terça-feira, 24 de novembro de 2020

A RESPONSABILIDADE E OS IRRESPONSÁVEIS

 


A boa notícia: o primeiro lote da CoronaVac (aquela que o mandatário de turno chama maldosamente de “vacina chinesa do Doria”), composto por 120 mil doses já prontas, desembarcou em terra brasilis na última quinta-feira (19). Novos lotes de um total de 46 milhões de doses devem chegar nas próximas semanas, juntamente com a matéria prima que permitirá ao Instituto Butantan produzir o imunizante localmente.

Agora a má notícia: reportagem publicada pelo jornal O Estado de São Paulo no último domingo apontou que 6,86 milhões de testes para a Covid-19 — que custaram R$ 290 milhões — podem perder validade até janeiro de 2021. É mais do que os 5 milhões de testes já aplicados no SUS desde o início da pandemia.

Outra boa notícia: Na sexta-feira (20), a Anvisa autorizou uma alteração nos protocolos dos testes clínicos da vacina contra a Covid-19 desenvolvida por AstraZeneca e Universidade de Oxford. Parte inferior do formulárioAlém disso, um documento assinado em agosto entre governo do Paraná e o instituto de pesquisas russo Gamaleya, prevê a produção local da vacina Sputnik V, que já teve resultados preliminares de testes de fase 3 divulgados no início de novembro (sem terem passado, no entanto, por publicação em revistas científicas independentes). 

Observação: Ocorrem no Brasil também estudos clínicos do produto desenvolvido por BioNTech e Pfizer, e do produto desenvolvido pela Janssen em parceria com Johnson & Johnson. Ainda não há um acordo firmado pelo país para a compra desses produtos, mas o desgoverno federal afirma que estuda a compra das vacinas de Janssen, Instituto de Pesquisa Gamaleya, Moderna e Covaxin.

Outra má notícia: O novo aumento no número de casos de contaminação, internações e óbitos pela pandemia de coronavírus em diversas regiões do país gerou um refluxo na tendência otimista observada na percepção dos brasileiros sobre a situação da crise sanitária. Pela primeira vez em quatro meses, o grupo de entrevistados que acreditam que o pior da pandemia ainda está por vir supera numericamente os que imaginam que o pior já passou: 47% contra 46%. Em outubro, a relação era de 64% a 30% para os otimistas.

Resumo da ópera: O total de testes RT-PCR realizados no Brasil caiu em outubro pelo segundo mês seguido, o que é visto com preocupação. Segundo especialistas, o país deveria estar no caminho inverso, ou seja, ampliando os testes para rastrear e frear o avanço da pandemia. Pelo visto, além de não fazer praticamente nada para ajudar estados e municípios na luta contra a pandemia, os "interventores" do Ministério da Saúde conseguem ainda desarrumar o que estava funcionando.

Responsabilidades: O Ministério da Saúde — que está sob intervenção militar desde a demissão de Nelson Teich e, graças à execrável atuação de vocês sabem quem no comando do batalhão de atabalhoados que tomaram de assalto a pasta, virou um “cabidão” para amigos e correlegionários do mandatário de turno pendurarem a farda — espera receber ainda nesta semana estudos que indiquem a viabilidade de prorrogar essa data de vencimento.

Confrontado com descalabro, o capitão-cloroquina culpou governadores e prefeitos: "Todo o material foi enviado para Estados e municípios. Se algum Estado ou município não utilizou deve apresentar seus motivos", vociferou sua alteza real nas redes sociais, numa aparvalhada tentativa de negar o que o próprio Ministério da Saúde já havia admitido: os testes não foram enviados à rede hospitalar pública, mas guardados num armazém do governo federal no Aeroporto de Guarulhos, São Paulo, e têm chances reais (sem trocadilho) de virar lixo.

Ironicamente, a logística é justamente a especialidade do atual ministro da Saúde. A notícia chega num instante em que o país se inquieta com a falta de transparência do governo na elaboração de um plano de distribuição das vacinas que estão por vir. Em vez de tranquilizar a população, nosso líder oferece mais razões para preocupação.

O presidente não reparou, mas cada vez que declara que determinado problema não é seu, sua atitude se transforma no próprio problema. Como sempre, também no caso dos testes, os culpados são os outros: governadores e prefeitos. Sua excelência só conhece um tipo de autocrítica: a autocrítica a favor. Comporta-se como se estivesse sempre liberado de todo o exame do mal — principalmente o mais difícil, que é o autoexame.