O maior perigo de um presidente psicopata é a disseminação da irresponsabilidade, do desrespeito pelos outros, do pouco caso com a vida, do crime, da mentira e da destruição da Lei por toda a sociedade. Ele é um mau exemplo. Como autoridade, consagra a ideia de que a única legitimidade possível é pela violência, o desrespeito e a força bruta.
Jair Bolsonaro
tem vários traços de uma personalidade psicopática ou, mais precisamente,
possui uma mente delinquencial. Isso mesmo: uma pessoa antissocial e nociva para
a convivência.
Manipulador e narcisista, portanto, extremamente egoísta,
onipotente sem empatia pelos outros, aproveitador, arrogante e estúpido,
incapaz de reconhecer o sofrimento alheio e coletivo, sem generosidade com quem
não pertença ao seu círculo de semelhantes, vivendo em estado esquizoparanóide
quase permanente, impossibilitado de assumir os próprios erros e sempre
procurando alguém para botar a culpa.
Como é possível que um presidente votado por quase 60
milhões de cidadãos de uma sociedade organizada tenha escapado ao critério
seletivo de tanta gente? São todos cegos, insensíveis e ingênuos? Houve
manipulação ideológica?
Há quem diga, entre os cientistas políticos, que ele é um
caso de "presidente acidental", resultado das circunstâncias políticas
e sociais de um período de crise. Não dá para acreditar totalmente nisso, ainda
que, em parte, haja alguma verdade na "acidentalidade" do fenômeno Bolsonaro.
A "onda
Bolsonaro" seria o fruto de um vácuo que surgiu após o descrédito
parcial do PT (não foi total, pois o
candidato petista teve quase 50 milhões de votos), acrescido do lance da facada
(até agora obscuro) que provocou certa comoção e dó por parte dos eleitores.
Além disso, ajudou-o a evitar os debates que mostrariam melhor o seu perfil
íntimo e sua enorme ignorância cultural e dos problemas do país. Também
escondeu informações como sua ligação estreita com milicianos cariocas e o
crime organizado.
Os candidatos adversários tiveram pudor de expor tudo, pois
seria atacar uma vítima de uma "tentativa de assassinato".
O fato é que milhões se identificaram e muitos ainda se
identificam com os traços violentos e delinquenciais do candidato, hoje
presidente. Teremos no Brasil uma multidão de macunaímas sem nenhum caráter?
Parece.
Uma personalidade como a de Adolf Hitler, por exemplo, pode passar despercebida em seu caráter
deletério por algum tempo, em função da sedução que promove demagogicamente,
prometendo o paraíso e entregando algo. Hitler
era um ressentido, um artista fracassado, que não conseguiu passar no
vestibular para a Academia de Artes, mas com um dom de oratória e alguma
criatividade meio delirante. Ele tinha vergonha da origem humilde de seus pais
e da sua condição de cabo na hierarquia militar durante a Primeira Guerra. Mas
era mais inteligente do que o nosso neonazista caboclo e sabia organizar um
movimento, criando uma estética (discutível) própria.
Bolsonaro é um
ressentido que fracassou na carreira militar, sem nenhum talento criativo.
Também tinha vergonha de sua família humilde do interior em São Paulo e esconde
suas origens. O seu ferimento narcísico por ser expulso do Exército gerou
certamente nele um furor, escondido pela carreira política, igualmente medíocre
e, ao que tudo indica, corrupta.
Tem em comum com Hitler
a violência, o ódio a incapacidade para sentir a dor do outro. Adotou uma
ideologia barata de caserna, que lhe permite sair em defesa da tortura e do
assassinato de adversários políticos transformados em inimigos.
Decidido a ganhar dinheiro na política, aliou-se ao que havia
de pior no Rio de Janeiro e no resto do país, como o paulista Paulo Maluf, outro famoso por sua falta
de escrúpulos e sua "cara de pau".
O aspecto moral da psicopatia não é relevante em nada para o
próprio psicopata. Não se vê como um doente grave, na verdade um vírus
ameaçador para o tecido social.
Sua ambição é se aproveitar da sociedade em benefício
próprio. E só. Mas no caso de Bolsonaro
há um particular cinismo em tratar a morte e a doença dos outros, pois sua ação
é pautada pela destrutividade. Ele é radicalmente contra a
solidariedade e a própria associação de cidadãos livres. O mundo está dividido
entre ele e seus filhos, de um lado, e os inimigos do outro.
O fascínio por armas e meios de destruição, além de ser
lucrativo junto ao lobby dos fabricantes ("bancada da bala"), é algo
que ultrapassa o militarismo. É uma identificação com os grupos neonazistas e
supremacistas brancos norte-americanos. Ele imita o que julga ser a
legitimidade da força bruta e da imposição de poder dos racistas.
O psicopata pode ser, como dissemos, um perigo para o
conjunto da sociedade, isto é, um sociopata. O psicopata é um sujeito frio,
indiferente à dor alheia ("E daí? O que eu posso fazer?", diz o
presidente diante de mais de 200 mil mortos) e, muitas vezes, é um misógino.
Mas nem todo psicopata é um perigo explícito para a sociedade como um todo.
Muitos exercem suas características em âmbito restrito, socialmente
disfarçados, comportam-se cínica e agressivamente no casamento ou no trabalho,
mas não atingem o poder e o alcance de um Hitler,
de um Trump ou de um Bolsonaro.
O psicopata é, antes de tudo, um delinquente potencial.
Mente sobre fatos da realidade sem nenhum pudor. Sua relação com a Lei é para
negá-la, contorná-la, destruí-la ou usá-la a seu favor. Muitas vezes, é para
usá-la contra alguém.
No caso de Bolsonaro,
temos um presidente de inclinações delinquenciais que nega a destruição
provocada pela pandemia, um genocida, e usa o poder para livrar da cadeia seus
filhos identificados com o pai e vai fazer qualquer coisa para manter o poder.
Até mesmo provocar um golpe ou, como já preconizou, uma guerra civil.
O que um psicopata mais teme é a fraqueza, ou melhor, ter a
sua fragilidade revelada. No fundo, é um fraco. Daí, as bravatas e a exaltação
da "masculinidade", que quer provar com pistolas, bombas ou Medidas
Provisórias presidenciais.
*Reinaldo Lobo (https://www.facebook.com/reinaldo.lobo2)
é psicanalista, psicólogo, doutor em
Filosofia Universidade de São Paulo, membro efetivo e professor da Sociedade
Brasileira de Psicanálise de São Paulo e membro da International
Psychoanalytical Association.