Em 2018, as chances de um dublê de mau militar e parlamentar medíocre se tornar presidente cresceram exponencialmente porque seu principal adversário gozava férias compulsórias na carceragem da PF e se fez representar por um patético bonifrate. Assim, surfando no antipetismo, explorando a famosa facada e desfiando um rosário de promessas tão falsas, o "mito" induziu a minoria esclarecida do eleitorado a unir forças com os direitistas fanáticos... e deu no deu. Quatro anos depois, livre da cadeia, com a ficha lavada e as condenações anuladas por togados camaradas, o ex-presidiário mais famoso do Brasil conquistou um inusitado terceiro mandato.
O fato de se ter tornado o primeiro presidente que disputou a reeleição e acabou derrotado pelo desafiante diz muito sobre a decepção geral com o chefe do clã das rachadinhas e mansões milionárias. Foi graças a isso que algumas das vozes mais razoáveis, sensatas e equilibradas vieram a público manifestar apoio a um líder político que foi responsável pelo maior escândalo de corrupção da nossa história, e cuja estapafúrdia pupila e sucessora mergulhou o Brasil na pior recessão já enfrentada por um país que não estava em guerra.
A morte de Sombra, em 2016, foi a derradeira pá de cal na sepultura do "Caso Celso Daniel", até porque os demais participantes há haviam sido julgados e condenados. Mas a família da vítima insistiu na tese de crime político. Segundo o portal UOL, o político era conivente com o esquema de desvio de dinheiro articulado por José Dirceu e Gilberto Carvalho, mas resolveu acabar com a festa quando descobriu que Sombra, Ronan Maria Pinto e Klinger de Oliveira Souza estavam envolvidos — daí ele ter sido eliminado. Sua morte também foi suscitada na CPI dos Bingos — instalada depois que Waldomiro Diniz revelou que Dirceu cobrava propina de empresários para financiar as campanhas do PT — e voltou ao noticiário na 27ª fase da Operação Lava-Jato.
Conforme reportagem da Folha, vária pessoas que tiveram algum tipo de vínculo com o crime morreram em "circunstâncias misteriosas" — o que alimentou as suspeitas de queima de arquivo:
— Dionísio de Aquino Severo, resgatado por Sombra da prisão para organizar o sequestro e reunir os demais integrantes da quadrilha, foi morto dentro do CDP do Belém antes prestar depoimento à Justiça.
— Manuel Sérgio Estevam, que abrigou Severo depois do crime, foi metralhado em sua casa.
— O investigador de polícia Otávio Mercier, que ligou para Severo na véspera do sequestro, foi executado por homens que invadiram seu apartamento passando-se por policiais federais.
— O agente funerário Iran Moraes Redua — que identificou o corpo de Daniel — foi assassinado com dois tiros.
— O garçom que serviu Daniel e Sombra na noite do sequestro foi perseguido por dois homens quando dirigia sua moto, levou um chute, perdeu o controle e bateu em um poste (nada foi roubado).
— Paulo Henrique Brito, que testemunhou a morte do garçom, foi assassinado 20 dias depois com um tiro nas costas.
— O médico legista Carlos Alberto Printes, que encontrou indícios de tortura no corpo de Daniel, "cometeu suicídio" em 2006.
Segundo a Polícia Civil, nenhum desses crimes teve relação com o caso, mas as investigações foram reabertas três vezes e o assunto volta à tona de tempos em tempos.
Continua...