domingo, 29 de novembro de 2020

NA RETA FINAL

BETTER THE DEVIL YOU KNOW THAN THE DEVIL YOU DON'T 

Eleitores de 57 municípios, dentre os quais 17 capitais, voltam às urnas neste domingo para definir quem será o próximo prefeito. Em São Paulo, Bruno Covas lidera o páreo, mas Guilherme Boulos reduziu a diferença nas últimas duas semanas. Segundo o Ibope, o tucano deve receber 48% dos votos válidos e o candidato do Psol, 37% (de acordo com o Datafolha, a projeção é de 47% a 40%). 

O debate na Rede Globo, que deveria ter ocorrido nesta sexta-feira, foi suspenso depois que o candidato do Psol testou positivo para a Covid-19. Mas a pandemia também pode dificultar a vitória de Covas, que depende em grande medida do eleitorado mais idoso, cuja abstenção o repique da pandemia pode estimular.

Covas recebeu o apoio de Joice Hasselmann e Celso Russomanno, bem como dos partidos Solidariedade e PSD. Já a esquerda — PT, PCdoB, PSTU — se uniu em torno de Boulos, que também conta com o apoio da Rede, do PDT e do PSB (mas não do candidato derrotado Márcio França, que optou pela neutralidade).

Do resultado das urnas no último dia 15, infere-se que a polarização mais alinhada com a direita bolsonarista arrefeceu. Apenas dois dos treze candidatos apoiados pelo Presidente foram eleitos, nove ficaram pelo caminho e os dois que disputarão o segundo turno vão mal das pernas. A julgar pela distância entre Marcelo Crivella e Eduardo Paes, é mais fácil Marcola (chefe do PCC) ser canonizado que o sobrinho de Edir Macedo se reconduzido à prefeitura da capital fluminense.

Boulos rejeita o rótulo de “novo Lula”, mas imita os trejeitos do padrinho — que passou a apoiá-lo depois que o petista Jilmar Tatto amargou um obscuro sexto lugar. Insiste em vincular Covas a João Doria e age como se fosse o governador seu oponente no segundo turno. Para completar, ataca o vereador emedebista Ricardo Nunes, candidato a vice na chapa adversária, que em 2011 foi acusado de violência doméstica pela esposa com quem segue casado até hoje.

Como o macaco do ditado, que enrola o rabo, senta-se sobre ele e puxa o do vizinho, o candidato do Psol pendura nos chifres da Lua a própria vice, da qual se vale como “muleta” quando sua inexperiência na gestão pública é questionada.

Luiza Erundina — que aos 85 anos usa um carro adaptado para se proteger da Covid-19 — foi "a melhor prefeita que São Paulo já teve", diz Boulos, esquecendo-se muito convenientemente de mencionar que ela deixou a prefeitura com 40% de rejeição, não conseguiu eleger seu sucessor (o petista Eduardo Suplicy, que foi derrotado por Paulo Maluf) e tampouco se eleger prefeita novamente, embora tenha disputado o cargo em 1996, 2000, 2004 e 2016.

Observação: Para que o leitor tenha uma ideia, o índice de aprovação de Erundina em 1992 (29%) só não foi pior que o de Gilberto Kassab em 2012 (24%), de Fernando Haddad em 2016 (14%) e de Celso Pitta em 2000 (4%). Para efeito de comparação, a gestão de Bruno Covas conta com a aprovação de 43% dos paulistanos.

Uma curiosidade: A terceira maior doação para a campanha do candidato que se apresenta como de “esquerda-raiz”, no valor de R$ 88 mil, veio de uma herdeira da Andrade Gutierrez. O problema não é a doação em si, ou o valor, mas o fato de a Andrade Gutierrez ser uma das empresas mais corruptas do Brasil, como reconheceram seus diretores. Tanto é assim que eles confessaram espontaneamente a participação da empreiteira na rapinagem havida durante os governos Lula-Dilma e restituíram R$ 1 bilhão aos cofres públicos. Quando se trata de dinheiro, dizia Voltaire, todo mundo é da mesma religião.

Observação: O maior doador da campanha do Psol em São Paulo se chama Caetano Emanuel Viana Teles Veloso, que contribuiu com R$ 100 mil. Mas o músico, produtor e arranjador baiano, mais conhecido simplesmente como Caetano Veloso, ganhou esse dinheiro com seu trabalho. Demais disso, seu sobrenome não inclui nem Andrade, nem Gutierrez.

O PT esperava reverter este ano o fiasco de 2016, quando, das 27 capitais, conseguiu emplacar somente o prefeito de Rio Branco, sem mencionar que, em São Paulo, Fernando Haddad foi derrotado por João Doria já no primeiro turno. Agora, com apenas dois petistas disputando o segundo turno nas capitais — Marília Arraes em Recife e João Coser em Vitória — a quadrilha de Lula corre o risco de repetir o vexame.

Se Marília e Coser se elegerem, o resultado geral do partido será apenas um pouco melhor que o de 2016 e igual ao de 1996, quando conquistou apenas duas capitais. Se nenhum deles vencer, será o pior desempenho de toda a história da sigla nas disputas municipais. O que talvez fosse bom. 

Talvez assim o molusco abjeto finalmente se desse conta de que morreu e não sabe, pedisse o boné, desse o braço ao capitão conversinha e, juntos, atravessassem a ponte que partiu e seguissem rumo ao pôr-do-sol, ao ostracismo ou ao quinto dos infernos — fai ciò che vuoi con lui, non me ne frega niente.