Costuma-se dizer que no Brasil o ano só começa pra
valer depois do carnaval. Então, 2020 deveria ter começado ontem. Só que, dependendo da
região em que se está, o reinado de Momo começa semanas antes da sexta-feira gorda e termina bem depois
da quarta de cinzas (detalhes na postagem
anterior).
Em virtude do descontrole causado pelos
quatro, cinco ou sei lá quantos dias de folia, e ao tamanho da ressaca (que
costuma ser diretamente proporcional ao do pifão), está difícil dizer — hoje
menos que ontem, mas ainda difícil — em que dia da semana estamos. Segundo o calendário, é quinta, só que está mais com cara de terça (ou de segunda, para quem não trabalhou ontem)
Mas quisera Deus fosse esse o único dos nossos problemas.
Se o ano começou hoje, então começou mal. O aumento de casos do COVID-19 fora da China já dá sinais de contenção, mas o alastramento do vírus mundo afora derrubou os mercados financeiros e gerou alarme entre países próximos à Itália (que anunciou a sétima morte e 200 novos casos).
A Comissão Europeia demonstrou preocupação com a aplicação de medidas drásticas e afirmou que não há motivo para pânico, mas as bolsas europeias, puxadas pelo temor do impacto da crise sobre as empresas aéreas, tiveram o pior desempenho desde 2016. O índice de ações MSCI World, com papeis de 1.600 empresas mundo afora, perdeu 3 trilhões de dólares em valor desde quinta-feira.
Nesta quarta, as bolsas voltaram a fechar em queda na Ásia, além de abrir em baixa na Europa. No Brasil, depois do do recesso carnavalesco, o cenário é ainda pior: O primeiro exame de um paciente recém chegado da Itália deu positivo, e o contrateste confirmou o resultado anterior. Resumo da ópera: o COVID-19 já desembarcou em solo tupiniquim. Resta saber como se comportará, durante o verão, num país de clima tropical.
Observação: Antes dessa notícia, a cota do fundo EWZ, que replica a carteira do índice acionário Ibovespa, o principal da B3 (que vinha caindo ao longo da semana passada) recuara 1,4% no fechamento da bolsa de Nova York na terça-feira. Na tarde desta quarta de cinzas, o Ibovespa encerrou o pregão em forte queda (de 7,3%), abaixo dos 106 mil pontos.
Mas quisera Deus fosse esse o único dos nossos problemas.
Se o ano começou hoje, então começou mal. O aumento de casos do COVID-19 fora da China já dá sinais de contenção, mas o alastramento do vírus mundo afora derrubou os mercados financeiros e gerou alarme entre países próximos à Itália (que anunciou a sétima morte e 200 novos casos).
A Comissão Europeia demonstrou preocupação com a aplicação de medidas drásticas e afirmou que não há motivo para pânico, mas as bolsas europeias, puxadas pelo temor do impacto da crise sobre as empresas aéreas, tiveram o pior desempenho desde 2016. O índice de ações MSCI World, com papeis de 1.600 empresas mundo afora, perdeu 3 trilhões de dólares em valor desde quinta-feira.
Nesta quarta, as bolsas voltaram a fechar em queda na Ásia, além de abrir em baixa na Europa. No Brasil, depois do do recesso carnavalesco, o cenário é ainda pior: O primeiro exame de um paciente recém chegado da Itália deu positivo, e o contrateste confirmou o resultado anterior. Resumo da ópera: o COVID-19 já desembarcou em solo tupiniquim. Resta saber como se comportará, durante o verão, num país de clima tropical.
Observação: Antes dessa notícia, a cota do fundo EWZ, que replica a carteira do índice acionário Ibovespa, o principal da B3 (que vinha caindo ao longo da semana passada) recuara 1,4% no fechamento da bolsa de Nova York na terça-feira. Na tarde desta quarta de cinzas, o Ibovespa encerrou o pregão em forte queda (de 7,3%), abaixo dos 106 mil pontos.
Como se tudo isso já não bastasse, temporais típicos da estação, mas atípicos em intensidade, vêm despejado, num único
dia, o volume de chuva previsto para o mês inteiro. Nas grandes metrópoles, a impermeabilização crescente do solo, a quantidade monstruosa de lixo descartado
indevidamente, a falta de soluções eficazes para evitar enchentes (desassoreamento
de rios e córregos, construção de piscinões etc.) e a impossibilidade de as prefeituras limparem as galerias pluviais na mesma velocidade com que elas entopem levam uma simples cusparada provocar um alagamento intransitável.
Não podemos culpar exclusivamente os alcaides e seus auxiliares por esses, digamos, inconvenientes, mas tampouco devemos isentá-los da
responsabilidade que lhes cabe. Afinal, "fenômenos" como esses têm se repetido invariavelmente, entra ano, sai ano, independentemente do prefeito ou do partido a que ele pertence. Para usar o português claro, a merda é sempre a mesma,
só mudam as moscas.
O subdesenvolvimento brasileiro bate à porta a cada verão,
afirma Ricardo Kertzman num artigo publicado em O ESTADO DE MINAS no
último dia 6. Enchentes, dengue, mortes nas estradas, praias poluídas, entra
ano, sai ano e o Brasil continua "em desenvolvimento", prossegue o
jornalista.
O tal do Politicamente Correto adota termos amenos
para situações dramáticas. Exemplo: favela agora é comunidade, e cego, deficiente
visual. Parece até que a mudança das palavras altere também as condições
degradantes de dezenas de milhões de infelizes que vivem abaixo da linha de
pobreza e fizesse enxergar quem foi privado da visão.
O mundo adotou o termo “países em desenvolvimento” para
rotular pocilgas como o Brasil, diz Kertzman. Antes, éramos conhecidos como subdesenvolvidos
ou terceiro mundo. Daí, alguém pensou: “Coitados! São tão sofridos. Vamos
melhorar a autoestima deles”. Pronto! Imediatamente fomos promovidos.
Nasci e cresci ouvindo a promessa de um país do futuro, comenta o jornalista. Já
adulto e sem ilusões, prossegue ele, desenvolvi um senso crítico rígido e áspero em relação ao
Brasil. Talvez movido pela frustração, talvez movido pela realidade, talvez
movido pela admiração doentia que sinto por nações desenvolvidas. E eu assino embaixo.
Enquanto São Paulo, Rio, Belo Horizonte e outras
cidades derretem sob águas torrenciais, zilhões de mosquitas (como certa ex-presidanta) depositam seus ovos por aí. Um surto de dengue, do tamanho das
enchentes, prenuncia-se no horizonte. Isso sem falar (de novo) no coronavírus, cuja
disseminação já atinge o grau de pandemia. Ou seja, não é mais uma questão
de “se ele vai chegar até aqui, mas de quando”.
Mas nada disso parece ter relevância quando é carnaval e a preocupação
precípua de milhões de foliões (e da maioria dos prefeitos das 5.570 cidades tupiniquins,
cuja prioridade logo passará a ser as eleições de outubro) é botar seus blocos
na rua e não voltar para casa sem o smartphone, o relógio, a carteira ou a
correntinha — ou, pior ainda, sem nada disso e num pijama de madeira.
Em 2019, segundo a Polícia Rodoviária Federal, 5.332 pessoas
perderam as vidas nas estradas brasileiras. Apenas no recente feriado de Ano Novo,
863 mortes em acidentes rodoviários. Para ajudar, nosso presidente quer porque
quer acabar com os radares de velocidade. Será que um dos negócios do clã dos Bolsonaro,
além de chocolates, é funerária?
Enchentes, desmoronamentos, destruição, mortes… A cada
início de ano vivemos uma espécie de looping temporal. É como no filme Feitiço do Tempo,
no qual Phill — um repórter meteorológico mal-humorado interpretado
por Bill Murray —, ao cobrir pela quarta vez consecutiva uma festa
interiorana (Dia da Marmota), se vê obrigado a pernoitar na cidadezinha
devido a uma nevasca, e acaba revivendo a cada manhã o mesmo dia da festa, como
se o tempo tivesse deixado de passar. Só que Phill está na boa companhia de Andie
MacDowell, enquanto nós temos William Bonner, com sua voz grave e
seu olhar soturno, noticiando tragédias anunciadas, lembrando-nos impiedosamente do
quão subdesenvolvidos somos.