Nosso grande estadista em fim de mandato teve mais de três anos para criar mecanismos que minimizassem os impactos do câmbio e da cotação do petróleo no mercado internacional no preço dos combustíveis, mas preferiu criticar as vacinas, os governadores e o STF pelos danos causados por sua incompetência. Agora, ele diz que vai mandar o Ministro de Minas e Energia notificar os postos que não reduzirem os preços (coisa que ele acha que deveria ocorrer depois da mudança de impostos aprovada no Congresso).
O ex-presidente João Figueiredo — que preferia o cheiro do dos cavalos ao cheiro do povo e disse a uma criança que “daria um tiro no coco” se ele fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo — ameaçava chamar Walter Pires, o linha-dura que ocupava o ministério do Exército na época, para sugerir que poderia dar o golpe. Em 1986, José Sarney levou às ruas milhares de “fiscais do Sarney” e chegou a mandar a Polícia Federal caçar boi gordo no pasto. Bolsonaro, que imita Figueiredo ameaçando golpe militar há tempos, resolve agora imitar Sarney. Já vimos esse filme e sabemos como ele termina.
Quando o preço do petróleo aumenta no mercado internacional, Bolsonaro diz que a alta não pode influir na Petrobras e pressiona a empresa a segurar o preço. Quando a cotação cai, ele afirma que a queda tem que influir na Petrobras e pressiona a empresa a baixar o preço. Mas só os idiotas veem contradição na conduta e nos argumentos do capetão, que são absolutamente coerentes: ele sempre diz e faz o que acha que vai ajudá-lo a se reeleger. Se isso fere a lógica, a Petrobras ou o Brasil, fodam-se a lógica, a Petrobras e o Brasil.
Já o ex-presidiário que aparece nas pesquisas como o queridinho do desmemoriado eleitorado canarinho culpa a privatização da BR Distribuidora (como se o motorista do caminhão que faz o frete determinasse o preço da mercadoria). Se for eleito, disse Lula, “o preço vai ser brasileiro, porque os investimentos são feitos em real”. Ciro Gomes, que carrega a lanterninha das intenções de voto, disse que “chegando ao governo (…) essa política vai mudar: a Petrobras vai cobrar quanto custa para produzir”.
Vale lembrar que o maior erro de Sarney, na edição do famigerado Plano Cruzado, foi tentar controlar a inflação por decreto. Parafraseando o jornalista H.L. Mencken, “todo problema complexo tem uma solução simples e errada”.
Bolsonaro, Lula e Ciro se esqueceram de combinar com os russos (e americanos, europeus, chineses). Se o preço for baixo aqui, ninguém venderá para o Brasil. Como não somos autossuficientes (ao contrário do que afirmam os petralhas), haverá desabastecimento. Gostemos não, obrigar a Petrobras a vender barato trará prejuízos à companhia e aos acionistas — costumeiramente apresentados como figuras satânicas que auferem lucros abusivos e indevidos, mas que são na maioria empresas e cidadãos brasileiros —, e o acionista majoritário da petrolífera é o próprio Brasil.
A “gerentona de araque” — que antes de ingressar na política faliu duas lojinhas de badulaque importados, e isso na época em que a paridade entre o dólar e o real era sopa no mel para esse tipo de comércio — represou o preço dos combustíveis e impôs à Petrobras um rombo de R$ 100 bilhões, que praticamente quebrou a companhia e se traduziu em mais dívida, descontrole fiscal, inflação etc.
A política de paridade com o preço internacional foi criada justamente para blindar a empresa contra governantes intervencionistas e irresponsáveis como Dilma e outros, de modo que o efeito será similar se o governo determinar o congelamento do preço e escrever um cheque para compensar a perda da Petrobras — ou se partir para a renúncia fiscal, conforme foi aprovado no Congresso. São outras soluções simples e erradas.
Lamentavelmente, ainda há no Brasil quem acredita (ou finge que acredita) em soluções mágicas e enxerga combustível fóssil como fator estratégico. Estratégico é educação, não petróleo. Privatizar a Petrobras geraria recursos para fazer o que é realmente importante, sem falar que a desconcentração reduziria o problema que estamos vivendo atualmente.
Enquanto o mundo civilizado investe em energia limpa, se organiza para abandonar um combustível ambientalmente insustentável e se prepara para entrar de vez no século XXI, o Brasil segue discutindo pautas dos anos 1950, dando subsídio (uniforme!) para combustível fóssil e destruindo o meio ambiente.
Pelo visto, só vamos entender o que está acontecendo quando não houver mais comprador para o petróleo. E isso não demora a acontecer.
Com Ricardo Rangel