O nome “Lázaro” é a forma abreviada de Eleazar,
que em hebraico significa “aquele a quem Deus ajudou”. A Bíblia menciona
dois Lázaros. Um deles, segundo o Evangelho de João (11:43-44), foi
trazido de volta do mundo dos mortos pelo Filho do Pai; o outro, reza o Evangelho
de Lucas (16:20),
era um mendigo que tinha o corpo coberto de chagas, daí “lazarento” ser sinônimo
de “leproso” e São Lázaro, o padroeiro dos hansenianos (e dos
capricornianos, segundo esotéricos e assemelhados).
A Ressurreição de Lázaro é um dos mais notórios milagres atribuídos a Jesus. Outro é a travessia do Mar Vermelho. De acordo com o Êxodo 14:16-22, o vento soprou de leste durante uma noite inteira no Golfo de Aqaba (cuja largura máxima é de 24 km), abrindo as águas e permitindo a passagem de Moisés e sua trupe — pela manhã, o mar se fechou novamente e, para a sorte dos hebreus, bem em cima dos egípcios que os perseguiam.
Acreditar nas histórias da Bíblia é uma questão de fé. Do ponto de vista estritamente racional, a única afirmação possível é a de que milagres não existem. Como não existem discos voadores. Só que os EUA não sabem explicar pelo menos 143 aparições de OVNIs. Eu, particularmente, não acredito em bruxas, pero que las hay, las hay!
Lázaro (o ressuscitado, não o mendigo) era amigo de Jesus
e morreu durante uma viagem do mestre. Quatro dias depois do sepultamento, o Messias
(falo do Filho do Pai, não da versão tabajara que não miracula) mandou abrir
a caverna e ordenou ao egum mal despachado que saísse. E ele saiu. A propósito,
a médica Elza Dias Tosta, presidente da Academia Brasileira de
Neurologia, pondera que alguns diagnósticos possíveis seriam a narcolepsia
ou a catalepsia,
que, dada a falta de recursos médicos da época, seriam facilmente
confundidas com morte.
Voltando ao psicopata assassino — dono de uma capivara de dar inveja a muito político que se preza — Lázaro vinha cometendo crimes desde 2007 e conquistou seus 15 minutos de fama graças a sua extraordinária expertise na arte do escapismo, que deve ter deixado Fabrício Queiroz roxo de inveja. De acordo com os policiais, o criminoso vestia um casaco com um distintivo antigo PM do DF quando foi encontrado, e atirou diversas vezes.
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado elogiou a polícia pelo trabalho: “Goiás não é Disneylândia de bandido”, postou ele no Twitter. Alguém deveria lembrá-lo de que o Distrito Federal está localizado justamente no Estado que ele governa. O presidente Bolsonaro também cumprimentou os policiais: “Parabéns aos heróis da PM-GO por darem fim ao terror praticado pelo marginal Lázaro, que humilhou e assassinou homens e mulheres a sangue frio. O Brasil agradece! Menos um para amedrontar as famílias de bem. Suas vítimas, sim, não tiveram uma segunda chance. Bom dia a todos! Lázaro: CPF cancelado”, postou sua alteza no Twitter. Quando mais não seja, essas postagens são a prova provada de que mesmo um relógio quebrado dá a hora duas vezes por dia.
Lázaro foi condenado por homicídio (na Bahia) e era
procurado no DF e em Goiás por crimes de roubo, estupro e porte ilegal de arma
de fogo. Chegou a ser preso em 2009, mas não retornou da “saidinha de Páscoa”
em 2016. Foi recapturado dois anos depois, tornou a fugir dali a poucos
meses e acabou matando a tiros e facadas três pessoas na zona rural de
Ceilândia (no último dia 9) e sequestrando a mulher de uma das vítimas (cujo
corpo foi encontrado à beira de um córrego três dias depois).
Ao longo as últimas três semanas, esse assassino sanguinário matou o caseiro de uma fazenda, invadiu pelo menos ouras onze propriedades, baleou dois policiais militares e um oficial da FAB, roubou e incendiou um carro, manteve refém um casal e uma adolescente de 16 anos, trocou de tiros com a polícia, e por aí segue a procissão.
A
ex-mulher e a sogra desse “anjinho” estão sendo investigadas por suspeitas de
tê-lo acobertado. Um caseiro, suspeito de tê-lo
ajudado a fugir, revelou que ele dormiu na fazenda em que a
polícia foi impedida de entrar pelo proprietário. Patrão e empregado —
que não tiveram as identidades reveladas — foram autuados em flagrante
por porte ilegal de arma (uma garrucha calibre 22 com 50 munições foram
encontradas em poder de um deles) e facilitação de fuga de foragido.
Na mochila encontrada com Lázaro, havia armas, comida e mais de R$ 4 mil em espécie. Especula-se, inclusive, que fazendeiros da região o estariam acobertando e financiando outros jagunços para “tocar o terror” e derrubar o preço das propriedades (para então comprá-las a “preço de banana”). Aliás, suspeita idêntica recaiu sobre Nero por ocasião do incêndio de Roma, mas isso já é outra conversa.
Importa dizer que já tem gente reclamando do “desfecho” da novela, alegando — pasmem! — que a polícia deveria ter capturado o criminoso vivo. Só faltou dizer que os agentes podiam ter lhe dado bombons enquanto se desviavam das balas de sua .380.
A deputada Vivi Reis, do PSOL, causou polêmica nas redes sociais ao publicar uma postagem acusando os policiais de matar o maníaco sem “ouvir” o que ele tinha para dizer: “Lázaro foi preso e morto. A perseguição do criminoso deixou um lastro de ódio, intolerância religiosa e abusos. A celebração de sua morte é retrato da espetacularização dessa caçada de 20 dias e R$ 19 milhões. Quando o capturam, ao invés de ouvi-lo, o executam. Vexame”, escreveu a parlamentar (não me perguntem onde ela apurou o valor que mencionou em sua postagem).
Importa dizer também que o Brasil que tirou Lázaro da cadeia foi o mesmo que libertou certo ex-presidente, ex-presidiário e agora “ex-corrupto”. Não se pretende comparar os crimes de um com os do outro, mas ambos denunciam as anomalias de um sistema judiciário doente.
A parcialidade
apontada pelo STF no processo do tríplex — que o ministro Gilmar
Mendes estendeu às demais ações que tramitaram contra o petralha em Curitiba,
pouco se importando com o fato de o caso do sítio ter sido
julgado pela juíza Gabriela Hardt e o do Instituto Lula ainda estar
em fase de instrução — lavou a ficha do criminoso, que responde atualmente a apenas 3
dos 17 processos ou inquéritos dos quais já foi alvo na Justiça.
Na última segunda-feira, o ministro Lewandowski usou as mensagens roubadas pela Vaza-Jato para anular
as provas que a Odebrecht forneceu contra Lula, usando como pretexto a ilegalidade do acordo de leniência
celebrado entre a empreiteira e autoridades estrangeiras. Não há nada que
demonstre essa ilegalidade, exceto as imposturas dos advogados do picareta dos picaretas, mas para o magistrado cujos ombros
foram recobertos pela suprema toga graças ao réu, com quem comia frango à passarinho em São Bernardo do Campo, o "motivo" foi mais que suficiente.
Observação: Ricardo Lewandowski foi
indicado por Lula para ocupar a vaga aberta com a aposentadoria
da ministro Carlos Velloso, em 2006, graças
ao apadrinhamento de Walter Demarchi. Durante o julgamento do
mensalão, o ministro que vestiu a toga sobre a fatiota de militante petista retribuiu a gentileza atuando mais como
defensor dos mensaleiros do que como julgador. E repetiu a dose no impeachment de Dilma, quando era presidente do Supremo. Claramente mancomunado
com o senador Renan Calheiros (que na época presidia o Senado), Lewandowski fatiou
o objeto da votação em dois quesitos, evitando a cassação dos direitos
políticos da mulher sapiens.
O acordo de leniência da Odebrecht foi anulado por uma decisão sob medida para servir aos interesses do ex-corrupto, mas fará com que as confissões dos empreiteiros que pagaram propina a Lula e as provas que forneceram aos procuradores acabem na lata do lixo.
Como o Lázaro do Evangelho
de João, Lula morreu, mas ressuscitou.
O STF merece todo o nosso respeito como instituição,
mas o mesmo se dá com seus membros, cujas decisões teratológicas envergonham
os cidadãos de bem deste país. O entendimento gestado e parido com a finalidade única de beneficiar o sumo pontífice da seita do inferno (que não foi declarado inocente, mas teria de
nascer de novo para tornar a ser julgado, dada a morosidade de Justiça e a famigerada prescrição) e os
argumentos dos ministros que consideraram Sérgio Moro suspeito são
igualmente vergonhosos. Lula foi julgado culpado por mais de dez
magistrados em três instâncias do Judiciário. A anulação dessas decisões, baseada
numa questão competência jurisdicional, dá aos criminosos a certeza de
que o Brasil é o país da impunidade.
Se fossem usadas esses mesmos pesos e medidas, os togados nomeados durante os governos petistas seriam suspeitos para votar processos em que o Lula figurava como réu. Alguns deles tinham, inclusive, relacionamentos pessoais com o ex-presidente. O problema é que esses autodeclarados semideuses são “supremos” e não há quem possa jugar sua imparcialidade. Infelizmente.
Veja, por exemplo, o caso do ex-governador fluminense Sérgio Cabral, condenado a mais de 300 anos de prisão. Em sua delação, Cabral acusou o ministro Dias Toffoli de comercializar decisões através do escritório de advocacia de sua esposa e receber R$ 4 milhões. Mas o ministro não se deu por impedido de participar do julgamento. Ou seja: Toffoli julgou a si mesmo.
Haveria
dezenas de outros exemplos a citar, mas é melhor parar por aqui.