Nelson Teich divulgou no último sábado, 23, ter
recusado um convite para ser conselheiro do Ministério da Saúde. Em
postagem no Twitter, o oncologista disse que “não seria coerente ter
deixado o cargo de ministro da Saúde na semana passada e aceitar a posição de
conselheiro na semana seguinte”. Aplausos para o ex-ministro. De bobos da
corte, o quadro palaciano está mais que completo.
Abrilhantam a Esplanada um ministro da educação mal-educado,
que defende a prisão de ministros do STF; uma ministra que viu Jesus na
goiabeira e quer prender governadores e prefeitos; uma (agora ex) secretária da
Cultura que dá
piti no ar e interrompe entrevista porque o script “fugiu ao
combinado”; um ministro que enche o tempo (e o saco) com notas de repúdio ao Supremo
por ter sido convocado a depor debaixo de vara, e que acha que periciar o
telefone do capitão trará “consequências
imprevisíveis”; um ministro que concorda
e apoia a opinião do ministro anterior e, pior, fala em nome das Forças
Armadas...
Isso sem falar nos ministros terraplanistas, criacionistas,
negacionistas... Tem até ministro que acredita (mesmo) que o general da banda
comanda. Suas excelências devem ter tomado muita cloroquina. Ou tubaína.
Interlocutores ligados à Globo vazaram que a emissora
cresceu o olho para o Ibope do vídeo da reunião interministerial, que deu de
lavada na novela Malhação — exibida pela Vênus Platinada desde o
tempo em que televisor era movido a corda. Já se fala num projeto de filmar
outras reuniões e exibi-las numa minissérie, cujo título será escolhido pelo
diretor de dramaturgia, Sílvio de Abreu, entre as diversas sugestões
apresentadas. Entre as cotadas estão “Palhação”, “Empulhação”, “O
Canastrão” e “O Canetão”.
Brincadeiras à parte, uma série de mensagens trocadas entre o presidente e o
então ministro da Justiça evidencia que o primeiro falava da Polícia Federal,
e não de sua segurança pessoal, quando exigiu substituições nessa área na fatídica reunião
ministerial.
A cronologia de oito
diálogos aos quais o Estadão teve acesso mostra que Bolsonaro chegou
à reunião com a decisão já tomada de demitir o diretor-geral da PF: “Moro,
Valeixo sai esta semana”, escreveu o presidente às 6h26 de 22 de abril. “Está
decidido”, continuou ele, em outra mensagem enviada na sequência. “Você
pode dizer apenas a forma. A pedido ou ex ofício”. A resposta de Moro
foi enviada 11 minutos depois, às 6h37. “Presidente, sobre esse assunto
precisamos conversar pessoalmente. Estou ah (sic) disposição para tanto”.
Em outra sequência de mensagens, enviadas também antes
da reunião ministerial, Bolsonaro encaminha dois vídeos e reclama com Moro
de ser informado por “terceiros”. “Força Nacional, Ibama, Funai... As coisas
chegam para mim por terceiros... Eu não vou me omitir”, disse o presidente
às 8h01m.
Na reunião ministerial, Bolsonaro demonstrou
irritação. “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro,
oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar foder a minha
família toda, de sacanagem, ou amigos meu (sic), porque eu não posso trocar
alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai
trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele?
Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, disse o
presidente, olhando para Moro.
As mensagens que agora vêm à tona contrariam a versão de Bolsonaro
de que Valeixo pediu para ser demitido, além de ajudarem a explicar o
comportamento de Moro na reunião. O ex-ministro ficou em silêncio quando
foi constrangido pelo chefe, que cobrou mudanças nas áreas de inteligência.
Àquela altura, ele já havia sido comunicado da decisão unilateral de demitir Valeixo,
sem que pudesse opinar a respeito. Na entrevista que o Fantástico levou ao ar neste domingo, Moro reforçou essa justificativa, além de afirmar que "o ambiante claramente não abria espaço para o contraditório". Disse ainda que se valeu de um compromisso previamente agendado para antecipar sua saída da reunião. Menos de 48 horas depois, o então ministro pediu sua exoneração.
Bolsonaro tem sustentado em entrevistas que foi Valeixo
quem pediu para ser demitido. Segundo ele, isso comprova que não houve
interferência da sua parte. “O senhor Valeixo de há muito vinha falando que
queria sair. Na véspera da coletiva do senhor Sérgio Moro, dia 24 (de
abril), o senhor Valeixo fez uma videoconferência com os 27
superintendentes do Brasil, onde disse que iria sair. Eu liguei pro senhor
Valeixo, o qual respeito, na quinta-feira, à noite. Primeiro ele ligou pra mim.
Depois eu retornei pra ele. ‘Valeixo, tudo bem?. Sai amanhã? Ex officio ou a
pedido?’. A pedido (foi a resposta de Valeixo,
segundo Bolsonaro). E assim foi publicado no DOU. Lamento
ter constado o nome do ministro da Justiça ali. É porque é praxe”, disse o
presidente na noite de sexta-feira, após a divulgação do vídeo.
Em depoimento no inquérito, no dia 11 de maio, Valeixo
contou que jamais formalizou um pedido de demissão. De acordo com ele, um dia
antes da publicação no Diário Oficial, recebeu um telefonema do próprio
presidente questionando se ele concordava que sua exoneração saísse a pedido.
Sem alternativa, assentiu. Valeixo relatou, ainda, que Bolsonaro
justificou que queria alguém no cargo com quem tivesse “afinidade”.
A troca de mensagens foi extraída do celular de Moro
durante seu depoimento. Na ocasião, peritos da PF fizeram uma varredura
completa no aparelho, em busca de mensagens que poderiam comprovar a acusação
contra o presidente. Na sexta-feira, o ministro Celso de Mello
encaminhou à PGR um pedido de partidos de oposição para que o celular de
Bolsonaro fosse apreendido em busca de mais provas da suposta
interferência dele na PF. A reação do Planalto veio do general Augusto
Heleno, que, em nota, disse que uma decisão favorável a esse pedido poderia ter “consequências
imprevisíveis para a estabilidade nacional”.
Três horas depois dos diálogos obtidos pelo Estadão, nos
quais Bolsonaro dá a ordem para mudar a PF, ocorreria a reunião
ministerial tornada pública na sexta-feira, na qual o presidente afirma
claramente que desejava troca na “segurança” do Rio. Chegou a dizer que era
alvo de “putaria o tempo todo” para atingir não só ele como sua família.
Bolsonaro disse ali que não podia ser “surpreendido
com notícias”. “Pô, eu tenho a PF que não me dá informações”, reclamou. E
assegurou, ainda, que ia interferir em todos os ministérios. “Não dá pra
trabalhar assim. Fica difícil. Por isso, vou interferir! E ponto final, pô! Não
é ameaça, não é uma … uma extrapolação da minha parte. É uma verdade”,
afirmou, olhando para o lado onde estava Moro.
A versão de que o presidente se referia à sua segurança
pessoal no Rio, e não à PF, é colocada em xeque por mudanças ocorridas no
escritório do GSI no Rio, dois meses antes da reunião ministerial. A
contradição foi revelada pelo Jornal Nacional. A reportagem mostrou
também que, 28 dias antes daquela reunião, o responsável pela segurança do
presidente havia sido promovido.
Em 5 de maio, Bolsonaro exibiu o seu celular com
mensagens trocadas por ele e Moro na tarde do dia 22 de abril para dizer
que o ex-ministro havia mudado de versão sobre a tentativa de interferência na PF.
“Isso é uma mentira deslavada”, disse. No entanto, a conversa ocorrida
na manhã do dia 22, em que Bolsonaro avisa a Moro que demitirá Valeixo,
não foram mostradas pelo presidente.
O Estadão procurou a Secom para
falar sobre as mensagens, mas o Planalto informou que não iria comentar. A
defesa de Moro disse que “as declarações do presidente da República
demonstram, de maneira inquestionável, sua vontade de interferir indevidamente”
na Polícia Federal. “Esses elementos probatórios somam-se às demais
diligências investigatórias, inclusive ao vídeo da reunião de 22 de abril,
comprovando as afirmações do ex-ministro Sérgio Moro”, afirmou o advogado Rodrigo
Rios.
Fica cada vez mais nítido que este governo apodreceu. Urge
concitar o excelso general da banda a enfiar a cloroquina no saco e ir tocar em
outro coreto.