sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

O 8 DE JANEIRO E A POLARIZAÇÃO (QUINTA PARTE)

 

Jair Bolsonaro iniciou sua carreira militar em 1973 e encerrou-a em 1988, já com a patente de capitão  mas só foi diplomado às vésperas de vestir a faixa presidencial, e graças a uma portaria publicada dois dias depois da eleição. Em 1986, ele cumpriu 15 dias de prisão disciplinar por ter publicado um artigo de opinião em Veja; no ano seguinte, a mesma revista revelou que ele e o capitão Fábio Passos da Silva planejavam explodir bombas em quartéis se o reajuste do soldo fosse inferior a 60%. Uma comissão do Exército decidiu pela expulsão do insurretos, mas o STM os absolveu. Passos se aposentou com a patente de coronel, mas Bolsonaro trocou a carreia militar pela política. 

No mesmo ano em que deixou a caserna, o futuro mito dos descerebrados se filiou ao PDC (o primeiro dos 9 partidos que o abrigaram nos últimos 35 anos), amoldou o discurso às demandas da soldadesca e conquistou uma cadeira na Câmara Municipal carioca, onde se disse "espantado" com o tanto de funcionários fantasmas que havia na Casa. Dois anos depois, já deputado federal, pôs em movimento seu trem da alegria, começando por nomear o pai da primeira esposa, Rogéria Nantes Braga, mãe de 0102 e 03. Como o sogro continuou morando no interior do Rio, o muito que fez como assessor parlamentar do genro foi distribuir "santinhos" durante as campanhas eleitorais.

ObservaçãoO ex-capitão empregou familiares das ex-esposas em seu gabinete e nos gabinetes dos filhos Carlos  eleito vereador em 2000 e reeleito outras 5 vezes  e Flávio — eleito deputado estadual em 2002, 2006, 2010 e 2014 e promovido a Senador em 2018.
 
No baixo clero da Câmara Federal, Bolsonaro defendeu o fechamento do Congresso e a volta dos militares ao poder. Disse não acreditar em solução para o Brasil por meio do voto popular, e que mais gente deveria ter sido morta pela ditadura (incluindo o então presidente Fernando Henrique). Em abril de 2016, emendou seu voto pelo impeachment de Dilma com uma patética homenagem o coronel torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. Mas a punição mais severa que recebeu ao longo de
 sua improfícua trajetória política (abrilhantada pela aprovação de 2 míseros projetos e dois míseros quatro votos na disputa pela presidência da Câmara) foi uma réles advertência. 

O primeiro casamento de Bolsonaro terminou em 1997, quando sua mulher, então então vereadora carioca, deixou de consultá-lo na hora de votar questões polêmicas: "Eu a elegi. Ela tinha que seguir minhas ideias". Outra versão sustenta que ambos estavam insatisfeito com as infidelidades de cada um. Rogéria concorreu a um terceiro mandato em 2000, mas o ex-marido lançou a candidatura do filho Carlos, então com 17 anos, que sepultou a carreira política da mãe ao se tornar o vereador mais jovem da história política do Rio de Janeiro.  
 
Eduardo Bolsonaro — o fritador de hambúrguer que quase virou embaixador — conquistou uma cadeira na Alesp em 2014, renovou o mandato em 2018 e 2022 e é investigado pela CPMI das Fake News. À exceção da menina Laura — fruto da união com Michelle — todos os filhos do capitão estão na mira da Justiça, incluindo Jair Renando casamento com Ana Cristina Valle, que (ainda) não tem cargo eletivo. Afora a novela 01 e as rachadinhas, a PF e o MP apuram suspeitas que vão de tráfico de influência e contratação de funcionários fantasmas a envolvimento na organização de manifestações em prol do fechamento do Congresso e do STF.
 
No livro "O Negócio do Jair",
 Juliana Dal Piva esmiúça o esquema usado pelo clã Bolsonaro para comprar mais de 100 imóveis, acumular milhões de reais e construir um projeto político iniciado com o emprego de parentes e coordenado pela segunda esposa. A Jornalista trata ainda das relações da família com Adriano da Nóbrega, o ex-capitão do Bope que viou chefe da milícia de Rio das Pedras e do Escritório do Crime — grupo suspeito de assassinar a vereadora Marielle Franco e seu motorista em março de 2018 — e acabou executado em 2020 por policiais militares baianos e fluminenses. 

Observação: Quando foi avisado da denúncia protocolada no TJ-RJ contra Flávio Bolsonaro, o então presidente moveu montanhas retardar o andamento do caso (que ficou paralisado por 811 dias). Zero Um era acusado de desviar R$ 6,1 milhões dos cofres públicos fluminenses — dinheiro que Fabrício Queiroz usava para pagar despesas pessoais do então deputado, comprar imóveis e "lavar" o que sobrava através de uma franquia da KopenhagenDe 1990 até 2022 (ano da publicação do livro), Jair et caterva negociaram 107 imóveis e pagaram 51 deles em dinheiro vivo. As compras registradas nos cartórios como pagas "em moeda corrente nacional" totalizaram R$ 25,6 milhões; Piva não conseguiu descobrir como foram pagos 26 imóveis, mas as transações por meio de cheque ou transferência bancária somaram R$ 17,9 milhões (em valores corrigidos pelo IPCA para agosto de 2022). 
 
Em 2022, a jornalista Amanda Klein confrontou Bolsonaro com um levantamento patrimonial realizado pelo UOL, relembrou as rachadinhas nos gabinetes dele e dos filhos e os 20 imóveis que Flávio negociou nos últimos 16 anos (entre os quais uma mansão de R$ 6 milhões). Curto e grosso (mais grosso do que curto, na verdade), o então candidato à reeleição qualificou as acusações de "levianas", disse que não sabia da vida econômica de suas ex-mulheres e que os imóveis foram comprados na planta "por uma micharia por mês" e revendidos com lucro logo depois. 

Numa série de reportagens sobre a evolução patrimonial do capetão, a Folha anotou que, enquanto deputado, Bolsonaro recebeu "auxílio-moradia", embora tivesse um apartamento em Brasília, e que mantinha entre seus assessores-fantasmas uma certa Wal do Açaí́, que morava e trabalhava em Angra dos Reis (RJ). Como os frutos não caem longe do pé, Wal não era a única assessora em situação irregular, já que os filhos emularam o modus operandi do pai, empregando parentes da mãe e da ex-madrasta e outros agregados.
 
Investigar presidentes da República no exercício do cargo é prerrogativa exclusiva da PGRAugusta Aras, que foi um exemplo de antiprocurador, fechou os olhos e os ouvidos para as atrocidades cometidas pelo pior mandatário desta banânia desde Tomé de Souza. Ignorar as evidências que conectam um formidável esquema de corrupção aos três casamentos de Bolsonaro, a seus filhos, a dezenas de parentes, ao patrimônio da família e à proximidade do clã com Queiroz, Adriano e outros pulhas é a prova provada de que a Justiça tupiniquim, além de cega, abriga em suas fileiras gente burra, pusilânime e venal. Nada muito diferente do que se vê no Congresso Nacional. 
 
Triste Brasil.