quinta-feira, 20 de maio de 2021

CPI DO GENOCÍDIO E OPERAÇÃO AKUANDUBA

 

Em depoimento à CPI do Genocídio, ao atribuir a Eduardo Pazuello a decisão de adquirir apenas 10% das doses de vacinas do Covax Facility, em vez dos 50% (176 milhões de doses) colocados à disposição pelo consórcio coordenado pela OMS, o ex-chanceler de fancaria Ernesto Araújo desferiu golpes em Bolsonaro, mas sem tocá-lo, diz Josias de Souza. “Essa decisão não foi minha, do Ministério das Relações Exteriores, mas do Ministério da Saúde dentro da sua estratégia de vacinação”, declarou Araújo, que disse desconhecer os “fundamentos técnicos” que motivaram a decisão.

O ex-ministro das Relações Exteriores não ignora que Pazuello comandou a Saúde guiando-se pelo lema segundo o qual “um manda e o outro obedece”, e que foi 100% subserviente ao capitão. Indagado sobre o empenho do Itamaraty em adquirir na Índia matéria-prima para a produção de cloroquina, Araújo transferiu novamente a decisão a Pazuello. “No caso, o Ministério da Saúde foi quem nos pediu que procurasse viabilizar essa importação”.

Foi preciso muito esforço para obter de Araújo uma menção ao presidente. O relator Renan Calheiros perguntou se ele não havia tratado da aquisição de cloroquina com nenhuma outra autoridade. E o depoente: “Não foi exatamente um pedido para implementar esse pedido do Ministério da Saúde. Mas o presidente da República ele, em determinado momento, pediu que o Itamaraty viabilizasse um telefonema dele com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi.”

O aparente propósito de Araújo de preservar Bolsonaro não foi bem sucedido, pois nem Pazuello acredita que tenha conduzido o Ministério da Saúde com autonomia. De resto, o compromisso do ex-chanceler com a verdade revelou-se frágil nos trechos em que ele declarou na CPI que nunca fez declarações sinófobas. O senador Omar Aziz, presidente da Comissão, interveio para recordar ao depoente que estava sob juramento de dizer a verdade.

Ficou entendido que Ernesto Araújo nunca recebeu orientação direta de Bolsonaro na pandemia, não foi negligente na busca por vacinas nem ofendeu a China. Seu único problema é mentir um pouco.

Enquanto todos aguardávamos o início do depoimento de Pazuello, marcado para as 9h desta quarta-feira, 160 agentes da PF cumpriam mandados de busca e apreensão em São Paulo, no Pará e no Distrito Federal, inclusive no Ministério do Meio Ambiente e na casa do ministro Ricardo Salles.

A Operação Akuanduba apura crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando que teriam sido praticados por agentes públicos e empresários do setor madeireiro. Além das buscas, o STF determinou o afastamento preventivo de dez agentes públicos que ocupam funções de confiança no Ibama e no Ministério do Meio Ambiente, além da suspensão imediata da aplicação do Despacho nº 736900/2020, que afrouxa regras para exportação de madeira.

Segundo as investigações — que começaram e janeiro, após informações obtidas junto a autoridades estrangeiras que relataram desvio de conduta de servidores brasileiros no processo de exportação — esse despacho foi feito a pedido das empresas que tinham cargas apreendidas nos Estados Unidos e Europa e, com isso, possibilitou a regularização de mais de 8 mil cargas de madeiras exportadas ilegalmente entre 2019 e 2020. As investigações começaram em janeiro deste ano após informações obtidas junto a autoridades estrangeiras

Desde o início do atual governo, os indicadores de desmatamento têm batido sucessivos recordes no Brasil e motivado um repúdio internacional sem precedentes sobre a política ambiental brasileira, com efeitos econômicos, sobretudo no agronegócio. Salles já estava na mira do Congresso, do TCU e do STF. Acusado de tentar atrapalhar uma megaoperação da PF contra o desmatamento no Amazonas, em dezembro, o ministro é alvo de duas ações no Supremo — uma apresentada pelo PDT e outra pelo ex-superintendente da corporação no estado, Alexandre Saraiva — que serão relatadas pela ministra Cármen Lúcia.