Ao fazer pose de estadista, Lula se tornou refém das expectativas que ele próprio criou. Com o penúltimo arroubo autoritário de Nicolás Maduro — a quem Lula teve o desplante de receber com pompa e circunstância—o universo lhe jogou uma corda ao petista. Resta saber se ele vai usá-la para galgar o tão sonhado posto ou para se enforcar.
Depois de culpar a Ucrânia pela invasão capitaneada por Putin e Israel pelo ataque feito pelo Hamas, o Sun Tzu de Garanhuns ganhou uma nova chance de provar que "é o cara". Nas pegadas da crescente tensão causada pelo amigo e companheiro de ideologia venezuelano, a pressão internacional para que ele exerça sua autoproclamada liderança regional também aumentou. E agora o furdunço acontece debaixo de suas ventas, em contraste com o papel "fabricado" de mediador que o petista tentou desempenhar nos conflitos do leste europeu e do oriente médio.
Enviar soldados e tanques para impedir tropas venezuelanas de usar Roraima como atalho para invadir Essequibo foi uma medida necessária, mas dizer simplesmente que não vai apoiar a aventura bélica de Maduro não basta. Mesmo que a ameaça seja uma bravata eleitoreira (e eu não estou dizendo que é), há que conter o tiranete de mierda — um conflito militar na região certamente atrairá os EUA e o Reino Unido em defesa da Guiana e a Rússia em apoio à Venezuela. O Kremlin já confirmou que o ditador bolivariano será recebido pelo autocrata russo; a data ainda não foi especificada, mas o Itamaraty receia que o encontro seja iminente.
Maduro ressuscitou em plena selva amazônica o embate político ideológico entre os EUA e a ex-União Soviética que estava em animação desde a queda do Muro de Berlim. Ambas as potências defendem os próprios interesses econômicos — os EUA porque a riqueza petrolífera da região de Essequibo é explorado pela ExxonMobil e a Rússia por ser a maior provedora de armas da Venezuela, fornecendo desde o armamento usado por tropas de infantaria a caças supersônicos.
Disputas na América do Sul deveriam ser a prioridade do governo Lula, mas Maduro continua avançando rumo ao embate direto. Além de redesenhar o mapa da Venezuela com a inclusão de Essequibo, o ditador determinou que a população da região se retirasse. O risco de essa merdeira respingar em terra brasilis é considerável, e o presidente de turno não dispõe da prerrogativa de excluir o país da encrenca.
Lula diz que "não quer confusão na vizinhança" — sobretudo porque o Brasil assumiu a presidência do G20 no início deste mês, e "confusão na vizinhança" é o que menos se deseja —mas Biden o instou a "exercer sua liderança regional" em prol de uma saída pacífica para o conflito. Durante a cúpula de chefes de Estado do Mercosul, ele ofereceu as instalações de Brasília para sediar eventuais encontros entre as partes, mas propôs que o hipotético entendimento seja conduzido pela Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos.
O diabo é que o mundo o vê Lula como mediador natural do conflito, o único capaz de sedar os arroubos do autocrata bolivariano, que, alheio à fidalguia do companheiro brasileiro, faz ouvidos moucos para a inquietação do Planalto. Como desgraça pouca é bobagem, Javier Milei — o doidivanas recém-empossado presidente argentino — já anunciou que pretende retomar as Malvinas.
Segundo o g1, depois de conversar com Lula por telefone, Maduro disse que Venezuela e Guiana terão que "sentar e conversar" sobre Essequibo. O encontro foi marcado para a próxima quinta-feira.
A ver.