Bolsonaro viajou à Rússia para “prestar solidariedade”
ao carniceiro de Moscou. Na oportunidade, o
bolsonarista emérito e ex-ministro da Destruição do Meio Ambiente, Ricardo
Salles, publicou duas montagens vergonhosamente fraudulentas: uma com uma manchete
da CNN informando que o capitão “evitou a 3ª Guerra Mundial” e
outra com a capa da revista americana Time noticiando o Prêmio Nobel da Paz
para nosso ilustre mandatário.
Em sua coluna na revista Veja, Ricardo Rangel comentou que o bolsonarismo, que sempre foi admirável no quesito mistificação, conseguiu se superar de maneira verdadeiramente assombrosa.
Com efeito. A impressão que se tem é que há
uma competição entre o bolsonarismo, que tenta criar fake news cada vez
mais inacreditáveis, e os bolsonaristas, que tentam provar que são capazes de
acreditar em rigorosamente qualquer coisa. Aparentemente, os bolsonaristas
estão vencendo de lavada.
Para uma parcela (cada vez menor, infelizmente) dos
brasileiros, não são necessárias novas amostras de simpatia com governos
autoritários, nem de Jair Messias Bolsonaro, nem de Lula e seu
espúrio partido. Até porque sabemos muito bem com quem estamos lidando.
A diplomacia praticada durante as gestões petistas,
elaborada principalmente pelo ex-ministro Celso Amorim, centrada na
aproximação com ditaduras que navegavam na contramão de toda a tradição
brasileira de alinhamento com os valores expressos na Declaração Universal dos
Direitos Humanos e no Direito Internacional Público, deixou manchas indeléveis
em nossa reputação internacional.
Hoje, ambos os pré-candidatos mais bem posicionados nas pesquisas parecem crer que fazer concessões à narrativa oficial de Moscou é o caminho contrário àquele que garante manutenção da paz e respeito às legítimas soberanias nacionais.
Estamos diante de um retrocesso na relação entre as nações, retornando às agressões expansionistas que vigoraram até a 2ª Guerra Mundial, com evidente desprezo pelos esforços diplomáticos para solução de conflitos.
O PT, que possui quadros orgânicos na diplomacia
brasileira, sabe muito bem o que está envolvido nesse jogo. Na encruzilhada
civilizacional em que o mundo se encontra, esse grupo político escolheu um lado
e assumiu posição clara. Ao relativizar um ato de guerra que já resulta em milhares
de vítimas, promovido por um governo marcado pela arbitrariedade, os petistas
mostram novamente ao público a que tipo de ordem global se filiam.
O que se sabe é que o cacique do PSD, Gilberto Kassab, vai acabar
apoiando Lula, mas, por enquanto, tenta encontrar alguém para esquentar a
cadeira e aumentar o valor de seu passe. Seu plano A é Rodrigo Pacheco,
que não decolou e já anunciou que não disputará a presidência em outubro) e o plano B é Eduardo Leite, que teria de ganhar a final
depois de perder a semifinal.
Lula espera que os os que fogem do risco Bolsonaro caiam em seu colo por gravidade, e estratégia parece
fazer sentido: dias atrás, algumas importantes personalidades publicaram
manifesto em que afirmam que foram e ainda são críticos ao petralha, mas que
nada justifica adiar a decisão final para o segundo turno. E conclamaram “todos
os democratas” à adesão imediata e incondicional ao ex-presidente.
Um segundo turno com Bolsonaro é mesmo preocupante, já que existe a possibilidade de ele se reeleger. Sem falar que é temerário lhe dar um mês para organizar um golpe
de Estado. O raciocínio dos oportunistas de plantão tem lógica, mas, se é para aderir incondicionalmente, qual a pressa? Se a terceira
via está moribunda, por que matá-la agora? Anunciar agora o apoio incondicional a
Lula seria desmotivá-lo a se comprometer com pautas moderadas (não que ele vá, mas enfim...).
Defensores da adesão imediata
enxergam sinais de moderação e conciliação na movimentação de Lula e não veem
motivo para temer que seu governo seja irresponsável (a cegueira é um questão entre as pessoas e os olhos com que nasceram). É o que se chama em
inglês de wishful thinking: essa escumalha crê porque quer crer, porque
precisa crer para justificar seu apoio prematuro. Mas a realidade é um
pouco diferente.
Lula sabe que precisa de uma ampla aliança, tanto para vencer
no primeiro turno quanto para governar, e está conversando com todo mundo, mas
com o que de fato ele se comprometeu? Entre platitudes sentimentalistas e
entrevistas "chapa-branca", continua a ameaçar revogar o teto de gastos e a
reforma trabalhista, interferir no preço do petróleo, botar a culpa das mazelas
brasileiras na “subserviência do Brasil aos interesses estrangeiros”. Mudou o
tom sobre a regulação da mídia, é verdade, mas não se declarou contra, preferindo
dizer que a questão deve ser tratada “pelo Congresso” — o qual pretende
controlar.
Seus supostos parceiros — o PSB em particular — reclamam que a atitude do PT é altiva e hegemônica, que Lula recusa qualquer autocrítica, descarta uma nova “carta aos brasileiros” e segue se queixando de ter sido perseguido, o que sugere que pode querer uma revanche.
Tão ruim quanto a volta da ORCRIM petista seriam mais quatro anos de cleptocracia "centrista", com Ciro Nogueira na Casa Civil e Arthur Lira no comando da Câmara. Se a "terceira via" não se consolidar, não haverá para onde correr, e depois não adianta chorar.