terça-feira, 24 de janeiro de 2023

LULA TOMA POSSE COMO COMANDANTE-EM-CHEFE


Atualização: Na oitiva da última quarta-feira, Anderson Torres disse que nada tinha a declarar. Seus advogados alegaram que não tiveram acesso aos inquéritos, e que Torres "esclarecerá sob tudo que lhe for perguntado tão logo a defesa tenha acesso aos autos". Nova oitiva havia sido marcada para ontem, mas o ministro Alexandre de Moraes a reagendou para 2 de fevereiro,  dando mais tempo para os advogados do ex-ministro analisarem os autos. Já Bolsonaro avisou que não voltará ao Brasil se sua prisão for decretada ou mesmo se avaliar que a possibilidade é real. Mas não poderá ficar nos Estados Unidos, pois não ha chance de Joe Biden lhe conceder um novo visto. Dito isso, passemos ao post do dia.

O comandante do Exército Júlio César Arruda confundiu pacificação com bagunça quando torceu o nariz para a ordem do presidente da República de anular a transferência de um ex-auxiliar de Bolsonaro para a chefia de uma prestigiosa unidade militar. Ao demiti-lo, Lula atalhou a indisciplina e restaurou a hierarquia. Qualquer tratativa com o general em torno do descumprimento de uma ordem superior conduziria à anarquia. Com atraso, Lula finalmente tomou posse como comandante-em-chefe das Forças Armadas.

Em 24 horas, o discurso do ministro da Justiça deu um cavalo de pau. Na sexta-feira, após reunião de Lula com os comandantes militares, Múcio dissera que o mal-estar do presidente com as fardas estava superado. Chegara a hora de "virar a página", "pacificar" o ambiente e "olhar pra frente". No sábado, compelido a explicar a demissão do comandante do Exército, endireitou a prosa: "...As relações com o comando do Exército sofreram uma fratura no nível de confiança. Achávamos que deveríamos estancar isso no início para superar o episódio".

 

Presidente de terceiro mandato, Lula sabe que toda crise tem um custo. Os militares regatearam. Na sexta, Lula parecia disposto a fechar a conta. Acertou-se que fardas pilhadas no quebra-quebra seriam punidas. Afastaram-se do Planalto e do Alvorada oito dezenas de bolsonaristas camuflados, a maioria de baixa patente. No mais, Múcio sinalizou que o barato sairia caro. A crise nem foi discutida na reunião. Falou-se sobre investimentos. Em vez de castigo, prêmios. As Forças Armadas iriam às compras.

 

Lula poderia ter exonerado o General Arruda em 8 de janeiro. Naquele dia, após passar dois meses protegendo falanges bolsonaristas na porta do seu quartel-general, o Exército favoreceu a arruaça golpista ao descumprir sua missão de guarnecer o Planalto. À noite, consumada a depredação nos Três Poderes, o Exército impediu a polícia de prender criminosos em flagrante. Usou até blindados para retardar o cumprimento de ordem judicial emitida pelo ministro Alexandre de Moraes. Muita gente fugiu.

 

Por mal dos pecados, a história mostra que tentativas de pechinchar o custo de crises costumam magnificar o tamanho do prejuízo. Após a reunião apaziguadora de sexta-feira, Lula encomendou a anulação de um prêmio concedido por Bolsonaro ao seu ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel do Exército Mauro Cesar Barbosa Cid. Foi nomeado comandante de uma tropa de elite, no 1º Batalhão de Ações e Comandos, em Goiânia. Lula impressionou-se com o rastro pegajoso deixado pelo Coronel Cid, como é chamado o amigo de Bolsonaro.

 

Espécie de faz-tudo do capitão, o Coronel Cid é coadjuvante no inquérito sobre milícias digitais. É protagonista numa investigação sobre o suposto desvio de verbas do cartão corporativo da Presidência para o pagamento de contas pessoais de Michelle Bolsonaro. Alheio às suspeições, o General Arruda esboçou contrariedade com a ordem de Lula. Foi como se cutucasse a autoridade presidencial com o pé, para ver Lula mordia. Mordido, perdeu o comando do Exército para o comandante militar do Sudeste, General Tomás Miguel Ribeiro Paiva, que, na semana passada, falando para a tropa, defendeu o respeito à democracia. 

 

O futuro comandante do Exército é ligado ao General Eduardo Villas-Boas. Ajudou a redigir o tuíte que Villas-Boas postou para pressionar os ministros do Supremo às vésperas do julgamento do habeas corpus que autorizou a prisão de Lula em 2018. Os ministros do Supremo sempre negaram que a postagem de Villas-Boas, então comandante do Exército, tenha influenciado no julgamento. Entretanto, Lula e o PT crivaram o general de críticas. 

 

Ao escolher para a chefia do Exército um coautor do tuíte que almejava a sua prisão, Lula pode argumentar que deseja a profissionalização das Forças Armadas, não a sua politização com o sinal trocado. A mudança de guarda no Exército não vira integralmente a página da crise. Mas, por um instante, o governo parou de puxar a página para trás.

 

Com Josias de Souza