Após anular todas as provas obtidas com o acordo de leniência firmado pela Odebrecht com o MPF e suspender o pagamento da multa de R$ 10,3 bilhões que a J&F vinha pagando em suaves prestações, o ministro Dias Toffoli prestou mais um desserviço à nação suspendendo também o pagamento de R$ 8,5 bilhões de R$ 8,5 bilhões previsto no acordo de leniência da Odebrecht.
Na opinião do eminente magistrado, a prisão de Lula em 2018 foi "um dos maiores erros judiciários da história do país", e as informações obtidas no âmbito da Operação Spoofing, um conluio entre Sérgio Moro e os procuradores da Lava-Jato em Curitiba para a "elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si".
Na opinião do eminente magistrado, a prisão de Lula em 2018 foi "um dos maiores erros judiciários da história do país", e as informações obtidas no âmbito da Operação Spoofing, um conluio entre Sérgio Moro e os procuradores da Lava-Jato em Curitiba para a "elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si".
As decisões monocráticas toffolianas ensejaram a primeira contestação da PGR sob nova direção. O procurador Paulo Gonet ingressou com um Agravo Regimental sustentando não haver provas de coação no pacto firmado, que ilações e conjecturas abstratas não são bastam para rever o acordo, e que outras operações — entre as quais a Greenfield, a Sépsis, a Cui Bono e Carne Fraca — não se confundem com a Lava-Jato nem dela decorreram.
As razões alegadas por Toffoli não se sustentam à luz do fatos. Comenta-se que as decisões foram tomadas visando a uma reaproximação de Lula, que o presenteou com a suprema toga em 2009. Cabe ao próprio ministro decidir se acata os argumentos da PGR ou se encaminha o caso para o plenário da corte (Gonet solicitou expressamente que a avaliação seja feita pelo colegiado e que seja sorteado um novo relator).
Observação: Renata Rangel, esposa de Toffoli, presta assessoria jurídica para a J&F no litígio envolvendo a compra da Eldorado Celulose. O ministro já se declarou impedido para julgar ação do grupo em setembro, mas sua decisão de anular as provas do acordo da Odebrecht pode estimular a UTC, a Andrade Gutierrez, a Camargo Corrêa e outras empresas a pedir revisão dos próprios acordos de leniência — como fez a OAS de Léo Pinheiro na semana passada.
Depois que a Transparência Internacional apontou que o Brasil apresentou piora no combate à corrupção, Toffoli determinou a abertura de uma investigação com o fito de apurar possível repasse irregular de R$ 2,3 bilhões para a ONG por meio do acordo de leniência da J&F. A organização não só negou a suposta irregularidade como declarou que já desmentiu essa afirmação diversas vezes, mas que acusações "fake" como essa vêm sendo utilizadas em graves e crescentes campanhas de difamação. De acordo com o relatório da TI, a decisão do magistrado foi mais um dos recorrentes ataques do Judiciário ao combate a corrupção.
Segundo o Estadão, os demais ministros estão divididas sobre a decisão de Toffoli. O Globo avalia que pelo menos 6 ministros poderiam votar para manter as multas impostas à J&F e à Odebrecht. Apesar do desconforto que as notícias sugerem, nenhum deles se posicionou publicamente sobre a questão até o momento.
Apesar do pedido expresso da PGR, é possível que Toffoli envie o imbróglio para a 2ª Turma — composta por André Mendonça, Edson Fachin, Nunes Marques, Gilmar Mendes, e pelo próprio Toffoli —, que impôs uma série de reveses à Lava-Jato nos últimos anos. Mesmo assim, não dá para dizer que o entendimento do Maquiavel de Marília será referendado. Até porque Mendonça, que foi indicado por Bolsonaro e é relator da chamada "ADPF das leniências", é visto como um caminho de acesso para o Agravo chegar ao plenário.
As empresas contempladas com a benevolência suprema do supremo togado poderiam pedir a extinção dos acordos de leniência, mas não o fazem para não perder os benefícios deles decorrentes. Em outras palavras, elas conferem validade seletiva para o acerto firmado com as autoridades suspeitas de coagir inocentes. Um de seus representantes, aliás, aparece muito à vontade em um depoimento, rindo, praticamente confraternizando com os interrogadores.
Enquanto os cães ladram e a caravana passa, o Executivo olha compassivo a cena. A despeito da dinheirama perdida nestes tempo bicudos, importa ao inquilino do Planalto não perder a condição de narrador de uma versão que considera inexistentes ilícitos dados como realmente acontecidos mediante excesso de provas.
A autoria da epigrama "restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos!" já foi atribuída a Rui Barbosa, Stanislaw Ponte Preta e Millôr Fernandes, mas fato é que a expressão "locupletemo-nos todos" já era usada no Portugal do século 19 para satirizar a ganância e o oportunismo político. A despeito da paternidade imersa em brumas, o impacto cultural da epigrama é inegável, como também seu simbolismo no combate à imoralidade e a falta de ética e na defesa da justiça e da transparência na sociedade.
Triste Brasil.