A tragicomédia do orçamento secreto — ora não tão secreto — começou lá atrás, sob Dilma, como forma de limitar a capacidade do Executivo de manipular votos no Congresso via distribuição de emendas. Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre aprimoraram a falcatrua dentro do mesmo espírito — ou seja, o Legislativo avançando em suas prerrogativas —, mas coube ao “gênio” político do capitão-bolsolão consumar a entrega de fatia importante de seus poderes aos chefões do Centrão, hoje os verdadeiros donos das principais decisões de governo, da chave do cofre e da máquina pública.
Há quem enxergue na decisão claramente política do STF de suspender as emendas do relator um esforço de “salvar” a democracia e princípios da Constituição. O que o Direito não consegue, porém, é salvar o Brasil do seu próprio sistema político, que funciona (desde sempre) para alimentar grupos privados (partidos políticos) que se juntam para apropriar-se de recursos públicos (estruturas do Estado e fundos) em benefício próprio.
O resultado dessa mixórdia — em parte um espelho da confusão mental de Bolsonaro, da qual o grande público está alheio — é uma considerável paralisia política, agravada por um quadro econômico que permanece em crescimento muito abaixo do necessário, com medíocre recuperação de emprego e renda. E o consórcio Centrão-Bolsonaro tem condições apenas de agravar esse quadro.
Alguns senadores levantam a hipótese de "manobra"
para destravar a execução da famigeradas "emendas de relator".
Rodrigo Pacheco enviou uma manifestação à ministra Rosa Weber em
que promete cumprir as decisões da corte relativas à transparência dessas
emendas, incluindo as informações referentes aos Orçamentos de 2020 e 2021.
Os parlamentares têm pressa, querem que o STF descongele logo essas emendas e
permita o pagamento dos valores dentro do Orçamento de 2021, véspera de ano
eleitoral.
Pacheco havia afirmado que era
"inexequível" detalhar as informações de Orçamentos passados
referentes aos pedidos que fundamentaram as emendas de relator, como, por
exemplo, quais parlamentares as indicaram. Em manifestação anterior, assinada
também pelo presidente da Câmara, o Congresso pediu o "reconhecimento da
impossibilidade fática e jurídica de cumprimento dos itens" da decisão que
dizem respeito à retroatividade da transparência a ser dada para a destinação
das emendas. Na peça enviada na última sexta-feira, porém, o Congresso adotou um novo tom e afirmou que vai cumprir a decisão do
Supremo "apesar da inexistência de obrigação legal anterior de registro
dos pedidos formulados ao relator-geral por senadores, deputados federais,
ministros de Estado, governadores, prefeitos e associações da sociedade civil".
Pacheco argumenta que não há "cadastramento prévio dos
mesmos" em um setor específico do Congresso Nacional, mas pediu ao relator
que sejam "adotadas as providências possíveis e necessárias para
individualizar e detalhar as indicações das emendas de sua autoria e declinar
as respectivas movimentações, apresentando, caso detenha, registros formais,
informações pretéritas ou atuais sobre essas indicações, ou justifique a
impossibilidade de fazê-lo".
Observação: Por entender "suficientes" as providências adotadas pelo Legislativo para "justificar o afastamento dos efeitos da suspensão determinada" pela corte, a ministra Rosa liberou a execução das emendas de relator que havia suspendido e ampliou de 30 para 90 dias o prazo concedido ao Congresso para informar o nome de todos os parlamentares beneficiados por essas verbas em 2020 e 2021. A decisão será submetida ao plenário da corte, mas ainda não há data definida para o julgamento.
O líder do Cidadania no Senado, Alessandro Vieira, que é um dos principais críticos das emendas de relator, afirma que a nova manifestação deixa claro que o Congresso "mentiu para o STF" anteriormente. Reportagem do jornal Folha de S.Paulo deste domingo mostrou como as emendas de relator distribuídas pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho, têm sido usado como moeda de troca política. Feitas essas breves considerações, passo ao texto que havia preparado para hoje.
A eleição de 2018 gerou o monstro do nazifascismo que tomou conta do Parlamento, dos executivos estaduais e, mais grave, da própria
Presidência. Ao invés da nova política largamente prometida durante a campanha de então, os brasileiros vêm assistindo a um espetáculo de distopia como o apresentado nos
clássicos “1984”,
“Admirável
mundo novo” ou “Fahrenheit 451”.
Sem reação organizada, a população canarinha aguarda bovinamente as próximas eleições, quando, imagina, tudo será resolvido pacificamente nas urnas. Até lá, deve-se rezar, pois Deus é brasileiro. Mas fica mais claro a cada dia que o bolsonarismo está conseguindo seus objetivos.
A ausência de um compromisso com os destinos do Brasil por
parte de amplos setores da elite política vem arrastando o país à crise mais
grave dos últimos 40 anos. A conjunção de diversas crises (econômica, política,
social e, principalmente, institucional) tende a transformar 2022 em um barril
de pólvora. E isso é tudo que desejam os nazifascistas bolsonaristas:
desmoralizar as eleições, criar um clima bélico e impedir o Brasil de escolher
propostas para enfrentar os graves problemas nacionais.
Não é difícil imaginar, por exemplo, que, enquanto ocorre um debate entre os principais candidatos, as torcidas se digladiem e descambem para um conflito de rua. Mas o país, inerte, assiste placidamente ao acirramento das contradições do bolsonarismo com a Constituição e o ordenamento legal.
O Brasil vai pagar pela irresponsabilidade de 2018. Como de hábito, o maior prejudicado será o andar de baixo. Mas todos vão perder. Não será tarefa fácil para o novo presidente, seja ele quem for, recuperar a confiança internacional, de governos e investidores, e mostrar que somos uma nação séria, que respeitamos as boas práticas de governança em relação ao meio ambiente e enfrentamos as questões mundiais de forma civilizada, respeitando as diferenças e buscando soluções harmônicas.