domingo, 11 de fevereiro de 2024

AINDA É CARNAVAL

 

Era questão de tempo. A julgar pela dimensão do caso, não demorou tanto assim. Levou um ano e um mês para a PF bater às portas dos tubarões envolvidos na conspiração golpista que culminou com os atos terroristas de 8 de janeiro de 2023, dando uma resposta a quem reclamava que as investigações, processos e condenações alcançavam apenas os "peixes pequenos" executores da depredação nas sedes dos Poderes. 
 
Como dizia minha avó, "um dia a casa cai". E a casa de Bolsonaro e seus cúmplices paisanos e fardados na intentona golpista está na bica de cair. Pelo exposto na justificativa da operação de buscas, apreensões e prisões da cúpula então governista da sedição, não restam dúvidas de que os "bagrões" serão condenados, e a penas maiores que as imputadas à massa de manobra dos "bagrinhos" ensandecidos. 
 
O que houve está sendo muito bem contado. Não se trata de conjeturas ou meras conversas sobre hipóteses bravateiras. Havia um presidente da República em estado de sublevação empenhado em colocar o governo a serviço de um golpe em andamento. As ações estavam em marcha. Na luz e na sombra. 
Durante o mandato de Bolsonaro foram inúmeras e reiteradas as manifestações públicas ofensivas ao Estado de Direito feitas por ele, ministros, assessores e políticos afinados, enquanto montava-se nos gabinetes o roteiro da infâmia.
 
O planejamento de um golpe é de gravidade extrema e requer punição. Até porque, quando é de fato executado, não há essa oportunidade. Os golpistas assumem o poder e os legalistas vão para a prisão. Já vimos esse filme — que completa seis décadas neste ano. Sem a inevitável condenação dos conspiradores, a obra da resistência não estaria completa. Não poderíamos dizer que as instituições estão firmes e fortes, e que sua plenitude nos permite conhecer a história do motim antidemocrático que não foi, mas poderia ter sido.
 
Bolsonaro não poderia ter sido mais sincero quando disse que "a eleição de um deputado do baixo clero, desprezado, só pode ter sido um engano". Hoje, com sua percepção descolada da realidade, ele tem certeza de que foi roubado na eleição. Por sua lógica desviada, se a maioria dos brasileiros é cristã e se cristãos não podem ser esquerdista (e muito menos comunistas), então o TSE fraudou o pleito, já que ele, Bolsonaro, teve 49,1% dos votos válidos no segundo turno. Mas nem todo mundo pensa assim. 
 
Soube-se pelas pesquisas que muita gente votou no mix de mau militar e parlamentar medíocre, em 2018, por considerar o bonifrate de Lula a pior opção. Não por considerar o xamã do PT comunista, mas principalmente por causa de uma calamidade chamada Dilma, de um Mensalão e de um Petrolão. 
Mas as pesquisas mostram também que, mesmo inelegível e prestes a gozar férias compulsórias na Papuda ou no diabo que o carregue, o imbrochável incomível e insuportável ainda conta com o aval de 35% e 40% do "esclarecidíssimo" eleitorado tupiniquim.
 
Voltando à afirmação da aberração de que sua eleição só poderia ter sido um engano, a pergunta que se coloca é: como tantos se equivocaram tanto? E a resposta é: Não há resposta (ou melhor, eu não tenho a resposta). Mas imagino que, quando fala em comunismo, o estrupício se refere à Venezuela, onde Maduro capitaneia uma ditadura de ladrões que montam empresas-sinecuras e destroem o Estado. 
 
Houve grossa corrupção no Brasil, e todos ficaram sabendo. Portanto, não há falar em ditadura nesta banânia. 
Haveria se a intentona bolsonarista tivesse vingado. Mas o que aquele aquele bando de incompetentes conseguiu produzir foi quebra-quebra de 8 de janeiro — e (pasmem!) deixar para trás minutas do golpe espalhadas por escritórios e celulares, vídeos e gravações de reuniões secretas, conversas de WhatsApp, fake news primárias. Estariam guardando para a posteridade? Achariam que ainda poderiam dar o golpe? Julgavam-se imunes? Deu piada. Exército de Brancaleone foi a associação óbvia para os mais velhos. 
 
Bolsonaro e sua turma tiveram — e têm — apoio nas Forças Armadas, entre políticos e na elite brasileira. O ex-superministro Paulo Guedes é um representante da elite financeira, e está no vídeo, traçando um sanduíche (mudo então e depois). Houve chefes militares que não embarcaram, e isso foi crucial para que o golpe não prosperasse. Mas também houve quem topasse aderir 
— desde que o chefe assinasse a ordem. Mas o chefe esperava antes a adesão dos comparsas em comando militar. 

Um lado esperando o outro, cada qual com medo de sair na frente. Menos mal que não houve golpe. Mas o mais espantoso é estarmos comemorando isso. É como o sujeito que despenca do 20º andar e, ao passar pelo sexto, suspira e diz: "Até aqui, tudo bem!"
 
Com Dora Kramer e Carlos Alberto Sardenberg