sábado, 3 de dezembro de 2022

QUEM SEMEIA VENTOS...


Na transição do primeiro para o segundo turno da eleição presidencial, o petismo estendeu um tapete vermelho para Simone Tebet. Dizia-se nos bastidores que a candidata do MDB teria carta branca para escolher o ministério que desejasse numa futura gestão de Lula. Na transição de governo, o tapete foi puxado. Agora, o PT reivindica para um de seus filiados a pasta da predileção de Simone, o futuro Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família


PT queria acomodar na poltrona sua presidente nacional, mas Lula informou que prefere que Gleisi Hoffmann no comando do partido. Nos subterrâneos, os petistas alegam que o ministério seria trampolim para uma nova candidatura presidencial de Simone, e tenta empurrá-la para a pasta do Meio Ambiente. Ao mediar o conflito, Lula sinalizará até onde vai a generosidade insinuada na sua promessa de compor um governo que vá "além do PT".


Do PL de Bolsonaro ao PT de Lula, todos se renderam ao charme de Arthur Lira, que já garantiu um segundo mandato de presidente da Câmara com o apoio de ao menos 15 partidos, mais de 300 votos. Essa é a verdadeira democracia brasileira, não a simulada durante a campanha eleitoral, quando os protagonistas do duelo nacional, com apoio de suas militâncias e das redes sociais, arrastaram o país para uma polarização teatral — polarização fabricada, mas que muitas vezes é levada a sério por parentes, amigos e colegas de trabalho, maconheiros ou patriotas.


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Valdemar Costa Neto entrou em processo de autocombustão ao se associar a Bolsonaro na contestação do resultado das urnas. A situação ficou ainda pior depois que o ministro Alexandre de Moraes multou a coligação bolsonarista em R$ 22,9 milhões, por litigância de má fé. PP e Republicanos argumentaram que o pajé do PL não tinha procuração para os meter nesse imbróglio, e o ministro Alexandre de Moraes acolheu seu recurso. Inflado pelos congressistas eleitos na aba de Bolsonaro, o PL se equipava para usufruir de um fundo partidário engordado pelas urnas, e agora terá de arcar sozinho com a multa milionária. 


Sob os efeitos do torniquete financeiro imposto pelo presidente do TSE, o partido rachou: enquanto a banda bolsonarista ataca Moraes, o pedaço não alinhado com o capetão flerta com Lula e submete Valdemar a um intenso fogo amigo. O ex-presidiário do mensalão, que até semanas atrás era exaltado como um dos mais hábeis administradores dos negócios partidários, ora é tratado como um gestor temerário da caixa registradora que financia as atividades da legenda, e antigos parceiros se comportam como herdeiros da fúria canibal dos índios Caetés, que comeram o bispo Sardinha em 1556. 


Em recurso protocolado no TSE, Valdemar tentou fazer uma pose de Chacrinhaeu não vim pra explicar, vim pra confundir —, mas não funcionou. Abelardo Barbosa criou o seu personagem para fazer graça. A imitação de Valdemar é um flerte antidemocrático com a desgraça. São dois os principais argumentos de Valdemar para tentar anular a mordida de R$ 22,9 milhões aplicada no fundo partidário do PL pelo ministro Alexandre de Moraes


1) O pedido de anulação de 60% das urnas, exclusivamente, no segundo turno foi decorrência natural da "condição do partido de entidade fiscalizadora e contribuidora das eleições" — lorota; os partidos são livres para fazer tudo o que as leis permitem, mas golpismo e má-fé não estão no pacote. 


2) O PL "jamais teve a intenção de causar qualquer tumulto ao processo eleitoral brasileiro" — faltou definir "tumulto": na véspera, ao sair de um jantar partidário estrelado por Bolsonaro, Valdemar foi abordado por um grupo de vivandeiras bolsonaristas, e um devoto do mito indagou: "Qual é a chance de nós ganhar [sic] essa aí lá no quartel?" E Valdemar: "Tem muita chance, lógico. O Bolsonaro não falou ainda, vai falar. Vamos ajudar vocês lá".

 

Ou seja: não basta manter a multa milionária aplicada pela Justiça Eleitoral à caixa registradora do PL. É preciso assegurar que a inclusão de Valdemar no processo sobre milícias digitais, que corre no STF, imponha a Valdemar consequências na esfera criminal.


Com Josias de Souza