quarta-feira, 9 de março de 2022

MAMÃE, FALEI. E DEU MERDA.



Depois de falar merda na Ucrânia, onde se encontrava para, segundo ele, mostrar e esclarecer ao Brasil sobre informações falsas sobre a invasão da Rússia ao país vizinho, o deputado Mamãe Falei, menos conhecido como Arthur do Valretirou sua pré-candidatura ao governo do Estado. Ao tomar conhecimento do vazamento do áudio, o parlamentar afirmou que as falas se deram em um "momento de empolgação". 

Do Val havia migrado do MBL para o Podemos para impulsionar a candidatura de Sergio Moro à Presidência, e agora coleciona nove representações individuais e três coletivas pedindo sua cassação por quebra de decoro. O próprio ex-juiz divulgou uma nota de repúdio a suas declarações.  

Como anotou Josias de Souza em sua coluna no UOL, Mamãe Falei trocou uma zona de guerra por outra. Na Ucrânia, ele atacou a dignidade humana dizendo que as mulheres daquele país são "fáceis" por serem pobres. De volta a São Paulo, comparou-se ao colega Fernando Cury, que foi flagrado apalpando os seios da deputada Isa Penna em plenário, mas amargou apenas uma suspensão. "Eu vou ser cassado por um áudio?", perguntou em entrevista à Folha. "Eu errei. Agora, é claro que parte dessa consequência política de cassação é por eu ser quem eu sou." 

Se a Alesp não cassar o fala-merda, o velho espírito de corpo dará lugar ao espírito de porco. Por outro lado, não custa lembrar que a pastora evangélica Flordelis, apontada como mandante da morte do marido, Anderson do Carmo, se escudou na imunidade parlamentar por quase dois anos e seguiu firme na vidinha de deputada federal, religiosa e cantora, com fé na expectativa de que a providência divina a livraria da cadeia (mas, por via das dúvidas, alinhava no plano terreno alianças políticas para se salvar na Câmara e, ao mesmo tempo, evitar a derrocada de sua igreja), até finalmente ser cassada, em agosto do ano passado.

Num país onde um criminoso condenado (em três instâncias) a mais de 20 anos deixa a prisão após míseros 580 dias, é convertido em ex-corrupto pela ala "cumpanhêra" do  judiciário e periga ser eleito (pela terceira vez) presidente desta merda, dizer o quê? Viva o povo brasileiro, que tem o governo que merece e merece os governantes que tem. E por falar nisso...

Algumas pessoas estão em constante evolução. Lula, por exemplo, se autoproclamou “uma metamorfose ambulante”. Faz sentido: em pouco mais de meio século o egun mal despachado passou de retirante nordestino a engraxate, vendedor de laranjas, office boy, metalúrgico, líder sindical, fundador de partido político, presidente da República, presidiário e “ex-corrupto”. Uma trajetória e tanto.

Bolsonaro é outra “metamorfose ambulante”: em pouco mais de três décadas, passou de mau militar a parlamentar medíocre e, graças a uma trágica conjunção de fatores, tornou-se presidente do Brasil. Essa usina de crises não entrou para a seleta confraria de impichados — ou não foi internado num manicômio — não porque faltem leis nesta banânia, mas porque falta vergonha na cara aos brasileiros.

Enquanto a Bahia amargava um final de ano com chuvas torrenciais, o sultão do bananistão comemorava o Natal no litoral paulista e o réveillon em Santa Catarina. Sobre a vacinação de crianças contra a Covid, disse esperar que “não houvesse interferência do judiciário” — e assegurou que sua filha (de 11 anos) não seria imunizada. Na praia, foi filmando passeando de Jet-Ski, cantando e dançando funk com apoiadores e tripudiando dos idiotas que o elegeram para governar. Dias atrás, quando tudo indicava que a Rússia invadiria a Ucrânia a qualquer momento, insistiu em fazer mais uma turnê internacional a custa dos contribuintes.

No ano passado, quando esteve em Nova Iorque, sua alteza e os bobos da corte que o acompanhavam jantaram  pizza em pé, na calçada, feito um bando de indigentes. Na Europa... enfim, foi patético. No leste europeu, depois que obteve a foto que foi buscar ao lado de Putin (para mostrar a seus seguidores que ele não é um pária global) e de participar de uma homenagem a soldados comunistas, o monarca sugeriu que sua visita poderia ter algo a ver com o anúncio de retirada de tropas pela Rússia. Para completar, numa despropositada vista à Hungria, chamou o premiê de “irmão”.

Observação: Quando o ex-ministro Ricardo Salles bombou memes sugerindo que o “mito” levaria paz ao leste europeu, parte da extrema direita tomou mais essa balela por verdade absoluta (mais ou como os petistas acreditaram, anos atrás, que Lula seria laureado com o Nobel da Paz — e o pior é que essa escumalha vota).

Se, como presidente, o “mito” dos despirocados é incapaz de tirar água de dentro de uma bota que venha com as instruções impressas no calcanhar, que dirá intermediar a paz entre nações? Mas o que mais espanta é desvarios como esse serem tomados por verdade pelos descerebrados que apoiam sua reeleição. Parece impossível haver gente que acredita nisso, mas há. E o pior é que essa gente vota — como votam os lunáticos que acreditam que Lula foi inocentado e que é a “alma viva mais honesta do Brasil”.

Em julho de 2019, um levantamento do Datafolha apontou que 7% dos brasileiros acreditam que a Terra é plana. Se quase 15 milhões de almas acreditam que o planeta assombrado por elas é mais parecido com uma pizza do que de uma bola de futebol, o fato de muita gente acreditar que Bolsonaro é uma espécie de Messias não deveria causar espécie. Mas causa.

Não é uma questão de exploração da população com menos acesso à informação, explica Diogo Mainardi, mas de manipulação do naco da sociedade que deseja consumir somente aquilo em que já acredita. Ou seja: esses anormais querem elementos que comprovem a infalibilidade de seu líder — se o “mito” estiver errado, eles também estarão.

Falta amor no mundo, mas também falta interpretação de texto. E vai sobrar muito chinelo velho para pé cansado daqui até outubro.