Segundo dados oficiais, a Covid infectou meio bilhão de pessoas e matou e causou 6 milhões de mortes em todo o mundo. No Brasil, também oficialmente, foram cerca de 30 milhões de casos e mais de 660 mil mortes. Na prática, esses números são bem mais expressivos, ainda que, segundo diversos especialistas, teriam sido muito menores se o governo federal (leia-se Bolsonaro) agisse de forma diferente. Mas ele não agiu e continua não agindo. Mesmo porque estamos em ano eleitoral e o presidente não desceu do palanque um dia sequer de sua funesta gestão, embora tenha prometido, entre outras falácias de campanha, acabar com o instituto da reeleição.
No último domingo, rendendo-se mais uma vez aos desígnios eleitoreiros de Bolsonaro, o preposto presidencial que comanda a Saúde anunciou o fim da emergência sanitária. Menos de uma semana antes, a OMS decidiu que a Covid continua a ser uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional”, o que na prática mantém o status da doença como pandêmica. O órgão ressaltou ainda que o vírus continua a ter uma evolução “imprevisível, agravada pela sua ampla circulação e intensa transmissão”. Mas, como se sabe, para ser ministro de Bolsonaro é preciso dar o rabo e pedir desculpas por estar de costas.
O fim da emergência no Brasil impactará ao menos 170 regras sanitárias, entre as quais a autorização de uso emergencial de remédios e vacinas — como a CoronaVac, que, diferentemente dos imunizantes produzidos pelos laboratórios Pfizer, Janssen e AstraZeneca, o produto que Bolsonaro qualificava pejorativamente de “vachina do Doria” conta apenas com autorização emergencial.
Segundo Marcelo Queiroga, mais de 73% da população brasileira já completou o esquema vacinal e 71 milhões de doses de reforço foram aplicadas. Porém, para continuar se equilibrando com um pé em cada canoa, o taifeiro do capetão ressaltou que “continuaremos a conviver com o vírus” e que seu ministério “permanece vigilante e preparado para adotar todas as ações necessárias para garantir a saúde dos brasileiros”.
Dados compilados por VEJA apontam que, com mais de 40% dos brasileiros imunizados com a dose de reforço, a média móvel de mortes desta Páscoa foi 96,3% menor do que a registrada no mesmo feriado em 2021, e a média de casos foi 77,7% menor do que no mesmo período do ano passado. Mas especialistas ouvidos pelo GLOBO ressaltam que a pandemia ainda não está controlada em diversas regiões do mundo, que o fim do decreto pode dificultar a adoção de novas medidas caso o cenário epidemiológico piore no país, que a decisão foi prematura — pois deveria ser tomada somente quando a OMS decretasse o fim da emergência em âmbito mundial —, pois o cenário fora de controle em outros lugares do planeta pode levar a uma piora no Brasil.
O patamar que estabelece o que é uma endemia nesse caso ainda não foi bem estabelecido. O cenário epidemiológico atual permite eventualmente a suspensão do decreto emergencial, mas não se sabe o que pode acontecer no futuro, principalmente em relação ao surgimento de novas variantes que escapem ao efeito das vacinas — o risco é cada vez menor, mas isso não significa que ele não exista.
Não cabe a Queiroga — nem muito menos a Bolsonaro — decretar o “fim da pandemia”. O status oficial foi definido pela OMS (com certo atraso) em 11 de março de 2020, quando a Covid se espalhou por todo o planeta. No Brasil, o governo decretou emergência sanitária uma semana antes, visando à liberação de recursos no combate à doença. Mas não houve alteração pela OMS desde então, razão pela qual o rebaixamento para endemia defendido por Bolsonaro não é uma medida sensata.
Para decretar o fim da pandemia, uma das estratégias da OMS é vacinar 70% da população de todos os países do mundo até meados deste ano. Embora países da América do Norte, do Sul e da Europa, em sua maioria, tenham alcançado a meta, grande parte das nações africanas ainda estão longe do percentual. Como um todo, o continente imunizou apenas 16% de sua população com as duas doses.