sábado, 11 de janeiro de 2020

A PRIMEIRA TENTAÇÃO DE TOFFOLI


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Antes de qualquer outra coisa, um alerta para quem aprecia uma breja: suspeita-se que a da marca Belorizontina, da cervejaria Backer, não mate apenas a sede. Dois lotes da loura, que perfazem 66 mil garrafas, teriam provocado falência renal em 9 pessoas na capital mineira (uma das quais foi a óbito), e estão sendo retirados preventivamente do mercado. Ainda não é possível cravar a responsabilidade da empresa, mas o Procon classifica a situação como grave e orienta consumidores a verificarem os lotes de cervejas adquiridas. Segundo o jornal "O Tempo", um mapeamento está sendo feito pela Backer para localizar os estabelecimentos e bairros onde estes lotes da bebida foram comercializados.

Passando agora ao assunto em pauta, Benedito Abicair, desembargador da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, determinou que a Netflix retirasse do ar o especial de Natal “A PRIMEIRA TENTAÇÃO DE CRISTO”, da produtora Porta dos Fundos. Esse tipo de decisão se chama censura... Afinal, há muito que inventaram o dispositivo mais democrático deste lado da galáxia, que atende por “controle remoto”. Com um simples toque num botão, pode-se trocar de canal ou mesmo desligar o televisor. Mas sua excelência talvez não saiba disso. Aliás, em vista do teor das decisões da alta cúpula do Judiciário, sobretudo as do STF, o “notável saber jurídico” dos togados anda mais por baixo que rabo de cachorro.

Em sua liminar, o desembargador tratou a liberdade de expressão como uma lamentável negligência das autoridades — ou um direito a ser levado na coleira. É por culpa de gente assim que o Brasil, para além de conservador, está se tornando um país arcaico. Uma nação que demora a perceber que a única censura admissível para alguém que não gosta de um filme é não sintonizar o canal.

Observação: A julgar pela frequência com que troca de opinião, o presidente do STF é um magistrado firme como gelatina, a favor de tudo e absolutamente contra qualquer outra coisa. No ano passado, ele se comportou como deus, criando a censura em causa própria. Agora, derrubou a censura imposta pelo desembargador Abicair (sem trocadilho). Em seu despacho, o Maquiavel de Marília escreveu: "Não se descuida da relevância do respeito à fé cristã (assim como de todas as demais crenças religiosas ou a ausência dela). Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede há mais de 2.000 anos, estando insculpida na crença da maioria dos cidadãos brasileiros".

Nas palavras do novo Toffoli, a liberdade de expressão é um direito pleno e universal, previsto no artigo 5.º da Constituição. Louve-se a flexibilidade conceitual. Há nove meses, a atual presidente dos supremos togados tropeçava na dificuldade de se expressar. Hoje, defende a liberdade de expressão (como se costuma dizer, até um burro cego consegue eventualmente encontrar a cenoura). Mais detalhes no vídeo abaixo:


Enquanto isso, nosso indômito Capitão Caverna desperdiça a oportunidade de aproveitar o Fórum de Davos para exercitar uma das atribuições mais nobres de um presidente: a tarefa de caixeiro-viajante. Há um ano, Bolsonaro desperdiçou sua estreia internacional em Davos usado míseros seis minutos dos três quartos de hora de que dispunha para vender o seu peixe a uma plateia que incluía chefes de Estado, executivos de corporações globais e diretores de órgãos multilaterais.

Desta vez o presidente poderia expor no mesmo fórum o mostruário do primeiro ano de sua administração — que está longe de conter tudo que ele prometeu durante a campanha, mas, na área econômica, haveria material para muito mais do que seis minutos de prosa: reforma da Previdência, redução do déficit, inflação miúda, juros civilizados... Tudo isso somado à renovação de outros compromissos indispensáveis soaria como música aos ouvidos de investidores.

E o que faz sua excelência? Cancela a viagem sem explicar as razões, e encarrega seu Posto Ipiranga de representá-lo no evento, embora seja ele, Bolsonaro, quem dispõem da legitimidade dos votos, não seu ministro da Economia. Apaixonado pelos EUA, nosso presidente deveria se inspirar em Harry Truman, segundo o qual "um presidente é apenas um relações-públicas. Às vezes precisa "bajular e beijar, noutras, precisa "chutar as pessoas para que elas façam suas obrigações".

Bolsonaro já desenvolveu a parte dos chutes, mas parece ser incapaz de exibir as qualidades de um bom caixeiro-viajante.

Com Josias de Souza.