quarta-feira, 8 de junho de 2022

DO ÁBACO AO SMARTPHONE (QUARTA PARTE)

UM FAVOR PODE MATAR ALGUÉM MAIS RAPIDAMENTE QUE UMA BALA.

Há no Brasil dois celulares ativos por habitante — o que não significa que cada pessoa possua dois aparelhos —, mas o home office e o ensino remoto impostos pela pandemia contribuíram para aumentar a procura por computadores convencionais (desktops e laptops). Prova disso é que as vendas desses aparelhos aumentaram 25% no quarto trimestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019. Isso porque, a despeito de serem versáteis e fáceis de usar, os pequenos notáveis ficam devendo processamento e memória, dimensões de tela, teclado físico, mouse e outros requisitos que inúmeras aplicações exigem.

A nanotecnologia encolheu os transistores, permitindo o encapsulamento de bilhões deles numa pastilha de silício menor que um selo postal. Em tese, quanto mais transistores, melhor o desempenho do processador; na prática, porém, o aumento da densidade dos chips reduz a condutividade elétrica do silício, e bilhões de interruptores nanoscópicos abrindo e fechando bilhões de vezes por segundo geram muito calor. E o calor foi um dos principais fatores que levaram a frequência de operação a estacionar na casa dos 3,5 GHz — embora testes realizados com o chip Intel Core i7-3770K demonstrem que ele suporta overclock de até 100% (ou seja, sua frequência de operação pode chegar a 7 GHz!). 

Os fabricantes vêm buscando alternativas à multiplicação dos transístores/aumento da frequência de operação para incrementar o desempenho dos processadores sem brigar com os indesejáveis efeitos colaterais — até porque refrigeração líquida não combina com notebooks nem (muito menos) com smartphones. A tecnologia atual já permite a produção de transistores de 4 ou 3 nanômetros (1nm corresponde a 1 milionésimo do milímetro), lembrando que isso não se refere exatamente ao tamanho dos transistores, mas à distância entre eles, e que essa nomenclatura deixou de ser usada no ano passado, quando a Intel anunciou que suas litografias passarão a ser nomeadas por números (falaremos mais sobre isso num dos próximos capítulos).

Tecnologias que permitem a produção de transistores ainda menores estão sendo desenvolvidas, inclusive com o uso de alternativas ao silício (entre as quais o grafeno). Em teoria, a adoção de materiais condutores com resistência próxima de zero permitiria elevar a frequência dos chips à casa do Zetahertz — dando por corretos os cálculos do www.converter-unidades.info, 1 ZHz corresponde a 1.000.000.000.000 de Gigahertz — levando a transferência de dados a uma velocidade próxima à da luz, mas aí entra em cena a questão do atraso do sinal, que leva vários picossegundos para ir de uma área a outra do chip.

Em última análise, a célebre Lei de Moore fica "mais lenta" conforme as coisas ficam menores. Isso não significa que os processadores deixarão de evoluir, mas que será preciso descobrir como produzir chips mais poderosos sem que o consumo de energia e a geração de calor aumentem ainda mais. Claro que esse problema afeta diretamente os chips feitos à base de silício, e substituir esse insumo pelo grafeno de carbono pode dar bons resultados. Mas essas coisas levam tempo e exigem muito dinheiro.

Depois que indústria passou a trabalhar na escala dos nanômetros, ficou difícil avançar como se avançava no passado, e aumentar o número de núcleos dos processadores foi a maneira que os fabricantes encontraram para contornar as dificuldades. O problema, sobretudo para os portáteis e ultraportáteis, é que as baterias não acompanharam pari passu a evolução dos aparelhos, e um processador rodando todos os seus núcleos numa frequência muito alta por muito tempo consome mais energia, reduzindo, consequentemente, o intervalo entre as recargas.

Hiper-Threading — multiprocessamento lógico adotado pela Intel no final do século passado — proporcionou um aumento considerável de desempenho ao levar um único processador físico a se comportar como dois, cada qual com seu controlador de interrupção programável e conjunto de registradores. Assim, a ideia básica deixou de ser a construção de CPUs/GPUs maiores e mais rápidas e passou a ser o uso de múltiplos núcleos para resolver problemas em paralelo mediante conexões de altíssima velocidade. 

O conceito de clock único também vem sendo substituído por uma "árvore de clocks" distribuídos para diferentes áreas do chip, operando em velocidades diversas e podendo ser desligados e religados de acordo com as necessidades (clock gating / power gating). Mas há limites para computadores convencionais (falaremos dos sistemas quânticos numa próxima oportunidade), a começar pelo tamanho dos transistores, que já corresponde a uns poucos átomos (um átomo de silício mede 0,2 nanômetros). 

Continua...