quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E GAMBIARRAS BIZARRAS — PARTE 3


O PRIMEIRO PECADO DA HUMANIDADE FOI A FÉ; A PRIMEIRA VIRTUDE FOI A DÚVIDA.

Quando ainda não havia TV a cabo nem (muito menos) Smart TV, os televisores eram analógicos e tinham qualidade de imagem muito inferior à dos modelos atuais. Por conta disso, conforme eu comentei nesta postagem, uma gambiarra largamente utilizada era colocar palha-de-aço (daquelas usadas para arear panelas, como Bombril, Assolan, etc.) nas extremidades das antenas da TV para melhorar a imagem. No entanto, esse truque não produzia nenhum efeito se a antena estivesse adequadamente posicionada. Mas se mudávamos de canal e não ajustávamos a posição da antena, ele ajudava a captar os sinais em mais direções, melhorando, ainda que minimamente, a recepção.

Observação: A TV a cabo surgiu nos EUA no final dos anos 1940, não para transmitir conteúdo exclusivo e pago, mas para melhorar o sinal enviado pelas emissoras através de ondas de rádio. Naquela época, a televisão ainda engatinhava (e só desembarcaria aqui pelas nossas bandas em 1950, por iniciativa Assis Chateaubriand). Fato é que, para estimular a venda dos então caríssimos aparelhos de TV, o comerciante John Walson instalou uma antena no alto de uma colina e de lá puxava cabos para as casas das pessoas que comprassem os aparelhos em sua loja. Outros o copiaram, não só nos EUA com em diversos países. No Brasil, a moda estreou em 1958, na cidade de Petrópolis (RJ). Mas o cabo só se tornou um meio de transmissão de conteúdo exclusivo décadas mais tarde, com o surgimento do canal HBO, que em 1972 transmitiu um jogo de hóquei seguido de um filme para 365 casas de uma cidade da Pensilvânia (EUA), cujos moradores concordaram em pagar pelo serviço. A ideia deu tão certo que o cabo virou sensação nos EUA nos anos 80, a exemplo do que aconteceria no Brasil mais de duas décadas depois.

Outra prática comum nas décadas e 1980/90 era assoprar os cartuchos de videogame antes de inseri-los nos consoles — prática que se estendeu aos disquetes, que foram durante anos a opção mais popular para armazenamento externo e transporte de arquivos digitais para usuários de microcomputadores (mais detalhes na postagem do último dia 11). Apesar de parecer um macete infalível, as gotículas de saliva que “contaminavam” os cartuchos de joguinhos podiam prejudicar os contatos. Mesmo assim, muita gente jurava de mãos postas e pés juntos que o truque funcionava.

É certo que o sopro podia até remover alguma poeira alojada nos contatos do cartucho, e talvez por isso a técnica até podia funcionar. O problema é que podia danificar o cartucho, não só pelas gotículas de saliva, mas também porque o ar quente que saía da boca do usuário criava uma leve umidade na fita, que, em contato com o console e devido ao aquecimento natural do cartucho durante seu funcionamento, produzia corrosão e podia causar danos tanto à fita quanto ao próprio console.

Igualmente c0mum (e tão inapropriado quanto) era limpar os contatos com um cotonete embebido em álcool de uso doméstico (que contém água), em vez de usar álcool isopropílico. E o mesmo raciocínio se aplicava à limpeza das cabeças de gravação/reprodução dos gravadores de fita K7, que eram muito populares naquela época.

Observação: Concluída a limpeza, era preciso esperar alguns minutos antes de recolocar o cartucho no console (ou a fita K7 no gravador), de modo a dar tempo para a secagem dos componentes. Se ainda assim o game não funcionasse, devia-se retirar e reinserir a fita (e repetir esse procedimento tantas vezes quantas fosse necessário). Se o problema persistisse, a recomendação era experimentar outro cartucho no console — para excluí-lo da lista de suspeitos — ou testar a fita no console de algum amigo — para ver se o problema não era o aparelho.

Outra gambiarra baseada em mito era “recarregar” pilhas não recarregáveis colocando-as no congelador. Na verdade, o procedimento favorecia uma reação química que rendia alguns minutos a mais de carga, mas não recarregava de fato as pilhas. Para saber mais sobre pilhas e baterias, comuns, alcalinas e recarregáveis, reveja esta postagem.

Observação: É importante frisar que uma pilha (ou bateria) convencional não pode ser recarregada, devendo ser descartada quando a quantidade de energia que ela armazena não é suficiente para fazer funcionar os aparelhos que deveria alimentar. Existem “carregadores” que prometem recarregá-las, mas sua composição química não prevê recargas — a tentativa pode, inclusive, resultar em vazamentos e explosões. Já as pilhas recarregáveis, como o nome sugere, podem ser “ressuscitadas” por aparelhos desenvolvidos especificamente para esse fim, embora não possam ser utilizadas indefinidamente, pois perdem a capacidade de armazenar energia depois de um determinado número de recargas.