Não me culpe pelo título, pois eu não o criei; apenas mantive a epígrafe escolhida por Ricardo Kotscho para o texto publicado no Balaio do Kotscho do portal UOL, onde esse jornalista paulistano escreve sobre a cena política, esportes, cultura e histórias do cotidiano. Acompanhe.
"Conter Bolsonaro", suplicava o editorial
da Folha do dia 20 de outubro, com chamada na capa. Mas quem vai colocar
a camisa de força no capitão enfurecido, fora de controle dos generais, em
guerra aberta contra a "vacina comunista da China e do Doria?” “Restará
ao Congresso, ao Judiciário e a estados e municípios tomar medidas para que os
brasileiros não fiquem sem vacina?”, questionava o jornal.
Gostaria de acreditar nisso, mas acontece que todas as
instituições estão hoje aparelhadas pelo presidente, que enfeixa em suas mãos
os Três Poderes e as Forças Armadas, com os órgãos técnicos do Ministério da
Saúde militarizados e o general de plantão desmoralizado, que ainda não pediu
demissão.
Em entrevista à Jovem Pan — emissora líder da rede
bolsonarista de rádio e televisão — Bolsonaro dobrou a aposta e anunciou
que o governo federal não comprará de jeito nenhum a vacina chinesa
desenvolvida pela parceria Sinovac-Butantan, nem que ela seja
aprovada pela Anvisa. "A da China nós não compraremos, é decisão
minha. Eu não acredito que ela transmita segurança suficiente para a população.
Esse é o pensamento nosso", decretou o todo-poderoso presidente.
Pensamento nosso de quem, cara pálida? Quer dizer que a vida
de 212 milhões de brasileiros será refém de um louco no poder? Vale tudo para
agradar a turma do Face. Até mesmo vidas perdidas. Num surto de
megalomania paranóica, Bolsonaro resolveu desafiar a maior potência
econômica mundial, nossa maior parceira comercial, colocando em risco a saúde
pública só para abater um concorrente, em sua desabalada corrida pela
reeleição, e agradar os devotos das redes sociais.
Vejam o que ele disse na entrevista, em seu português trôpego,
depois de passar o dia com emissários de Donald Trump, em ofensiva
conjunta contra a China: "Tenho certeza que (sic) outras vacinas que estão
em estudo poderão ser comprovadas cientificamente, não sei quando, pode durar
anos. A China, lamentavelmente, já existe um descrédito muito grande por parte
da população, até porque, como muitos dizem, esse vírus teria nascido por
lá".
Pode durar anos? Até lá, num país que já conta com 6,3
milhões de infectados e quase 173 mil vítimas fatais, quantos mais precisarão
morrer antes do doutor Jair Messias Bolsonaro liberar uma vacina?
Um louco pode ser esperto, e vice-versa "NÃO SERÁ
COMPRADA. O povo brasileiro NÃO SERÁ COBAIA DE NINGUÉM". Governando pelo Twitter,
o presidente agora deu para escrever suas mensagens em letras maiúsculas para não
restarem dúvidas, como fazem seus seguidores mais fanáticos.
Assim como o editorialista, os leitores do jornal também
manifestaram indignação com os últimos acontecimentos da guerra contra a vacina
deflagrada pelo capitão-cloroquina. Confira algumas delas:
"Bolsonaro necessita urgentemente de um
psiquiatra. Esse senhor é um psicopata... e se diz cristão e evangélico";
"Com um presidente como o que temos, não precisamos
de pandemia nem de qualquer fato externo para afundar o país";
"No Brasil que tem Bolsonaro, a realidade
supera a mais delirante ficção política. Bolsonaro ignorou a pandemia do
coronavírus e agora é contra a vacinação. Trata-se de um genocida
compulsivo";
"Agora a ordem é não comprar a vacina chinesa por
estar vinculada à figura de um adversário político. Até quando o Brasil será
destruído pela insanidade de um louco no poder?”.
Quem ainda defende o presidente diz que ele não é louco, mas
muito esperto. Uma coisa não elimina a outra. Vida que segue.