quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

MAIS UM ANO QUE SE VAI. TORÇAMOS PARA QUE O PRÓXIMO NÃO SEJA AINDA PIOR!


O presidente que disse que cagou para a CPI, e que rejeitou a alcunha de genocida agora se empenha em acrescentar "infanticida" à sua coleção de epítetos. Contrariando a ciência pela enésima vez, Jair Herodes Bolsonaro vem criando toda sorte de empecilhos à imunização de crianças contra a Covid

Fosse apenas mais uma bizarrice surreal de sua alteza irreal, ainda assim chocaria pelo inusitado e pelo risco embutido na ordem num momento em que o avanço da Ômicron leva o mundo a temer um revival da doença.

Filho da ignorância e irmão do negacionismo, o capetão reitera a sua clara aversão aos preceitos básicos da Ciência, prega o evangelho do morticínio e se engaja em batalhas abertas para sabotar a cruzada da imunização. 

O mandatário que "por onde passa espalha fezes" diz que vacina pode causar AIDS, trombose, embolia pulmonar. Do alto de sua sabedoria de especialista em fake news, cita uma lista interminável de efeitos colaterais sem qualquer respaldo médico, transportando a população menos informada para o plano da dúvida, do receio, quando não do pavor.

Trata-se da maior autoridade do País, que (pelo menos em tese) deveria zelar pelo bem-estar geral, pela tranquilidade e correção dos fatos. Mas não Bolsonaro. Como não governa, sobra-lhe tempo ocioso, que ele gasta conspirando para o caos, pela consagração da mentira, da realidade paralela. 

Vai morrer gente? “E daí? É da vida!”, costuma dizer. Não faz um único movimento para atenuar o sofrimento pelo qual passaram e passam tantos brasileiros nos últimos tempos. Não há solidariedade, compaixão, comiseração, nada. Insensível, o mefistofélico se deixa levar por intenções politicamente rasteiras, pessoais e obscuras. 

Ao incitar a anarquia e a aglomeração, Bolsonaro contribuiu para a morte de mais de 600 mil brasileiros. Suas atitudes e declarações tipificam o comportamento de um doente mental. Não há outra explicação para tantos desatinos. 

Na penúltima confusão armada para ratificar o seu desprezo pelo controle da Covid, o capetão fez de tudo para impedir a exigência do passaporte vacinal de viajantes que desembarcam no País. Chegou mesmo a exigir do ministro da Saúde que se posicionasse firmemente contra. 

E Pesadelo 2.0, movido por ambições políticas e um apetite pantagruélico por poder, não só aquiesceu como ecoou o suserano — “melhor perder a vida do que a liberdade" —, acrescentando mais uma mancha a seu já maculado currículo. 

Caso a determinação presidencial prosperasse, o Brasil ficaria na condição sui generis de única nação no mundo civilizado a adotar tal política. Felizmente, o Supremo mandou exigir o bendito comprovante, sujeitando a aberração que chefia o Executivo a mais uma humilhação. 

Mesmo assim, Bolsonaro não recua: “Se eu não tomei [a vacina], por que vou obrigar os outros a comprovar que tomaram?”, perguntou o despirocado, sabe-se lá se por teimosia, questão de honra, tática eleitoreira, ou se para manter acirrada sua récua de apoiadores radicais.

É irresponsável deixar o destino de um país que anseia por civilidade e retomada da prosperidade nas mãos de um irresponsável tão inepto e descontrolado. De alguém cujas estultices representam indiscutível ameaça à sobrevivência de todos nós, que conspira a favor de um totalitarismo tacanho que garanta seu lugar no poder, que não quer vacina, nem passaporte nas fronteiras, nem gente usando máscara, nem crianças imunizadas, a quem basta a ineficaz cloroquina para iludir as massas. Se “todo mundo morre um dia”, diz o mestre das trevas, para quem quanto antes melhor.

Certos anos, quando acabam, proporcionam suspiros de alívio. Foi assim em 2020, de modo enganoso, pois imaginou-se, então, que a pandemia arrefeceria. Agora, ao fim de 2021, nada autoriza a mesma ilusão nem ninguém provido de bom senso acredita que dias melhores virão em 2022. Não no quesito atribulações políticas.

Na teoria do mundo oficial e segundo o permitido pela legislação, será uma campanha curta, de 45 dias; no universo paralelo da prática, terá sido a mais longa da história recente, com a duração exata do intervalo entre a eleição passada e a seguinte. A razão? Um presidente sob forte rejeição, que, à falta de atributos para reverter a situação, insiste na condição de candidato criador de casos, imaginando que só assim alcançará a reeleição.

Costuma-se dizer que a diferença entre o veneno e o remédio está na dose, e que as consequências sempre vêm depois. Por exagerar na dose, Bolsonaro amarga 21% de intenções de voto contra 48% do líder nas pesquisas. Talvez isso não torne sua reeleição impossível, mas certamente não contribui para seu projeto de poder. 

Observação: Já vimos candidatos qualificados perderem eleições e governantes bem avaliados sofrerem derrotas, mas jamais o contrário

É fato que o histórico estatístico não determina o resultado do pleito, e que a caneta e a cadeira palacianas foram determinantes na vitória de todos presidentes reeleitos desde a 1998. Mas nada está decidido nem muito menos garantido.

Lula termina o ano em alta, mas tem pela frente a árdua tarefa de sustentar dianteira tão ampla. Criar atrativos ao noticiário — como convidar Geraldo Alckmin para vice — não basta para o petralha escapar ileso dos estilhaços de seu imenso telhado de vidro (que os adversários certamente vão explorar). 

A decisão teratológica e execrável do STF promoveu o ex-presidente de presidiário a ex-corrupto, mas não o absolveu das acusações, pois as nulidades decretadas são processuais, e nenhuma delas lhe conferiu atestado de inocência.

A entrada de Sergio Moro na disputa complica as coisas, porque traz de volta à cena o tema da corrupção, que até então vinha sendo substituído, no radar do eleitorado, pelas agruras da sobrevivência, como inflação, desemprego e carestia. 

Como que para confirmar a tese de Magalhães Pinto — segundo a qual "a política é como as nuvens no céu; a gente olha e elas estão de um jeito, olha de novo e elas já mudaram" —, o ex-juiz termina o ano em situação completamente diferente daquela do início. De carta fora do baralho, Moro assumiu a posição de cortejado no campo alternativo às pontas do embate mais acirrado, em terceiro lugar nas pesquisa. 

Nesse processo rápido e agitado de mudanças, Ciro Gomes vê-se espremido, com mais um oponente de peso para atacar ao mesmo tempo que precisa segurar seu próprio partido para impedir uma corrida ao PT. A unanimidade no PDT em torno dele foi quebrada, e já não são poucas as vozes que defendem sua desistência. 

 Doria é um caso à parte — na verdade, um “case” enquadrado naquela categoria dos governantes eficientes sem reconhecimento eleitoral à altura. Embora tenha inaugurado em janeiro a vacinação contra a Covid no Brasil, o governador paulista aparece em dezembro empatado com o desconhecido André Janones e o folclórico Cabo "Glória a Deus" Daciolo.

A estrada é longa, mas o caminho não é deserto, e o lobo mau passeia por perto. A campanha eleitoral que se avizinha será dura e agressiva. Lideram-na, por enquanto, duas personalidades egocêntricas que, para o bem e para o mal, têm inegável carisma. Isso os favorece na corrida eleitoral, mas, para a escolha de alguém capaz de levar adiante um país, conviria ao eleitor lembrar-se de frase atribuída à ex-chanceler alemã Angela Merkel: “Os problemas não são resolvidos com carisma”.

Com Carlos José Marques e Dora Kramer