sexta-feira, 4 de outubro de 2019

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O CABEÇOTE, AS VÁLVULAS E O EIXO-COMANDO


TODO MUNDO TEM UM AMOR INESQUECÍVEL E UM SEGREDO INCONFESSÁVEL.

Por despretensiosos, os propósitos desta abordagem me autorizam a simplificar as explicações a ponto de definir o bloco do motor como o "habitáculo" dos cilindros (em cujo interior os pistões sobem e descem milhares de vezes por minuto, gerando o torque e a potência que fazem o veículo se mover) e o cárter como o repositório do óleo lubrificante (que reduz o atrito entre as partes móveis do motor). Mas a porca torce o rabo quando se trata do cabeçote, sobretudo porque esse componente, que nos projetos antigos era apenas uma "tampa" da câmara de combustão, passou a abrigar as válvulas e respectivo eixo-comando (ou árvore de cames), guias, molas de retorno, tuchos, retentores e outros, tornando-se o "sistema respiratório" do motor. Vamos aos detalhes.

O cabeçote consiste numa peça de ferro fundido — ou de alumínio — que é firmemente presa ao bloco por uma série de parafusos. Entre ambos, uma junta de metal multicamadas assegura um perfeito assentamento, evitando tanto o vazamento da compressão quanto a contaminação do óleo lubrificante pelo líquido de arrefecimento. Praticamente todos os motores de Ciclo Otto atuais são do tipo OHV (sigla em inglês para "válvulas sobre o cabeçote"), o que otimiza significativamente os fluxos de admissão da e de descarga.

Se o motor fosse uma orquestra, o cabeçote seria o maestro e o eixo-comando, sua batuta, pois é ele quem determina quando, por quanto tempo e com que intensidade os gases entram e saem dos cilindros. Note que, para tanto, é fundamental que  o "abre e fecha" das válvulas seja sincronizado com o "sobe e desce" dos pistões.

Não custa lembrar (mais uma vez) que as quatro fases (ou tempos) do ciclo Otto são admissão, compressão, combustão e descarga, e que o pistão percorre quatro vezes seu curso a cada volta completa do virabrequim, alternando movimentos ascendentes e descendentes. Por curso, entenda-se a distância que o êmbolo percorre do PMS (ponto morto superior) ao PSI (ponto morto inferior) e vice-versa, conforme, aliás, foi explicado nos capítulos anteriores.

Na primeira fase, o movimento descendente do pistão, combinado com a abertura da válvula de admissão, cria uma depressão que suga para o interior do cilindro a mistura ar-combustível preparada pelo sistema de injeção eletrônica de combustível (ou pelo carburador, no projetos de antigamente). Na segunda, com ambas as válvulas fechadas, a subida do embolo comprime essa mistura no interior da câmara de explosão. Na terceira, ainda com ambas as válvulas fechadas, a centelha produzida pela vela inflama a mistura, que se expande e empurra o êmbolo em direção ao PMI, produzindo o torque e a potência que fazem o veículo se mover. 

Observações: 1) Por câmara de combustão (ou de explosão, dá no mesmo), entenda-se o espaço entre a base do cabeçote e a cabeça do pistão quando este atinge o porto morto superior do curso; 2) um motor à combustão gera torque e potência convertendo o poder calorífico do combustível na força (energia cinética) que a combustão da mistura exerce sobre o pistão, que a biela converte no movimento rotacional do virabrequim, que, com o concurso dos sistemas de embreagem e transmissão, é direcionado às rodas motrizes do veículo, fazendo-o se movimentar. 

Na quarta e última fase, a abertura da válvula de escapamento faz com que o movimento novamente ascendente do êmbolo expulse os gases remanescentes da combustão e prepare o cilindro para um novo ciclo de quatro fases.

Resumo da ópera: Fechada pela ação da respectiva mola de retorno, a válvula de admissão impede que a mistura passe do coletor de admissão para o cilindro, e o mesmo se aplica à válvula de escapamento em relação à saída dos gases resultantes da combustão dessa mistura. Note que o cilindro precisa ficar fechado hermeticamente durante as fases de compressão e de combustão, e que as válvulas precisam abrir, cada qual a seu tempo, nas fases de admissão e de escapamento.