quarta-feira, 4 de agosto de 2021

VADE RETRO!


Na última segunda-feira, o plenário do TSE aprovou por unanimidade a proposta de converter em inquérito administrativo o procedimento aberto para apurar alegações de fraude nos pleitos presidenciais de 2014 e 2081 — incluindo no escopo da investigação crimes de abuso de poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação social, corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes públicos e propaganda antecipada em relação aos ataques contra o sistema eletrônico de votação e à legitimidade das Eleições Gerais de 2022.

Também por unanimidade, o plenário da corte eleitoral aprovou o encaminhamento ao STF de notícia-crime contra Bolsonaro por conduta criminosa relacionada aos fatos apurados no Inquérito das Fake News. O ofício, assinado pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, encaminha ao ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no Supremolink do pronunciamento feito por Bolsonaro em 29 de julho.

Mais cedo, o ministro Luiz Fux havia feito uma forte defesa do sistema eleitoral e criticado atitudes que "corroem sorrateiramente os valores democráticos" consolidados no país. À noite, foi a vez de Barroso — vítima contumaz dos destemperos do capitão por defender as urnas eletrônicas — apontar "coisas erradas que vêm acontecendo no país, às quais todos temos de ficar atentos". O ministro rebateu detalhadamente as informações falsas apresentadas por Bolsonaro durante a patética live da última quinta-feira, afirmando, dentre outras coisas, que até a adoção do voto eletrônico o Brasil vivia uma história de fraude eleitoral sistemática, em que fiscais eleitorais até "comiam votos durante a apuração".

A ação mais incisiva do Judiciário deveu-se à inércia do procurador vassalo, que aboletou o respeitável buzanfã sobre uma representação contra seu suserano, por crime eleitoral, assinada por seis subprocuradores da República. O pedido data de 13 de julho e recebeu a adesão de 36 dos 74 subprocuradores que compõem a cúpula do MPF. Desde então, Bolsonaro — que já disse estar cagando para a CPI do Genocídio — promoveu uma motociata, fez dois discursos colocando em dúvida a confiabilidade do processo eleitoral — um distribuído em forma de vídeo no WhatsApp e outro no Palácio do Planalto, para uma plateia repleta de autoridades — e a patética live da última quinta-feira. E Aras, de olho na recondução ao cargo de procurador-geral, não deu um pio.

Engana-se quem acha que o "mito" mudará seu comportamento. Até porque não ele não poderia fazê-lo nem que quisesse: como o escorpião da fábula, Bolsonaro é incapaz de agir contra a própria natureza. Isso sem mencionar que o confronto acirrará os ânimos de seus baba-ovos — aí incluídos militares da ativa e da reserva. De mais a mais, se for punido, Bolsonaro posará de vítima e usará a punição como justificativa para sua derrota em 2022. Ou chutará o pau da barraca e, no melhor estilo Donald Trump, incitará sua soldadesca (refiro-me à escumalha bolsonarista, não às Forças Armadas) a botar fogo no circo.

No melhor dos cenários, as medidas tomadas pelo TSE acarretarão a inelegibilidade do presidente, pondo fim à nefanda dicotomia da qual ele e Lula se retroalimentam, abrindo espaço para o crescimento de um candidato "de terceira via". E pensar que, quando apoiamos o dublê de mau militar e parlamentar medíocre para exorcizar o fantasma do lulopetismo corrupto, nem imaginávamos quão nefasto seria o bolsonarismo boçal.

Vade retro, Satanás!