windows 1.0, no início dos anos 1980, com o nome de Paintbrush. Mas tudo passa nesta vida (até uva-passa), e agora nos chega a notícia de que o simpático programinha será aposentado por ocasião da próxima atualização do Windows 10, a ser lançada em setembro ou outubro deste ano, conforme foi anunciado sem alarde em um artigo de suporte da Microsoft, que lista as funcionalidades removidas ou descontinuadas na próxima atualização do Windows 10 (Fall Creators).

Depois de 3 décadas e lá vai fumaça ajudando a desenhar casinhas, árvores e bonecos e a fazer edições simples em fotos e figuras, o Paint vai deixar saudades, mesmo que o Windows 10 integre o PAINT 3D, implementado pelo 10 Creators Update, que é amigável ao toque e oferece recursos superiores aos do homônimo veterano, mas que pouca gente se deu ao trabalho de explorar ― pelo menos até agora. Aliás, consta que a ideia da Microsoft era substituir o Paint tradicional pela versão 3D, mas, por alguma razão, a empresa voltou atrás e manteve os dois aplicativos (da mesma forma que fez com o Internet Explorer por ocasião do lançamento do Edge).

Para quem se limita a salvar imagens em formatos diferentes e/ou fazer edições despretensiosas (redimensionar, colorir, recortar, copiar, colar, etc.), programas sofisticados, caros e complexos ― como complexo Adobe Photoshop não são alternativas muito interessantes, mas a boa notícia é que não faltam opções gratuitas, tanto instaláveis quanto na nuvem, que são mais pródigas em recursos e tão fáceis de usar quanto o veterano MS Paint, conforme a gente já discutiu em pelo menos meia dúzia de oportunidades. Dentre as instaláveis, sugiro o Gimp, o Paint.net ou o Photo Pos Pro; para uso meramente eventual, serviços na nuvem como o Pixlr e o FotoFlexer são mais indicados, pois rodam diretamente do navegador e proporcionam excelentes resultados.

A Mesa Diretora da Câmara iniciou na tarde de ontem a leitura do parecer do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), contrário à aceitação da denúncia contra o presidente Michel Temer por corrupção passiva. Antes do recesso parlamentar, essa etapa da tramitação da acusação contra o peemedebista foi adiada duas vezes, nos dias 14 e 17 de julho, porque não havia o quórum mínimo, de 51 deputados.

A leitura do parecer precede a abertura da sessão de votação no plenário da Casa, prevista para as 09h00 desta terça-feira. Caso haja quórum de 342 deputados depois das falas de Abi-Ackel, da defesa de Temer e dos deputados inscritos, os parlamentares serão chamados um a um ao microfone para dizer se concordam ou não com o relatório do tucano mineiro.

Como o resultado da votação ― se ela realmente acontecer ― deve sair no final da tarde, fiquem com o texto a seguir:

QUANDO ATÉ A INDIGNAÇÃO É CORROMPIDA

Um grupo de artistas liderados por Caetano Veloso criou o blog "342 Agora" e produziu um vídeo convocando a sociedade para mobilizar congressistas a aprovar a denúncia contra Michel Temer. Com estudada indignação, esses “intelectuais” proclamam frases como:

• Ele merece ser julgado pelos crimes que cometeu;
• Qualquer cidadão que está sob suspeita tem que ser investigado, por que teria que ser diferente com o presidente da República?
• Eu posso ser investigada, você pode ser investigado, ele tem que ser investigado;
• Um presidente ser acusado de corrupção passiva, formação de quadrilha e obstrução da justiça, não dá!
• Agora é deixar de lado nossas diferenças e se juntar por uma causa que é importante: o Brasil.
• O futuro do Brasil depende de você.


Tudo muito certo, mas não se ouve eles expressarem indignação com os bilhões de reais desviados para contas privadas, para operadores partidários, para dirigentes de estatais com rateios previstos entre partidos ― sempre cabendo ao PT a maior quota-parte.
Nem um murmúrio sequer que possa ser entendido como decepção com o Bolsa Magnatas, distribuída a figuras como Eike Batista e os irmãos Wesley e Joesley, com as contas-correntes nas grandes empreiteiras, com o conteúdo das delações que nominam pessoalmente dirigentes do PT, do PMDB, do PP (todos com 13 anos de serviços prestados ao governo petista).

Nem um pio quando a Petrobras, tendo Dilma Rousseff na presidência do Conselho, fez a negociata de Pasadena; Ou quando o BNDES enterrou bilhões de reais (nosso dinheiro) no poço sem fundo de comunistas cubanos e venezuelanos e de ditadores companheiros mundo afora.

Muito oportunista, portanto, essa empolgação moral, especialmente vinda de um grupo que mamou durante mais de uma década nas tetas do poder, época em que famílias inteiras, como a Da Silva, síram do subemprego para o mundo dos grandes negócios. Agora, quando a acusação recai sobre o odiado Michel Temer ― o “usurpador” da cadeira que tinham como sua para sempre ―, retomam o discurso golpista que grita "Fora!" a qualquer um que assente o traseiro onde eles querem sentar.

Que Temer responda por todos os crimes que tenha cometido, mas que não venham os irados do blog "342 Agora" com essa indignação hipócrita e corrompida, cuja exclusiva finalidade é atender a suposta conveniência de quem comandou o maior esquema de corrupção política da história nacional.

Com Percival Pugginamembro da Academia Rio-Grandense de Letras, arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país.

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terça-feira, 1 de agosto de 2017

O DRAGÃO DA INFLAÇÃO E O CÓDIGO DE BARRAS

MANTENHA A CABEÇA FRIA SE QUISER IDEIAS FRESCAS.

Dados da Fipe dão conta de que a inflação média no Brasil, que foi de 233,5% ao ano entre 1980 e 1989, subiu, na década seguinte, para 499,2%. Se você viveu naquela época, deve estar lembrado das famigeradas maquininhas de remarcar preços, que funcionavam a todo vapor nos supermercados, onde funcionários trocavam, duas ou mais vezes por dia, as etiquetas de preço das mercadorias nas gôndolas. Não raro, a mesma lata de óleo, caixa de leite ou outro produto qualquer tinha quatro ou cinco etiquetas sobrepostas, e os “espertinhos” removiam as mais recentes para escapara das remarcações. Valia tudo para economizar.

Os assalariados passaram a fazer “compras do mês” no dia do pagamento e lotar a despensa e a geladeira com artigos de primeira necessidade, ou não conseguiriam se abastecer. Com a hiperinflação na casa do 80%, o poder de compra do salário se deteriorava rapidamente, e os produtos chegavam a dobrar de preço de um mês para o outro. Era comum a venda de alguns artigos ser limitada a uma ou duas unidades por cliente, filas gigantescas se formarem nos caixas, produtos tabelados serem escondidos pelos comerciantes (visando forçar a liberação de aumentos) e postos de combustíveis fecharem antes do horário, alegando que seus estoques tinham acabado, no exato momento em que o governo anunciava novo reajuste nos preços. Enfim, era um descalabro.

O código de barras foi criado nos Estados Unidos em 1973 e adotado pelas grandes redes de supermercados tupiniquins em 1983. Com essa “nova” tecnologia, bastava alterar os preços no sistema para que eles entrassem automaticamente em vigor, já que os códigos eram lidos no caixa por um scanner a laser, e não mais registrados manualmente.

Observação: A adoção do código de barras facilitou sobremaneira a vida de comerciantes e consumidores. Com ele, em vez de digitar o preço a partir da etiqueta colada em cada item ― processo moroso e sujeito a falhas, já que era comum o funcionário digitar um algarismo a mais e o cliente acabar pagando, por exemplo e em valores atuais, R$ 39 por uma lata de óleo de R$ 3,90 ―, o caixa simplesmente escaneia o código impresso na embalagem e o valor correspondente é contabilizado. E o mesmo vale para contas de consumo, boletos bancários, e por aí afora, que, assim, podem ser pagos também nas máquinas de autoatendimento.

Infelizmente, maus comerciantes se habituaram a manter, nas gôndolas, etiquetas com preços que nem sempre correspondiam aos efetivamente cobrados. Essa “estratégia” continua sendo aplicada, e a discrepância quase sempre desfavorece os clientes. Por lei, havendo dois preços para o mesmo produto, paga-se o valor mais baixo, mas é difícil flagrar a sacanagem quando se chega no caixa com dezenas de mercadorias diferentes no carrinho. Recorrer às leitoras ópticas espalhadas pelos estabelecimentos ― que deveriam ser encontradas a cada quinze metros ― pode ajudar, mas elas nem sempre estão onde deveriam estar e, quando estão, nem sempre funcionam.

Para entender como a coisa funciona (a leitura do código, não a malandragem dos comerciantes), um scanner a laser direciona a luz sobre as barras e estas a refletem para um sensor, que as associa a um número, de acordo com a espessura de cada barra. Esses números podem ser catalogados de diversas formas, mas existem órgãos internacionais que definem o que cada um deles significa. Para facilitar, digamos que a terceira barra de um código remete ao fabricante do produto, e que, numa determinada mercadoria, seu valor seja “5”. Aí entram os órgãos de padronização, que especificam o que o valor 5 representa. Note, porém, que, para um produto fabricado nos EUA, por exemplo, ser vendido no Brasil, os dois países precisam observar a mesma relação entre números e características.

Os tipos de códigos de barras variam, mas os mais comuns são os UPC-A e os EAN-13, que têm 12 e 13 números, respectivamente. No UPC-A, o primeiro número identifica o local de fabricação do produto; o segundo ― que pode ser formado por vários dígitos ―, o fabricante; o terceiro, que também pode ser mais extenso, as características gerais da mercadoria (tais como nome, peso, etc.). O EAN-13 funciona basicamente do mesmo modo, mas a relação entre os números e as características são diferentes do UPC-A. Além disso, cada um desses modelos de código tem uma versão reduzida: a UPC-E suprime todos os zeros presentes nos códigos UPC-A, e a EAN-8 opera com apenas 8 dígitos.

A leitura desses códigos também pode ser feita por aplicativos disponíveis tanto para o sistema Android como para o iOS, que permitem usar o smartphone para decifrá-los (da mesma forma como os códigos QR, que funcionam mais ou menos da mesma maneira). No entanto, eles apenas traduzem os códigos em algarismos, o que não têm grande serventia: na maioria das embalagens, esse número é exibido logo abaixo das barras. Mesmo assim, a partir dele é possível recorrer ao banco de dados GTIN, mantido pelos mesmos órgãos reguladores retro citados, para identificar boa parte das informações que não sejam sigilosas.

Resumo da ópera: o código de barras nada mais é do que a representação gráfica da sequência de algarismos que vem impressa logo abaixo dele. Cada traço preto ou branco equivale a um bit (1 ou 0, respectivamente) e cada algarismo é sempre representado por sete bits. Uma barra escura mais grossa que as outras é, na verdade, a somatória de vários traços pretos, e o mesmo princípio vale para as barras brancas. Esse número funciona como uma espécie de RG do produto, ou seja, não existem dois produtos diferentes com o mesmo número. A vantagem é que as barras podem ser lidas mais rapidamente e sem risco de erros, ao contrário do que costuma acontecer quando digitamos a sequência numérica propriamente dita no teclado de um caixa eletrônico, por exemplo.

Na imagem que ilustra esta matéria ― reproduzida de um artigo publicado na revista Mundo Estranho ―, as três primeiras barras mais compridas (uma branca no meio de duas pretas) sinalizam que, a seguir, vem o código do produto. Note que as barras e seus respectivos algarismos não ficam alinhados ― por isso o número 7 vem antes das barras de sinalização. Esses três primeiros números (789) indicam que o produto foi cadastrado no Brasil, apesar de não necessariamente ter sido fabricado aqui. Cada país tem uma combinação própria. A da Argentina, por exemplo, é 779. A segunda sequência, que pode variar de quatro a sete algarismos, é a identificação da empresa fabricante. Esse número é fornecido por uma organização internacional (conforme já foi mencionado), de maneira a evitar possíveis repetições. A terceira sequência identifica o produto em si, e a numeração varia conforme o tipo, o tamanho, a quantidade, o peso e a embalagem do produto ― uma Coca-Cola em lata, por exemplo, tem uma sequência diferente da que se vê no produto em garrafa. O último número é um dígito verificador.

Ao ler todo o código do produto, o computador faz um cálculo complexo, somando, dividindo e multiplicando os dígitos anteriores. Se a leitura estiver correta, o resultado desse cálculo estranho é igual ao do dígito verificador.

LEITURA DO RELATÓRIO DE ABI-ACKEL NA CÂMARA ― SERÁ QUE VAI?

O Planalto moveu mundos e fundos (mais fundos do que mundos) para barrar a denúncia contra Temer na CCJ. Hoje, basta a presença de 51 parlamentares para que o deputado tucano Paulo Abi-Ackel leia seu parecer ― sem o que a denúncia contra o presidente não pode ser votada no Plenário.

O problema é que, para a votação ter início, é necessária a presença de 2/3 dos deputados. Então, embora governo precise de míseros 142 votos para enterrar a denúncia ― e os tem ―, a sessão de votação, prevista para amanhã, só pode ser iniciada quando 342 deputados estiverem presentes. O mesmo número de votos, aliás, de que precisa a oposição para reverter o resultado acochambrado na CCJ, onde o parecer do deputado Sérgio Zveiter foi descartado e o de Abi-Ackel, favorável a Temer, acabou sendo aprovado por 41 votos a 24 ― depois de uma escandalosa dança-das-cadeiras regada a quase R$ 2 bilhões em verbas parlamentares.

Nem o governo, nem a oposição tem condições de garantir o quórum de 2/3, e sem ele a votação não pode acontecer. Nesse entretempo, o PSDB não sabe se desembarca ou não do governo, Rodrigo Maia não sabe se conspira contra Temer ou se continua fingindo apoiá-lo, o Supremo não sabe se vai apreciar ou não a denúncia contra e, caso o faça, como seus ministros irão se posicionar a propósito ― dado o ineditismo da situação ― e a nação fica à deriva, ao Deus-dará.

Quanto à sociedade civil, de quem o governo espera apoio e compreensão, mais hora, menos hora o bicho vai pegar. Além do risco cada vez maior de ser assaltado em casa ou na rua, até quando o cidadão terá de se submeter aos achaques vergonhosos feitos por um Estado inchado, ineficiente e incapaz? Dados levantados pela ONG Avaaz dão conta de que 81% os entrevistados disse ser favorável à abertura de processo contra Michel Temer (para mais detalhes, clique aqui). E os deputados que votarem pelo sepultamento da denúncia precisarão de votos para se reelegerem no ano que vem.

Façam suas apostas.

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domingo, 23 de julho de 2017

PSICOTESTE - J.R. GUZZO

A requisitada firma de advogados Dodson & Fogg, na verdade uma dupla de escroques que fornece alguns dos melhores momentos do primeiro livro de Charles Dickens, The Pickwick Papers, tinha um princípio profissional acima de qualquer outro, em sua atuação no baixo mundo judiciário de Londres. “As alegações feitas por nosso cliente podem ser verdadeiras ou falsas”, costumava dizer Mr. Dodson que a exemplo de Mr. Fogg parecia ter quase tanta chance de acabar um dia na forca quanto os seus clientes mais infames. “Não faço a menor ideia se são uma coisa ou outra, e isso, aliás, não tem nenhuma importância. A única questão que nos interessa é a seguinte: vão acreditar em nós?” O tempo passa, o mundo gira, e eis aí o Brasil de hoje, essa potência moral que causa cada vez mais espanto na Terra e no resto do sistema solar, vivendo situações que poderiam perfeitamente estar presentes nas tenebrosas cortes de Justiça da Londres de 200 anos atrás. 

Ninguém está dizendo aqui, pelo amor de Deus, que os advogados do ex-presidente Lula, no momento de receber a sentença no primeiro dos seus múltiplos processos penais, tenham alguma coisa a ver com messrs. Dodson e Fogg ou que o seu cliente tenha cometido algum crime. Mas o caso do ex-presidente, após toda a via-sacra do seu processo, dá ao público pagante a sensação de que o resumo da obra é o mesmo. “Provei a minha inocência”, diz Lula, sem explicar por quê. Ou seja: não vamos agora ficar discutindo se é verdade, se não é, etc. e tal. Acreditem em mim.

Os dois mandatos de Lula na Presidência da República foram um monumento sem precedentes ao vício. Sua performance mais espetacular, como ficou demonstrado com dezenas de confissões públicas e provas materiais, foi a capacidade sem limites para roubar dinheiro público. Na Petrobras, privatizada diretamente para os amigos, a estimativa mais aceita é que o roubo tenha passado dos 40 bilhões de reais; conforme a maneira de calcular, fala-se em cifras de até 90 bilhões. 

Privatizaram, também para o usufruto pessoal da companheirada, a Eletrobras, a Nuclebrás, a Caixa Econômica Federal, o BNDES, ferrovias, rodovias e, de modo geral, qualquer estatal que pudesse ter alguma coisa passível de ser furtada. Roubaram com ânsia desesperada os fundos de pensão das empresas do governo. Roubaram merenda escolar, ambulâncias, quentinhas de presidiários. Roubaram pontes, linhas de transmissão de eletricidade, estádios de futebol inteiros. Roubaram até sangue humano. A respeito de todos esses fatos, Lula diz apenas que provou ser 100% inocente. Não participou de nada, não soube de nada e não desconfiou de nada em oito anos seguidos de governo não admite nem mesmo que tenha tido a mínima responsabilidade por nada do que fizeram a um palmo da sua porta, ou menos ainda.

A maneira mais prática de explicar isso talvez seja a crença de Lula em que contra a fé não há fatos nem argumentos. Muita gente (e ele espera que essa gente seja a maioria dos brasileiros) não está interessada em entender, pensar ou se informar só está interessada em acreditar. É a mesma esperança que quase todo político brasileiro tem para sobreviver às consequências de seus atos. 
Fazem barbaridades, perante o Código Penal e as regras mais elementares de conduta, absolutamente notáveis pela sua estupidez e ficam esperando que ninguém ache nada de errado. 

Como o presidente da República, por exemplo, pode se meter com esse Joesley Batista, o maior corruptor da história do Brasil? Nem um guarda-noturno receberia o homem; Michel Temer até agora acha que está tudo bem. O senador Aécio Neves, que poderia estar em seu lugar, deixa-se gravar ao telefone implorando 2 milhões de reais em dinheiro vivo da mesma figura. O complexo Renan-Jucá-Padilha-Moreira-Geddel-etc. continua em plena atividade. Os ministros Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Luiz Fux e outros colossos da nossa suprema magistratura governam o país como se isso fosse legal. O que há com essa gente? Obviamente, algo deu imensamente errado com todos eles. O melhor talvez seja seguir a excelente sugestão do escritor português João Pereira Coutinho em artigo recente na Folha de S.Paulo: obrigar ocupantes de cargos políticos a fazer exames psicológicos e neurológicos antes de assumir mais ou menos como o psicoteste para motoristas de ônibus, por exemplo. A ciência, ao que parece, está a ponto de provar que o poder provoca algum tipo de lesão no cérebro. Quem, dos nomes acima e centenas de outros iguais, passaria no exame?

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domingo, 16 de julho de 2017

A POPULAÇÃO ESTÁ APÁTICA, MAS INDIGNADA COM O FISIOLOGISMO POLÍTICO. ATÉ QUANDO?

A deposição de Dilma não deflagrou uma revolução nem provocou a invasão do Brasil por hordas do inferno (leia-se petistas e esquerdistas que tais), mas também não teve o condão de levar o país de volta aos “trilhos do crescimento” com a substituição da chefa titular pelo reserva. O que é uma pena: embora tenha herdado uma economia em plena recessão, com 12 milhões de desempregados Temer começou bem ao montar sua equipe econômica, e tinha tudo para dar certo, notadamente enquanto a nação vivia a euforia de ver o PT sair de cena. Mas sua excelência não teve o mesmo zelo em relação aos demais ministérios e, pior, cercou-se de colegas de partido acusados de corrupção, como Jucá, Geddel, Padilha, Moreira Franco e tantos outros, e acabou tragado pelo vórtice das delações. Tivesse agido diferente, talvez sua cabeça não estaria sendo exigida tanto por gregos quanto por troianos. Mas Temer fez o que fez ― e o que não deveria fazer ―, e o resultado é o que está aí.

Acuado, o presidente manda às favas a compostura e recorre ao execrável fisiologismo político para obstruir a abertura do inquérito que ele próprio disse ser o terreno onde surgiriam todas as explicações. Por ser incapaz de negar o inegável e defender o indefensável, passa ao contra-ataque, acusando seus acusadores e inventando justificativas pouco convincentes para suas estripulias nada republicanas. Mas essa tática nem sempre funciona, como Lula pode atestar, se quiser, depois de se refazer do trauma de descobrir que não é Deus, que não está fora do alcance da Justiça e que as hostes vermelhas não atearam fogo em Curitiba no último dia 12, quando foi publicada sua primeira condenação. É a vida que segue, cumpanhêro.  

A vitória pírrica que o governo conseguiu na CCJ, além de indecente, não resolveu o problema, somente adiou o inevitável e irritou ainda mais a população, que está pasmada diante da imoralidade do jogo político, cujo mais recente movimento consistiu na substituição de membros da Comissão favoráveis à abertura do processo por outros dispostos a barrá-lo em troca de farta distribuição de verbas ― os 40 deputados que votaram a favor do presidente receberam mais que o dobro do valor destinado aos 25 que votaram contra; só para o tucano Paulo Abi-Ackel, autor do relatório aprovado pela comissão (em substituição ao do relator peemedebista Sérgio Zveiter, favorável à investigação de Temer pelo STF), foram R$ 5,1 milhões. Segundo algumas fontes, somente no mês de junho foram torrados quase RS 2 bilhões, a despeito de a crise econômica e da falta de recursos para tudo ― como demonstra a absurda suspensão da emissão de passaportes às vésperas das férias de meio de ano (documento pelo qual, é bom lembrar, o interessado paga uma taxa de R$ 257,25).

Nem o Planalto nem a oposição conseguiram reunir 342 parlamentares para dar início à votação em plenário, de modo que o dito fica pelo não dito até agosto ou sabe lá Deus quando. Ao presidente interessava encerrar o assunto antes do recesso; agora, dada a impossibilidade, interessa-lhe estender a coisa ad kalendas græcas, torcer para ela morra sozinha e, nesse entretempo, fazer cara de paisagem, dizer que o governo está trabalhado e, parafraseando o próprio Michel Miguel Elias Temer Lulia, primeiro e único, “esperar que a caravana passe”.

A estratégia é, no mínimo, arriscada. Primeiro, porque durante o recesso os parlamentares serão pressionados por suas bases ― e os 7% de popularidade de Temer sugerem claramente que muita gente quer vê-lo pelas costas. Segundo, porque a possibilidade de surgirem “fatos novos” é significativa: um bom exemplo são o esperado acordo de delação premiada de Eduardo Cunha ou de Lúcio Funaro e as duas outras denúncias que Janot deve apresentar até meados de setembro, quando deixa o comando da PGR. Mas o fato é que não existe alternativa, e o que não tem remédio remediado está.

Cunha já entregou sua proposta de delação (e por isso ficou de bico calado na última sexta-feira, quando foi levado para depor na sede da Polícia Federal em Curitiba), mas a situação de Funaro é considerada mais "desconfortável", e acredita-se que ele tenha mais provas concretas a fornecer do que o ex-presidente da Câmara. Ambos estão presos desde o ano passado, e o elenco de informações que eles têm a oferecer é basicamente o mesmo, razão pela qual a aceitação da colaboração de um frustrará as negociações do outro. Cunha é conhecido por “faltar com a verdade” e Funaro, por sinalizar sua intenção de denunciar certos fatos e pessoas, mas recuar em seguida. Na opinião dos investigadores, o doleiro é o favorito para “sair do xadrez por essa porta”. Mas qualquer dos dois que venha a delatar irá acrescentar mais um prego ao caixão de Temer ― ou uma estaca em seu coração, como é recomendável fazer para exterminar vampiros.

Em entrevista à Rádio Gaúcha na última sexta-feira, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Quadrilha, negou irregularidades na liberação de emendas. A despeito da grita da oposição, ninguém da base aliada viu problema algum na troca de 12 titulares da CCJ por suplentes alinhados com o governo, sem o que a derrota teria sido esmagadora. Todos os apoiadores de Temer defenderam a tese de que “as trocas são absolutamente normais no jogo político”. Só faltou alguém encaminhar ao Papa Francisco um pedido de canonização do primeiro presidente da República, em toda a história deste país, investigado por crime de corrupção no exercício do mandato. Mas acho melhor não dar ideias. Vai que alguém escuta...

Enfim, é o que temos para hoje. Vamos ver o que muda até a próxima postagem.

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sábado, 15 de julho de 2017

RESUMO DA SEMANA E PERSPECTIVAS PARA AS PRÓXIMAS NO BRASIL DAS INCERTEZAS

Marmelada é como se chama um doce (feito de marmelo, é óbvio) do qual eu gosto muito, mas que há tempos não vejo nos supermercados. Figurativamente, porém, o termo designa maracutaias, falcatruas, jogos de cartas marcadas ― uma acepção que parece ter caído em desuso, mas que foi muito popular nos anos 60, época das lutas de Telecatch ― programa de auditório criado e transmitido pela extinta TV Excelsior, onde os “vilões” desciam a porrada nos “mocinhos”, que, no último minuto, viravam o jogo e “venciam” os embates de “luta-livre”.

Lembrei-me disso na noite da última quinta-feira, enquanto acompanhava a votação do relatório do deputado Sérgio Zveiter, que foi substituído pelo tucano Paulo Abi-Ackel, alinhado ao governo e, portanto, contrário à abertura do inquérito contra Temer. Como se viu, depois da vergonhosa substituição de 1/3 dos integrantes da CCJ, o Planalto garantiu 40 votos dos 66 votos possíveis numa marmelada absolutamente imoral, ainda que não afronte o Regimento e seja até considerada legal (?!) ― a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, instada a se posicionar a propósito por não me lembro qual partido de oposição, achou por bem não meter a mão nesse vespeiro; afinal, quem pariu Mateus que o embale.

Tão logo o parecer favorável ao arquivamento da denúncia contra Temer foi aprovado ― depois de horas de pronunciamentos descolados da realidade e divorciados do tema central da discussão ―, os parlamentares se apressaram a votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (sem o que não poderiam entrar em recesso), bateram as asas e voaram de Brasília, a despeito de suas “merecidas férias” começarem somente na próxima terça-feira. Com isso, a questão só será votada no plenário depois do recesso ― isso se e quando 2/3 dos deputados se fizerem presentes. Nesse entretempo, o país navega sem rumo nas águas turvas da indefinição.

Nenhum grupo político parece ser capaz de impor sua posição sobre os demais, e a vitória artificial na CCJ, forjada, como dito, mediante substituições de membros da própria base, descortina uma possível derrota dos governistas no plenário, mesmo sendo necessários 342 votos para afastar o presidente. Na verdade, nenhum dos dois lados garante o quórum mínimo. A Câmara está claramente dividida. Temer perdeu o controle que tinha sobre a maioria dos parlamentares ― e que lhe permitiu aprovar até mesmo emendas constitucionais polêmicas, como o teto dos gastos. A oposição, por seu turno, não consegue derrubá-lo, e talvez ele se arraste até o final do mandato, mesmo sangrando durante a disputa presidencial que promete ser conturbada e “judicializada”, notadamente depois da (primeira) condenação de Lula.

Falando no molusco, é certo que ele recorrerá da decisão. Aliás, num pronunciamento feito para cerca de 300 aliados, puxa-sacos e baba-ovos, disse que vai “processar a sentença” ― o que não passa de retórica e serve unicamente para manter elevado o moral de seus vassalos, até porque a provável condenação em segunda-instância torná-lo-á “ficha-suja” e jogará a derradeira pá de cal no sonho de voltar à presidência da Banânia. Por outro lado, nossa legislação oferece um vastíssimo leque de recursos e apelações que seus advogados saberão explorar, já que até na Comissão de Direitos Humanos da ONU eles foram chorar as mágoas.

Em entrevista concedida à rádio CBN nesta sexta-feira, o presidente do TRF4 afirmou que a 8ª Turma deve julgar os recursos contra a sentença proferida pelo juiz Moro (no plural, porque o MPF também deve apelar para pedir o aumento da pena) entre maio e junho do próximo ano ― uma estimativa mais otimista do que as que eu vinha ouvindo. Disse ainda o desembargador que pouquíssimas decisões envolvendo processos da Lava-Jato foram reformadas por aquele colegiado, e que, mesmo que a condenação fosse confirmada depois das convenções partidárias, quando a candidatura do molusco já estaria oficializada, ele seria impedido de concorrer. Mas volto a lembrar que estamos no Brasil, e que existam “n” chicanas que sua defesa certamente utilizará como “embargos protelatórios”.

Observação: Seria de bom alvitre que STF se pronunciasse o quanto antes sobre uma questão que parece ter caído no esquecimento geral: se o aquela Corte entende que réus em ações penais não podem substituir o presidente da República interinamente ― vale lembrar o caso de Renan Calheiros, que se tornou réu por peculato e foi afastado da linha sucessória, embora, mercê uma decisão sui generis do Supremo, tenha preservado o mandato de senador e o cargo de presidente do Senado e do Congresso ―, como permitir que um réu condenado concorra à presidência da República?   

Para Lula, radicalizar a campanha é a única saída, e por isso ele continuará tentando polarizar a opinião pública. Mas essa exposição pode fragilizá-lo (ainda mais) se e quando ele for condenado nos demais processos ― são quatro até agora, e a tendência é de que novas denúncias contra ele sejam aceitas pela Justiça penal ―, mesmo que não haja tempo hábil para as sentenças serem confirmadas pelo TRF4. Embora figure como franco-favorito nas pesquisas de opinião pública, o petralha é também o mais rejeitado, e novas condenações reduziriam ainda mais suas supostas chances de se eleger. Claro que a patuleia em geral e os petistas em particular não veem isso, mas essa gente não nada que contrarie suas abiloladas convicções.

Lamentavelmente, o PSDB, com seus líderes insípidos, seus rachas internos e sua tradicional postura de ficar “em cima do muro”, deixou de ser a opção natural para quem não quer a volta do PT, notadamente depois que Aécio Neves ― que quase derrotou Dilma em 2014 ― teve suas entranhas pútridas expostas pelo mesmo moedor de carne bilionário que transformou num inferno a vida de Michel Miguel Elias Temer Lulia. Claro que há outros populistas de direita radical, como Jair Bolsonaro ― que reúne multidões de apoiadores fanáticos em repúdio ao lulopetismo. Fala-se até numa possível candidatura do (ex-ministro do STF) Joaquim Barbosa, dos dublês de empresário e apresentador de TV Luciano Huck e Roberto Justus, ou mesmo do (recém-eleito prefeito de Sampa) João Dória ― que teria meu voto se mudasse de partido, e deveria mesmo fazê-lo, pois Alckmin ainda se vê como o virtual cabeça de chapa do PSDB, e Serra (outro iludido, além de enrolado na Lava-Jato) insiste em não ver que sua janela de oportunidade já se fechou.

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quinta-feira, 13 de julho de 2017

APROVADO NO SENADO PROJETO DE LEI QUE PROÍBE AS FAMIGERADAS FRANQUIAS NA BANDA LARGA FIXA

TUDO SERIA FÁCIL SE NÃO FOSSEM AS DIFICULDADES.

O portal de tecnologia Oficina da Net publicou, no último dia 5, a notícia de que o Senado aprovou o PL 7182/17, que proíbe a limitação de franquia de consumo nos planos de banda larga fixa.
Volto a lembrar que essa novela começou no início do ano passado, quando as operadoras anunciaram que implementariam cotas de dados no serviço, como já vinham fazendo na banda larga móvel (detalhes nesta postagem).

Segundo o deputado Rodrigo Martins, relator da proposta aprovada pela Comissão de Defesa do Consumidor, o principal objetivo é frear mudanças futuras, dando uma garantia legal, uma vez que o projeto de lei prevê penalidades em relação às operadoras.

A Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações afirmou que ninguém quer que o usuário tenha uma sensação ruim ao usar a internet, mas entende que não pode haver é uma proibição de modelos de negócios variados. “Quem quiser fornecer sem limite que forneça sem limite. Quem quiser ter limite vai oferecer com um preço apropriado para isso”, disse ele.

Rafael Zanatta, do IDEC, entende que as empresas não tiveram êxito em demonstrar a real necessidade da mudança proposta. Segundo ele, “não existe um problema grave de congestionamento das redes no Brasil, não existe um problema de usuários pesados que estão usando a internet para baixar jogos ou conteúdos pesados, pelo contrário, as empresas estão com maior capacidade de transmissão de dados e estão com uma infraestrutura cada vez melhor com cabeamento de fibra ótica."

O processo de tramitação continua e a proposta será analisada de forma prioritária pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, de Constituição e Justiça e de Cidadania e finalmente pelo Plenário.

LULA RECEBE SUA PRIMEIRA CONDENAÇÃO NA LAVA-JATO

Antes da postagem do dia, uma notícia importante (que eu já adiantei na tarde de ontem, mas enfim...): 

Saiu a tão esperada sentença em que o juiz Sérgio Moro condenou Lula a 9 anos e seis meses de prisão. Mas é preciso ter em mente que só estaremos livres do sacripanta depois que o TRF4 julgar o recurso ― que certamente será interposto ― e confirmar a decisão de Moro.

Como se sabe, o entendimento firmado no STF em novembro do ano passado é de que réus condenados em primeira instância só podem ser presos depois de a sentença transitar em julgado ― ou, em havendo recurso, quando a decisão for confirmada em segunda instância.

Moro até cogitou de pedir a prisão preventiva do molusco, notadamente em virtude do comportamento do réu durante o processo ― de “intimidação da Justiça, dos agentes da lei e até da imprensa”. Entretanto, considerando que “a prisão cautelar de um ex-presidente da República envolve certos traumas, e a prudência recomenda que se aguarde o julgamento pela Corte de Apelação antes de se extrair as consequências próprias da condenação”, o magistrado decidiu que Lula poderá apresentar a sua apelação em liberdade (para bom entendedor, meia palavra basta, mas voltarei a esse assunto numa próxima oportunidade, depois que sentença repercutir e que a poeira baixar).

A sorte do entulho vermelho será selada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, composta pelos desembargadores João Pedro Gebran, Leandro Paulsen e Victor Laus. 

Ainda não se sabe quando a defesa do ex-presidente petralha irá apelar, nem quando Moro enviará os autos ao TRF4, mas dificilmente a confirmação da sentença se dará ainda neste ano (com sorte, ela ocorrerá no primeiro semestre de 2018). 


A BANCADA DA CHUPETA - ou A INVASÃO DAS MOCREIAS

A palhaçada protagonizada anteontem pela patuleia nada fica devendo ao que se vê na Venezuela, onde o Congresso é frequentemente invadido por vândalos e os parlamentares, submetidos a pressões ilegais. Talvez inspiradas no país vizinho, tão admirado pelos petistas e seus igualmente imprestáveis seguidores, quatro senadoras de esquerda, incentivadas por Lindbergh Farias ― estimulado, por sua vez, pelo ex-ministro guerrilheiro de araque e atual condenado na Lava-Jato José Dirceu ―, se aboletaram na Mesa Diretora do Senado, atrasando a votação da reforma trabalhista em quase seis horas. Mesmo assim, o texto base foi aprovado por 50 votos a favor e 26 contrários.

A cena dantesca da “bancada da chupeta” traçando uma quentinha foi exibida reiteradamente por todos os telejornais, e o pior é que as protagonistas pareciam acreditar, realmente, que estavam promovendo uma ação histórica, quando seu comportamento histérico foi um flagrante desrespeito aos princípios mais elementares do Estado Democrático de Direito (confira no vídeo abaixo).


A reforma trabalhista é essencial. Primeiro, porque a CLT remonta aos anos 1940 (governo de Getúlio Vargas) e, portanto, está totalmente divorciada da realidade atual. Segundo, porque temos 14 milhões de desempregados; terceiro, porque é quase impossível estimular a criação de novos postos de trabalho quando cada trabalhador custa ao empregador o dobro do que lhe é pago a título de salário. Isso sem mencionar que a legislação em vigor é indiscutivelmente populista e propicia enxurradas de reclamatórias: só no ano passado foram registradas mais de três milhões de novos processos trabalhistas ― 50 vezes mais do que a média dos demais países ―, o que eleva o Brasil ao topo do ranking mundial nesse quesito.

Temer festejou a aprovação do texto base da reforma trabalhista, mas, por via das dúvidas, continua se empenhando no aviltante troca-troca de membros da CCJ, buscando amealhar votos suficientes para rejeitar o relatório do deputado Sérgio Zveiter. Num momento delicado, em que o governo não tem verba sequer para emitir passaportes, o Planalto liberou, nos últimos dois meses, mais de 1 bilhão de reais em verbas visando comprar o apoio dos deputados.

A rigor, a aprovação do relatório de Zveiter não faz grande diferença, já que a questão terá de ser debatida e votada no plenário da Câmara, onde o presidente precisa de 172 votos para se manter no cargo ― pelo menos temporariamente, já que Janot deve apresentar mais duas denúncias contra ele. 

Parece fácil, mas não é: devido à gravidade das denúncias, à fragilidade da defesa e ao peso do relatório de Zveiter, a posição do governo vem se se fragilizando dia após dia. O relator registrou que impedir que o Supremo julgue o presidente não lhe restabeleceria o vigor necessário para sairmos desta crise, e deixar sem esclarecimentos os incontáveis indícios de crime funcionaria como um ácido que corroerá diariamente sua já abalada autoridade.

O fato é que muita água ainda vai rolar por debaixo da ponte. Para o governo, é importante liquidar a questão até a próxima segunda-feira, antes do recesso parlamentar. Mas nada garante que isso venha a acontecer, e a cada dia aumentam as chances de fatos novos fragilizarem ainda mais a já delicada posição de Michel Temer nessa desgostante disputa pelo poder. E às favas com os interesses da nação!

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