No esquema esquadrinhado pela força-tarefa do juiz Moro, a “alma viva mais honesta do Brasil” ― ou Sumo-Pontífice da Petelândia, Parteiro do Brasil Maravilha, Pai dos Pobres e Mãe dos Ricos, Exterminador do Plural e Redentor dos Miseráveis, Picareta dos Picaretas ― está no topo da cadeia de comando do petrolão. Sua atuação em favor das empreiteiras foi crucial para garantir a sobrevivência do partido no poder e para lhe proporcionar benefícios pessoais ― dentre os quais as reformas do sítio em Atibaia e do tríplex no Guarujá, bancadas pelas construtoras OAS e Odebrecht, e os mais de R$10 milhões repassados à LILS PALESTRAS por companhias envolvidas no propinoduto da Petrobras. As investigações estavam no STF até a semana passada, mas parte dos inquéritos foi devolvida ao juiz Sergio Moro, uma vez que o petralha não tem mais direito a foro privilegiado. Na semana passada, ele recorreu da decisão de Zavascki e ajuizou ação contra Moro, numa tentativa de fugir ao cadafalso de Curitiba.

Observação: Ontem (24), o ministro decidiu enviar para a Justiça do Distrito Federal a denúncia sobre a compra do silêncio de Cerveró, contrariando Janot, para quem o caso deveria ficar no Paraná. Zavascki entendeu que a ação é de responsabilidade da Justiça do DF porque o ato espúrio teria sido levado efeito na capital federal, mesmo tendo desdobramentos no Rio e em São Paulo. organizada na capital federal, mesmo tendo fatos no Rio de Janeiro e em São Paulo. Há quem veja nisso uma tentativa de aliviar a situação do petralha. Eu, honestamente, já nem sei mais o que pensar.

A situação de Dilma também não é das melhores: além do processo de impeachment em andamento, sua campanha à reeleição está na mira da Justiça Penal. O STF deferiu recentemente o pedido feito por Janot para enviar a Moro o inquérito envolvendo Edinho Silva ― seu ex-ministro e ex-tesoureiro de campanha ―, que é investigado por oferecer facilidades contratuais no governo em troca de propinas. De acordo com Janot, “o pedido de pagamento de auxílio financeiro ao PT, notadamente para o custeio oficial e não oficial (caixa dois) das campanhas eleitorais, muitas vezes mediante cessação das facilidades proporcionadas ao núcleo econômico pelos núcleos político e administrativo da organização criminosa, revela-se como medida habitual, institucionalizada e centralizada, em parte, na pessoa de Edson Antonio Edinho da Silva”.

Segundo matéria publicada em IstoÉ, o arsenal de provas contra Lula será robustecido em breve pelo que os procuradores da Lava-Jato classificam de “bala de prata capaz de aniquilar o petralha”. O tiro de misericórdia deverá ser desferido pela delação premiada do empresário Léo Pinheiro, um dos sócios do grupo OAS, que já adiantou algumas das peças restantes do quebra-cabeças montado desde o surgimento das primeiras digitais da “jararaca” no esquema do petrolão. Pinheiro informa que, em troca das obras no sítio de Atibaia e no tríplex do Guarujá, o ex-presidente se ofereceu para traficar influência em favor da empreiteira no exterior ― o que se torna um crime ainda mais grave quando, em troca do auxílio, lhe foram ofertados favores privados provenientes de uma empresa implicada num dos maiores escândalos de corrupção da história recente do País.

Na opinião dos procuradores da Lava-Jato, as revelações de Pinheiro ferem Lula de morte: sua proposta de delação adianta que o petralha é o real proprietário dos imóveis retro citados, e o coloca a um passo de ser formalmente acusado, e um futuro julgamento, provavelmente conduzido pelo juiz Moro, poderá resultar em condenação superior a dez anos de reclusão.

Pinheiro prometeu detalhar o obscuro episódio do aluguel patrocinado pela OAS de 10 contêineres destinados a armazenar o acervo museológico do ex-presidente da República. O que se sabia até agora era que a empreiteira havia gasto R$ 1,3 milhão para guardar os objetos retirados do Planalto, do Alvorada e da Granja do Torto durante a mudança do ex-presidente. Parte dos itens foi acondicionada num depósito climatizado da transportadora Granero, e o restante, armazenado em outro galpão no bairro do Jaguaré, ambos em São Paulo. De lá, os itens foram transportados para o sítio em Atibaia.

Elaborado de forma dissimulada para escamotear seu real beneficiário, o contrato celebrado pela OAS com a transportadora, ao custo R$ 21.536,84 mensais por cinco anos, tratava da “armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da Construtora OAS Ltda.”. Todavia, IstoÉ apurou que, além de confirmar mais um préstimo ao petralha, as negociações ocorreram em dezembro de 2010, quando Lula ainda ocupava a Presidência da República.

A se consumar o que foi esquadrinhado nesse acordo de delação, será possível estabelecer que Lula cultivou uma relação assentada na troca de favores financeiros com a OAS quando ainda era presidente, desmontando o principal argumento utilizado por advogados ligados ao PT quando confrontados com informações sobre a venda de influência política por Lula no exterior para empresas privadas nacionais: o de que não constitui ilícito o fato de um ex-servidor público viabilizar negócios de empresas privadas nacionais com governos estrangeiro.

O que se tem até agora é apenas um aperitivo. O prato principal descerá ainda mais amargo para Lula, e virá a partir dos depoimentos propriamente ditos. Obviamente, é preciso que o delator comprove o que afirma para se credenciar à redução da pena. Mas Pinheiro afirma que está fornido de documentos e promete entregar todos eles aos investigadores, comprovado que tanto o sítio em Atibaia como o tríplex no Guarujá pertenceriam mesmo a Lula, a despeito de, no papel, figurarem como sendo dos empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar, irmão de Kalil Bittar, sócio de Lulinha. Na prática, Lula e sua família usufruíam e ditavam as ordens nos imóveis.

Observação: Além de abundantes indicativos relacionando Lula ao apartamento, reunidos num processo pelo Ministério Público de São Paulo, há uma foto ― já tornada pública ― que registra um encontro do próprio Léo Pinheiro com o ex-presidente, tirada do hall de acesso aos apartamentos durante uma vistoria padrão de entrega de chaves (segundo depoimento prestado por Wellington Carneiro da Silva, à época o assistente de engenharia da OAS, responsável por fiscalizar as obras do Edifício Solaris). No depoimento, o engenheiro disse que o imóvel estava em nome da empresa, mas ele sabia que era a família de Lula que iria ocupa-lo.

Lula continua a entoar, como ladainha em procissão, a fábula da superioridade moral, insistindo que “não há ninguém mais honesto do que ele”. No entanto, no desenrolar das negociações para a delação, Pinheiro, simpatizante do PT e com quem Lula viveu uma relação de amizade simbiótica desde os tempos do sindicalismo, o fará descer do pedestal ético que ergueu com a contribuição dos seus fiéis seguidores.

O acordo ainda não está sacramentado, mas flui como mel. Para os investigadores, no não pairam dúvidas: Pinheiro provará que Lula se beneficiou pessoalmente dos esquemas que fraudaram a Petrobras e reforçar uma das denúncias de que a Lava-Jato pretende apresentar por pelo menos três crimes relacionados ao Petrolão.

Já haveria elementos comprobatórios para implicar o petista por corrupção passiva e lavagem de dinheiro por favores recebidos não só da OAS, mas também da Odebrecht. Resta saber o momento em que as denúncias seriam apresentadas, uma vez que elas podem resultar numa condenação superior a dez anos de cadeia. Há uma vertente da Lava-Jato que prefere aguardar o desfecho da tramitação do impeachment de Dilma no Senado, visando evitar uma possível convulsão social no país. Outro grupo, por ora majoritário, não admite que o critério político prevaleça sobre o técnico.
Mensagens apreendidas no celular de Léo Pinheiro já evidenciavam a influência de Lula em favor da OAS no exterior.

Constam do relatório de cerca de 600 páginas encaminhados pela PF à PGR no início deste ano. Nas mensagens, o empresário conversava com seus funcionários para decidir viagens do ex-presidente ao exterior e mencionava a contribuição dele em obras fora do Brasil. No capítulo “Brahma” ― codinome de Lula no esquema em questão ―, a PF listou pelo menos nove temas de interesse de Pinheiro que teriam sido abordados com o petista, dentre os quais os programas no Peru, na Bolívia, no Chile, no Uruguai e na Costa Rica. Um torpedo que Jorge Fortes, diretor da OAS, enviou para Leo Pinheiro, dias depois de a presidente da Costa Rica ter anunciado o cancelamento da concessão outorgada à empreiteira para a construção de uma estrada orçada em US$ 523,7 milhões, diz o seguinte: “Presidente Lula está preocupado porque soube que o Ministério Público vai entrar com uma representação por causa da Costa Rica”. Num SMS para Pinheiro, em novembro de 2013, César Uzeda, outro executivo da OAS, diz que colocou um avião à disposição para Lula embarcar rumo ao Chile ao meio dia: “Seria bom você checar com Paulo Okamotto (presidente do Instituto Lula) se é conveniente irmos no mesmo avião”. No mesmo conjunto de mensagens, o ex-presidente da OAS diz para um funcionário da empreiteira: “Lula está procurando saber sobre obras da OAS no Chile”. Na delação, o empresário promete confirmar que as trocas de mensagens se referiam mesmo à atuação de Lula em favor da OAS no exterior.

Interessa à Lava-Jato perscrutar os segredos mais recônditos de Lula, e Léo Pinheiro gozava de intimidade suficiente para isso. Eles se conheceram no início da década de 1980, e quando o petista ingressou na política, o empreiteiro logo marcou presença como um dos principais doadores de campanha. A ascensão de Lula ao Palácio do Planalto foi acompanhada da projeção da OAS no mercado interno. Dono de acesso irrestrito aos gabinetes do poder, Pinheiro se referia a Lula como “chefe”. A relação desandou quando o empreiteiro foi preso e viu frustradas suas expectativas de que Lula intercedesse para livrá-lo da Lava-Jato. Ameaçado de morte num diálogo cifrado com um carcereiro no Complexo Médico-Penal de Curitiba, Pinheiro decidiu fazer do testemunho sua principal arma de defesa e trilha para salvação.

Na semana passada, o ministro Teori Zavascki também encaminhou para o juiz Moro apurações envolvendo os ex-ministros Jaques Wagner (Chefia de Gabinete da Presidência), Ideli Salvatti (Direitos Humanos) e Edinho Silva (Comunicação Social), além de José Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras.

Vamos continuar acompanhando para ver que bicho dá.