quarta-feira, 2 de julho de 2025

PALAVRAS E EXPRESSÕES QUE DEMANDAM ATENÇÃO — CONTINUAÇÃO

PODEMOS ESCOLHER O QUE PLANTAR, MAS SOMOS OBRIGADOS A COLHER O QUE PLANTAMOS.

Fiquei devendo uma explicação sobre o motivo de abordar este tema, que claramente foge ao "trivial variado" do blog. Vamos a ela — como diz o ditando, antes tarde do que nunca.


Os brasileiros falam mal e escrevem ainda pior. Isso se deve não só à péssima qualidade do ensino público (que já viu dias melhores) como também ao fato de os estudantes não cultivarem o saudável hábito da leitura, além de rabiscarem garranchos nas redes sociais numa linguagem espúria e repleta de abreviações. 


Não bastassem os indefectíveis erros de digitação, derrapadas na concordância verbal, nominal e de gênero são tão recorrentes quanto trocas de "s" por "z" (deslise), "ç" por "ss" (passoca), "ch" por "x" (xuxu), "g" por "j" (viajem), acréscimos e supressões indevidas — abisurdo, prostação —, vícios de linguagem — pra mim fazer — e pleonasmos viciosos — subir pra cima, entrar pra dentro —, entre outros.

 

Não seria de esperar que um aluno do ensino médio a tivesse a familiaridade de um Drummond ou um Vinicius com a inculta e bela Flor do Lácio, mas 30% de analfabetos funcionais entre a população de 15 a 64 anos e 12% entre os que completaram o ensino superior é o fim da picada. Por outro lado, se apedeutas e desletrados são mais fáceis de manipular, por que os governantes populistas investiriam na alfabetização básica da população? 


Manter o rebanho ignorante é sopa no mel para quem se alimenta da ignorância, se reelege distribuindo esmolas e governa com promessas vazias, slogans publicitários e programas que amarram em vez de emancipar. Afinal, povo instruído lê, desconfia, questiona, não se contenta com pão velho e circo medíocre, nem tampouco troca o voto por um saco de cimento, um vale-gás ou uma selfie com seu bandido de estimação. 


Infelizmente, o povinho de merda que o Criador escalou para povoar este arremedo de republiqueta de bananas repete a cada dois anos o erro que Pandora cometeu uma única vez, daí tantos políticos incompetentes, corruptos, que lucram com a miséria alheia travestindo assistencialismo de justiça social. Mas isso é outra história.

 

O que me levou a publicar esta trilogia sobre "dicas de português" aqui no Blog foi o uso recorrente de uma construção sintática que consiste em deslocar o sujeito para o início da frase, de maneira destacada, seguido de um pronome que o retoma — por exemplo: Mamãe, ela ficou de passar aqui mais tarde; meu avô, ele está velho demais para sair de casaDiferentemente do abjeto gerundismo, essa "deslocação topicalizante" não constitui erro gramatical. E não é exatamente uma novidade, já que aparece na literatura brasileira do século XIX e é comum no francês (mon père, il est malade) e no inglês (my dog, he is always barking), embora seja evitada no português europeu. 


Dito isso, voltemos às as dicas do ponto onde paramos no post de segunda-feira, mas não sem, antes, dedicar algumas linhas à abjeta política tupiniquim:


"Ninguém embarca em um navio se sabe que vai naufragar", lecionou Arthur Lira, hoje ex-imperador da Câmara, ensinando a Lula que não se deve confundir apoio congressual com apoio eleitoral. Sucessor e pupilo de Lira, o deputado Hugo Motta perorou: "Capitão que vê barco ir em direção ao iceberg e não avisa não é leal, é cúmplice. E nós avisamos ao governo que essa matéria de IOF teria muita dificuldade de ser aprovada no Parlamento". De quebra, criticou o discurso palaciano de que o objetivo é promover a justiça tributária.

Motta realmente avisou que o IOF não passaria, mas acenou com um prazo para o governo colocar uma alternativa sobre a mesa — que iria até a volta do recesso parlamentar. Dias depois, pôs Lula em rota de colisão com o iceberg ao pautar o decreto do IOF, que foi derrubado na Câmara e, duas horas depois, no Senado, em votação simbólica.

O Centrão está tratando o governo como um Titanic e se comportando como um navio que abandona os ratos, como se não houvesse representantes dos seus próprios partidos na Esplanada dos Ministérios. Lula, por seu turno, cutuca a onça com vara curta ao recorrer ao STF  e adotar o discurso dos "ricos contra os pobres", apresentando-se mentirosamente como defensor dos depauperados e reforçando a imagem (verdadeira) de que o Congresso cede ao lobby dos poderosos. 

Ambos parecem ignorar o enorme buraco nas contas públicas, que, se não for tapado — e tudo indica que não será —, produzirá um formidável apagão orçamentário em nome da disputa eleitoral e política. 


Coadunar-se — Verbo pronominal (essa decisão não se coaduna com a Constituição).

 

Cólera — Use como substantivo feminino em todas as acepções.

 

Comparecer — No sentido de apresentar-se em determinado lugar pessoalmente, pode ser transitivo indireto ou intransitivo (compareceu ao encontro na hora marcada; mesmo estando atarefado, não deixa de comparecer).

 

Comunicar — A regência culta é comunicar algo a alguém (o professor comunicou sua decisão aos alunos).

 

Congratular — Com o sentido de felicitar, é transitivo direto, não se conjuga de forma reflexiva nem exige qualquer preposição (congratulo Vossa Excelência pela sábia decisão). 

 

Componente — Como substantivo, pode ser usado nos dois gêneros (assim como agravante, atenuante, acompanhante, personagem, etc.)

 

Cônjuge — É substantivo masculino, ou seja, não existe a cônjuge.

 

Consistir — A regência tradicional é com a preposição em (a cirurgia consistirá numa incisão feita no tórax; o desafio consiste em identificar o problema a tempo de resolvê-lo).

 

Constar de / constar em — A regência tradicional é constar em, embora constar de também seja admissível.

 

Cumpre ressaltar / cumpre assinalar — Expressões que, a exemplo de vale assinalar, convém notar devem ser evitadas, pois nada acrescentam ao sentido do texto.

 

Dado / visto / haja vista — Os particípios dado e visto têm valor passivo e concordam em gênero e número com o substantivo a que se referem (dados o interesse e o esforço demonstrados; dadas as circunstâncias; vistas as provas apresentadas). Já a expressão haja vista, com o sentido de uma vez que, é invariável: O carro vale o preço pedido, haja vista sua excelente conservação.

 

Décimo primeiro, décimo segundo, décimo terceiro, etc. — Sem hífen.

 

Declinar — Transitivo direto ou indireto no sentido de recusar, refutar, rejeitar (declinou o convite ou declinou do convite).

 

Demais / de mais — Em uma só palavra, significa excessivamente; acompanhado de artigo — os demais — equivale a os outros, os restantes; escrito separado, contrapõem-se a de menos; e a expressão nada de mais é usada como sinônimo de inabitual.

 

Dentre — Usa-se apenas quando a frase exige a preposição de, ou seja, quando tem o sentido de do meio de (retirei um livro dentre muitos na estante). Nos demais casos, use-se simplesmente entre (apenas um entre nós sobreviverá).

 

Deparar — No sentido mais usual — de encontrar de maneira inesperada —, pode ser pronominal ou não (deparou com a mulher no saguão do hotel ou deparou-se com a mulher no saguão do hotel).


Dequeísmo — É o uso inadequado da expressão de que quando a proposição não é exigida pela regência do verbo, substantivo ou adjetivo. Trata-se de um vício de linguagem bastante comum, mas que deve ser evitado principalmente na escrita formal. Exemplos: acredito de que ele está certo (o correto é que ele está certo); desconfio de que ele está mentindo (prefira que ele está mentindo). Convém também evitar o que em expressões como no sentido de, a fim de, com o fito de, com a finalidade de, etc.

 

Desagradar — É transitivo direto ou transitivo indireto no sentido de causar reação desfavorável,  regendo a preposição a (o prato desagradou os comensais; a chuva desagradou aos banhistas).

 

Desobedecer — A regência tradicional exige a preposição a, ou seja, desobedecer a alguém ou a alguma coisa.

 

Despercebido — Passar sem ser notado é passar despercebido (e não desapercebido, que significa despreparado, desprovido).

 

Devido a — Sempre com a preposição a.

 

Dia a dia — Sem hífen.

 

Doutor — O Manual de Redação da Presidência da República restringe essa forma de tratamento a pessoas que tenham concluído curso de doutorado. Nos demais casos, senhor confere a desejada formalidade às comunicações.

 

Dupla negativa — Ao contrário do que ocorre em inglês, a dupla negação é aceitável em português: não encontrou ninguém, não deixou nada fora do lugar, etc.

 

Em detrimento — Exige a preposição de (em detrimento das negociações, e não em detrimento às negociações).

 

Em face de — Quando equivale a diante de, use a preposição de (evite dizer face a ou frente a).

 

Eminente – Significa importante; não confundir com iminente, que significa algo que deve acontecer em breve.

 

Em mão / em mãos — Os dicionários registram ambas as formas como sinônimas; portanto, pode-se entregar algo em mão ou em mãos.


Etc. — Embora a expressão já inclua a conjunção e (et coetera), o uso ou não da vírgula antes dela é uma questão de preferência ou estilo de escrita, não havendo uma regra rígida que determine sua obrigatoriedade.


Continua...