“A incerteza que esvoaça desgraça mais que a própria
desgraça”, dizia Tia Miquita — interpretada pela atriz Célia Biar no
folhetim global MINHA DOCE NAMORADA”, que foi ao ar entre 1971 e 1972 e
teve como protagonistas Regina Duarte e Cláudio
Marzo.
Esse ditado me veio à mente devido às idas e vindas do STF
em relação a temas de grande relevância. Como sabe quem acompanha as sessões
da nossa mais alta Corte de Injustiça, os ministros vêm balizando seus votos cada vez menos baseados nos ditames da Lei e mais nas convicções político-ideológica e preferências partidárias de cada um, e a falta de consenso no plenário se traduz em placares de 6 votos a 5 ou, quando muito, 7 a 4.
Na semana passada, Dias Toffoli, atual presidente e responsável pelo plantão da Corte até o último final de semana, considerou
constitucional a emenda incluída no pacote anticrime que cria o “juiz de
garantias” — uma nítida represália urdida pelo deputado psolista Marcelo
Freixo e apoiada pelos parlamentares enrolados com a Lava-Jato —,
mas adiou sua implementação por 180 dias. Ao assumir o plantão na última
segunda-feira, Luiz Fux, vice-presidente e relator das quatro Ações Diretas
de Inconstitucionalidade protocoladas contra a PEC, revogou a decisão do colega e, apontando “vícios de inconstitucionalidade”,
prorrogou a suspensão por tempo indeterminado (mais detalhes no post do último sábado e nesta
matéria do Valor Econômico). Segue transcrição de trecho do despacho do ministro
“Observo que
se deixaram lacunas tão consideráveis na legislação, que o próprio Poder
Judiciário sequer sabe como as novas medidas deverão ser adequadamente
implementadas. O resultado prático dessas violações constitucionais é
lamentável, mas clarividente: transfere-se indevidamente ao Poder Judiciário as
tarefas que deveriam ter sido cumpridas na seara legislativa. Em outras
palavras, tem-se cenário em que o Poder Legislativo induz indiretamente o Poder
Judiciário a preencher lacunas legislativas e a construir soluções para a
implementação das medidas trazidas pela lei, tarefas que não são típicas às
funções de um magistrado”.
Nunca é demais lembrar — e não se trata de uma crítica, mas de
uma triste constatação —, que Toffoli, o Maquiavel de
Marília, ganhou
de Lula a suprema toga em 2009 graças aos “bons serviços”
prestados ao PT, embora não tenha feito mestrado, doutorado, nem
tampouco publicado um mísero panfleto sobre algum tema relacionado ao Direito.
Abrilhantam seu invejável currículo duas reprovações em concursos para juiz
de primeira instância em São Paulo — ambas na fase preliminar, que avalia
conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos. Seu despreparo
para o cargo de ministro salta aos olhos, e sua passagem pela
presidência do STF, que ele pretendia “conciliadora”,
vem se revelando uma execrável tragicomédia.
Para ficar num exemplo recente, ao conceder monocraticamente
uma liminar ao senador Flávio Bolsonaro (sobre a investigação de “rachadinha”
em seu gabinete na Alerj, quando o primogênito do capitão-decepção ainda
era deputado estadual), Toffoli paralisou outras 935
investigações baseadas em dados fornecidos pelo Coaf e pela Receita
Federal sem expressa autorização judicial. Em novembro, quando o assunto finalmente foi a plenário, o nobre magistrado sujeitou seus pares (e os telespectadores que assistiam à
transmissão do julgamento ao vivo e em cores) a uma peroração que durou quase 5 horas, numa tentativa de explicar o que nem ele era capaz
de entender. Ao final, o ministro Luís Roberto Barroso fez a
única sugestão prática para desvendar a massa bruta de palavrório despejada pelo
colega: “Vamos chamar um professor de javanês”.
Segundo J.R. Guzzo publicou à época, Toffoli, o inigualável, e seus parceiros de facção no STF são hoje a pior ameaça ao
estado de direito, às instituições e à democracia no Brasil. Não são os “bots”
das redes sociais, as “milícias”, a “extrema direita” e sabe lá
Deus quem mais. São eles. Em geral, suas excelências fazem isso ordenando que
os criminosos sejam protegidos e tenham direito à impunidade, sobretudo nos
casos de corrupção. Mas a destruição da lei e a proibição de se prestar justiça
no Brasil inclui, também, a incapacidade funcional de entender questões básicas
de Direito. E o atual presidente do Supremo (cujo mandato, felizmente, termina em setembro p.f.) é a personificação disso tudo.
Voltando à decisão de Fux, os boquirrotos de sempre —
que buscam as luzes da ribalta como mariposas a das lâmpadas — externaram suas
subidas opiniões. Marco Aurélio Mello, por exemplo, afirmou que “o
vice que ainda não foi eleito presidente [Fux] e que o será em setembro afasta
do cenário um ato do presidente, o que é terrível em termos institucionais e
revela tempos estranhos, muito estranhos. Segundo o vice-decano — que ganhou a suprema toga do primo Fernando
Collor de Mello —, a atitude de Fux foi um “descalabro” que
gera insegurança jurídica e "desgasta barbaramente" a imagem
do Supremo.
Observação: O que desgasta mesmo a imagem do Supremo é o fato de Marco Aurélio Mello e outros ministros da mesma cepa — que eu prefiro não citar nominalmente — serem membros da Corte, mas isso já é outra conversa.
A exemplo do que fez quando teve uma liminar sua cassada por Toffoli, Mello relembrou que “os integrantes [do Supremo] ombreiam, apenas têm acima o colegiado. O presidente é coordenador e não superior hierárquico dos pares. Coordena, simplesmente coordena, os trabalhos do colegiado. Fora isso é desconhecer a ordem jurídica, a Constituição Federal, as leis e o regimento interno, enfraquecendo a instituição, afastando a legitimidade das decisões que profira. Tempos estranhos em que verificada até mesmo a autofagia.
Observação: O que desgasta mesmo a imagem do Supremo é o fato de Marco Aurélio Mello e outros ministros da mesma cepa — que eu prefiro não citar nominalmente — serem membros da Corte, mas isso já é outra conversa.
A exemplo do que fez quando teve uma liminar sua cassada por Toffoli, Mello relembrou que “os integrantes [do Supremo] ombreiam, apenas têm acima o colegiado. O presidente é coordenador e não superior hierárquico dos pares. Coordena, simplesmente coordena, os trabalhos do colegiado. Fora isso é desconhecer a ordem jurídica, a Constituição Federal, as leis e o regimento interno, enfraquecendo a instituição, afastando a legitimidade das decisões que profira. Tempos estranhos em que verificada até mesmo a autofagia.
Resumo da ópera: O jabuti do juiz de garantias foi criado sob as bênçãos do ministro do togado supremo Alexandre de
Moraes e feito sob
medida para inventar uma quinta instância, tornando a Justiça mais lerda e mais cara e visando única e exclusivamente favorecer réus abonados. Basta ver quem apoia essa excrescência (PT, esquerda, Centrão)
e quem a critica (Moro, Bretas e Oriovisto). Salvo melhor juízo, Fux não desrespeitou a decisão de Toffoli, até porque ser relator de quatro ações que tratam do tema lhe dá total autonomia na condução dessa discussão e a prerrogativa de liberar a matéria para votação em plenário, embora a decisão de colocar o assunto na pauta de julgamento seja do presidente da Corte.