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quarta-feira, 10 de julho de 2019

VAZA-JATO, BOLSONARO, A RAINHA DA INGLATERRA, O PARLAMENTARISMO BRANCO E OUTRAS BOBAGENS


Bolsonaro diz que o Congresso quer transformá-lo “numa Rainha da Inglaterra”. Impossível não imaginá-lo vestindo tailleur, luva e chapéu rosa-pompom, amarelo-táxi ou verde-abacate (que a segurança da rainha Elizabeth II a obriga a usar para distingui-la mais rápida e facilmente nas cerimônias públicas) em vez da camisa do Palmeiras — ou do Flamengo, conforme a ocasião. Claro que o queixume presidencial nada tem a ver com a indumentária, mas sim com uma articulação de seus ex-colegas na Câmara, que, sob a competente batuta de Rodrigo Maia, querem torná-lo um presidente decorativo, que preside mas não governa.

A irresignação do capitão pode até fazer sentido, mas ele se comparar a sua Sua Alteza Real é puro nonsense. Ao contrário da rainha, que raramente fala em público e convive civilizadamente com primeiros-ministros conservadores e trabalhistas, Bolsonaro fala mais do que deve sobre o que não deve, não admite outro partido senão o seu e mantém funcionando a pleno vapor uma usina de decretos inúteis e estapafúrdios — talvez para que o Congresso os rejeite e ele possa dizer que não os parlamentares não o deixam governar. 

A exemplo de outros "luminares" tupiniquins, sua excelência tem falado em “parlamentarismo branco”, talvez porque uma invencionice repetida incontáveis vezes tenda a assumir ares de verdade. Mas seus conhecimentos constitucionais não permitem que suas leituras da realidade ultrapassem o limite do senso comum, diz Dora Kramer, para quem a metáfora da rainha externa a contrariedade do capitão por não conseguir exercer o poder absoluto, por ter imaginado a presidência de um jeito e descoberto que ela é de outro, que sua “nova política” não passa de uma via de mão única onde o chefe do Executivo manda e o Legislativo diz amém sem reclamar nem cobrar contrapartidas (lícitas, ilícitas, legítimas e/ou ilegítimas).

Podemos concordar ou não com a jornalista, mas o fato é que existe, sim, uma articulação suprapartidária de senadores para discutir uma proposta de emenda constitucional que institua o parlamentarismo no Brasil a partir de 2022, cuja aprovação reduziria significativamente os poderes do próximo presidente, seja ele Bolsonaro, Doria, Moro, Maia ou qualquer outro que venha a se eleger.

Nosso presidencialismo de coalizão (ou de cooptação, como bem definiu FHC) é bananeira que deu cacho. Talvez esteja na hora de experimentarmos o parlamentarismo. Mas faltam-nos elementos empíricos para uma avaliação acurada: o parlamentarismo foi implantado uma única vez desde a proclamação da República — após a renúncia de Jânio Quadros — e durou pouco mais de um ano. Seja lá como for, nada há no sistema atual que se assemelhe a um parlamentarismo, onde o presidente não é eleito pelo voto popular, mas nomeado pelo Parlamento, cuja maioria tem a prerrogativa de formar um gabinete, escolher um primeiro-ministro e submetê-lo a votos de confiança ou desconfiança — em caso de desconfiança, cai o governo; ou seja, o gabinete é parcial ou integralmente substituído.

Dora acerta na mosca quando diz que a visão do paraíso presidencial de Bolsonaro revelou-se equivocada quando o Congresso resolveu reagir à ofensiva de desmoralização mudando seus padrões de comportamento. Se era novidade o que o capitão queria, novidade ele está tendo ao deparar com derrotas em votações, derrubadas de vetos presidenciais, devolução de medida provisória, contestação de decretos e, por outro lado, a execução de uma agenda condizente com as necessidades objetivas do país. Mas isso não é parlamentarismo branco, vermelho nem verde ou amarelo, e sim o exercício da autonomia e do sentido de serviço público que o Congresso havia muito estava devendo à população brasileira.

Após duas décadas de jejum — cortesia da ditadura militar que hoje sabemos ser fruto da imaginação dos esquerdistas — o Legislativo tirou a barriga da miséria. Na Carta Magna de 1988, os constituintes distribuíram benefícios a torto e a direito sem estabelecer a necessária contrapartida — ou seja, mandaram servir o banquete sem apontar quem pagaria a conta. Na sequência, em vez de exercer as funções para as quais foram eleitos — representar a sociedade, produzir leis, fiscalizar o Executivo e debater as grandes questões nacionais —, passaram quase três décadas atuando em benefício próprio e se locupletando a mais não poder. A atividade legislativa foi terceirizada ao Executivo, que governa por medidas provisórias; fiscalizações, só as que nascem mortas e as que são enterradas vivas. Até que o presidencialismo sem coalizão de Bolsonaro fez surgir tênues sinais de que há em Brasília gente disposta a interromper o ciclo de irrelevância do Congresso.

Bom seria se os dois poderes atuassem em conjunto e harmonia — dois burros puxam a carroça melhor do que um, mas somente se ambos puxarem na mesma direção. A questão é que a cizânia que Lula fomentou com seu nós contra eles  cavou entre a esquerda e a direita uma vala grande o bastante para tragar tudo que havia entre esses extremos. Mas isso é conversa para uma outra vez.

Mudando de um ponto a outro, a mais nova comparsa de Greenwald e seu imprestável site ultraesquerdista na espúria cruzada contra o ex-juiz da Lava-Jato publicou dias atrás: “MORO, ACUADO, AFASTA-SE DO CARGO”. É fato que o ministro vai se licenciar por cinco dias (de 15 a 19 de julho), e que essa notícia pegou todo mundo de surpresa. Mas no afã de enquadrar os fatos na moldura distorcida dos seus propósitos, VEJA, que se proclama a quintessência do jornalismo investigativo isento e imparcial, nem se deu ao trabalho de investigar quais seriam os tais “assuntos particulares” que motivaram o pedido de licença. Se tivesse procurado o ministro — como fizeram jornalistas de outros veículos —, saberia que Moro costuma sair de férias com a família em janeiro, e como não foi possível fazê-lo este ano (não teria cabimento se afastar do cargo logo após a posse),   ele prometeu à família que tiraria alguns dias em julho, e por ainda não ter direito a férias, pediu os tais 5 dias de licença.   

A postura de VEJA não chega a espantar: da sua ótica distorcida, os novos diálogos envolvendo o então juiz da Lava-Jato e os procuradores da força-tarefa — revelados na edição publicada na última sexta-feira — “aumentaram a pressão no Congresso e acuaram o agora ministro, que na semana passada abandonou a CCJ da Câmara após ser chamado de ‘juiz ladrão’ pelo deputado psolista Glauber Rocha”. O que na verdade aconteceu foi a suspensão da sessão pelo presidente da Comissão — para evitar que o furdunço virasse pancadaria —, após o que Moro deixou o salão escoltado por seguranças. A revista também acusou o ministro de se negar a entregar seu celular para ser periciado, embora ele já o tivesse feito. 

É lamentável um veículo de comunicação que prestou relevantes serviços ao Brasil ora se rebaixar à esbirro de comunista e defender a soltura do Coringa e a criminalização do Batman porque o homem-morcego supostamente conversou com o Comissário Gordon. É nítido que VEJA age como a trupe de corruptos que tomou de assalto o Congresso, sem falar no presidente da OAB (que por sinal é petista de carteirinha) e da banda podre do STF, que não só compactuam com esse descalabro como estimula a inversão de valores... Vade retro, Satanás!

Em sua inserção no Jornal da Gazeta da última segunda-feira, José Nêumanne comentou um pronunciamento do ministro Luís Edson Fachin, que não se referiu especificamente a Moro e à divulgação de mensagens obtidas de maneira criminosas e não periciadas pela Justiça, mas deixou claro que “juízes também cometem ilícitos e devem ser punidos”. Integrantes da Supremo e do meio jurídico especulam que o magistrado não gostou da forma como foi citado em diálogos entre procuradores (“Aha, uhu, o Fachin é nosso”), mas, cá entre nós, será o fim da picada se ele mudar seu voto para libertar o Ali Babá petista e seus bem mais de 40 ladrões. 

Observação: Não se pode esquecer que na sessão do TSE que cassou a espúria candidatura de Lula esse mesmo ministro reconheceu a inelegibilidade do petralha à luz da Lei da Ficha-Limpa, mas, com as vênias e salamaleques de estilo, votou pelo acolhimento da recomendação do Comitê de Direitos Humanos da ONU — órgão administrativo sem competência jurisdicional e cuja decisão foi uma medida precária, de caráter liminar e que em nada mudava a decisão da lei brasileira —, sustentando que o parecer de um par de boçais teria o condão de paralisar a eficácia da decisão que negou o registro da candidatura do criminoso condenado. Torçamos para que ele não mude seu voto no julgamento do HC do molusco em agosto. 

Se Fachin acha mesmo que juiz que comete ilícitos deve ser punido, Nêumanne recomenda-lhe olhar para seus pares na 2ª Turma (e cita nominalmente um deles; eu citaria pelo menos dois, mas prefiro me abster de dar nomes aos bois). Lembra ainda o jornalista que o ex-ministro supremo Nelson Jobim, que passou 9 anos na corte, dois dos quais como seu presidente, e foi ministro nos governos FHC, Lula e Dilma, tem agora a cara-de-pau de dizer que a conduta de Moro foi inadequada. Um dos poucos a demonstrar lucidez em meio a essa merdeira é o general Augusto Heleno, ministro do GSI, que disparou: “Muitos conversam com o advogado de defesa, recebem em casa para jantar”. Para bom entendedor...

Finalmente, sobre os números divulgados pelo Ibope, houve quem subisse no caixote para berrar que a popularidade de Bolsonaro está em queda livre. Não é bem assim. Ainda que apenas 33% dos brasileiros aprovem o atual governo — percentual idêntico ao dos que desaprovam —, uma simples comparação com a pesquisa feita em abril mostra que quase nada mudou (vide imagem). 

Ironicamente, Bolsonaro é, entre os presidentes eleitos pelo voto popular desde a redemocratização desta banânia, o dono da pior avaliação. Nem mesmo Collor, que bateu nossa carteira logo após subir a rampa do Planalto, foi tão repudiado nos primeiros meses de sua desditosa gestão (a opinião popular sobre ele mudaria mais adiante, mas isso é outra conversa). 

A ironia das ironias, porém, é ninguém menos que Dilma — a Grande-Chefa-Toura-Sentada-Impichada — ocupar o topo da lista, e Lula, que além de nomear esse traste como sucessora nos deu o mensalão e o petrolão, ficar à frente de FHC, que nos deu o Real. Detalhe: o grão-tucano continua livre para voar e a jararaca petralha está presa na gaiola.

Atualização - 08h15: O plenário da Câmara dos Deputados encerrou nesta madrugada a fase de debates sobre a proposta da PEC da Previdência. Com o avanço no rito, o presidente da Casa, Rodrigo Maia, convocou nova sessão para a manhã desta quarta-feira, quando o texto-base deverá ser votado em primeiro turno, mesmo com a possibilidade de novas obstruções. Vamos acompanhar.