O que se viu até agora foram ensaios, treinos, pré-temporadas e afins — uma ideia do confronto, mas não uma garantia de qual será o resultado das urnas. A campanha vai começar de fato entre o final de agosto e o início de setembro. Até lá, tudo não passa de especulação, embora não se possa negar as evidências: o dublê de ex-presidiário e pajé da Petelândia está léguas adiante do mandatário de araque e "mito" dos apatetados.
O cientista político Murillo de Aragão salienta que eleições são cheias de surpresas (eu diria que são a versão revista e atualizada da Caixa de Pandora, mas quem sou eu?). Considerando que faltam três meses para o pleito, duas questões devem ser postas. A primeira é se há tempo para mudanças — e três meses é uma eternidade em um processo eleitoral. A segunda é sobre o que pode mudar as tendências hoje verificadas.
Em 2018, a escolha de Bolsonaro foi mais uma aposta afirmativa na renovação do que na rejeição específica ao universo “lulopetista” (concordo apenas parcialmente com essa assertiva); hoje, a pauta eleitoral se sustenta na rejeição que ambos os candidatos despertam no eleitorado (concordo em gênero, número e grau). Agora, uma rejeição elevada combinada com três meses de campanha pode abrir brechas para alterações.
Observação: Bolsonaro perde parte do seu eleitorado de 2018 para Lula, mas o antipetismo continua relevante para manter a competitividade do sultão do Bolsonaristão. Ambos são uma espécie de nêmesis um do outro, e uma eleição eivada de rejeição acaba gerando uma adesão não engajada ao escolhido e dando margem à possibilidade de transformar a polarização de hoje na incerteza de amanhã.
Para reforçar um quadro de potencial mudança, os "queridinhos do eleitorado" não perdem uma oportunidade sequer de praticar o “sincericídio” — que, em doses significativas, pode ser mortal. Lula flerta com o perigo ao mencionar a sua intervenção em favor de seqüestradores e assusta ao se posicionar pela regulamentação da mídia e pela revogação de reformas. Bolsonaro dá opiniões sem avaliar seus impactos e não cansa de desagradar ao eleitor de centro, além de gastar mais tempo atacando inimigos incompreensíveis para boa parte do eleitorado, como o TSE, o STF e a Petrobras, do que divulgando suas realizações (pausa para as gargalhadas).
Nhô Ruim e Nhô Pior travam uma batalha entre o sujo e o mal lavado, como numa disputa para ver quem mente mais e melhor. Nenhum dos dois parece preocupado com os próprios erros. O favoritismo do petralha é inconteste, mas a resiliência de sua candidatura será posta à prova nos próximos três meses, quando os ataques ao passado do PT forem explorados. Já o Messias que não miracula precisa reconquistar votos que se perderam ao longo de sua gestão, e medidas eleitoreiras, como aumentar o Auxílio Brasil e dar subsídio aos combustíveis, podem ajudá-lo, mas não bastarão se não houver uma mudança de postura (como o escorpião da fábula, sua alteza irreal não é capaz de ir contra sua própria natureza).
Há tempo para mudanças (e a esperança é a última que morre). A resposta sobre o que afetaria a polarização está no fato de a agenda predominante ser a da rejeição, os ponteiros estarem excessivamente expostos a polêmicas e haver eleitores que podem trocar de opinião. Por fim, existe o acaso. E a corrida eleitoral mal está começando.
Com Murillo de Aragão