O manifesto, encaminhado ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, é assinado por Miguel Reale Junior, José Gregori, Aloysio Nunes Ferreira e José Carlos Dias (governo FHC); Celso Amorim, Jaques Wagner, José Eduardo Cardozo, Tarso Genro e Eugênio Aragão (governos Lula e Dilma); e Raul Jungmann (governo Temer).
No texto, os ex-integrantes do governo federal dizem que há
uma "crise institucional derivada da representação promovida pelo
presidente da República" e destacam a "evidente atipicidade da
conduta e da tentativa de se instrumentalizar" o Senado "para
tumultuar o regime democrático".
Em São Paulo, Bolsonaro afirmou no último sábado que, ao entrar com o pedido de impeachment do togado, Moraes, agiu "dentro das quatro linhas da Constituição", e declarou:
"Engraçado,
quando eu entro com uma ação no Senado, fundado no artigo 52 da Constituição, o
mundo cai na minha cabeça. Quando uma pessoa em um inquérito no fim do mundo me
bota lá ninguém fala nada. Não é revanche. Cada um tem que saber o seu lugar,
só vamos poder viver em paz e harmonia se cada um respeitar o próximo e saber
que tem um limite, o limite é a nossa Constituição".
Em entrevista à revista Veja, Raul Jungmann disse que Bolsonaro exerce uma constante atuação de constrangimento para forçar as Forças Armadas a endossar os atos e as falas dele. O ex-ministro revelou, inclusive, que "o presidente chamou um comandante militar e perguntou se os jatos Gripen estavam operacionais. Com a resposta positiva, determinou que sobrevoassem o STF acima da velocidade do som para estourar os vidros do prédio".
Após o manifesto retrocitado, dez partidos políticos — que reúnem 43 dos 81 senadores com mandatos vigentes, incluindo o presidente da Casa — classificaram a atitude de Bolsonaro como algo "claramente revestido de caráter político". Uma das notas é assinada por PDT, PSB, Cidadania, PCdoB, PV, Rede e PT, e a outra, por MDB, DEM e PSDB. Em ambos os textos, os partidos destacam que os verdadeiros problemas do Brasil são a crise econômica, o desemprego, a inflação e, obviamente, a pandemia.
O governador do Rio Grande do Sul e pré-candidato à Presidência, Eduardo Leite, participou, na manhã de ontem, de um encontro entre 24 governadores em Brasília. Leite concordou com seu colega paulista, João Doria, na emissão de uma carta em defesa da democracia e em repúdio aos recentes ataques do capitão. Sobre as ameaças feitas pelo governo federal, o tucano gaúcho afirmou que "é grave o que vivemos no Brasil".
Leite defendeu que o fórum dos chefes dos estados chame o próprio Bolsonaro para dialogar, embora reconheça que o presidente nunca se mostrou disposto a isso. "Democracia não é apenas a oportunidade da eleição de um governo. É a necessidade também que os governantes eleitos saibam conviver com a contestação", afirmou o tucano. "Infelizmente, o atual presidente parece não saber disso, porque ataca todos os espaços de contestação. Nós, governadores, estamos sob constante ataque".
À morte, aos impostos e à infinitude do Universo e da estupidez humana soma-se mais uma certeza: a de que Bolsonaro sempre fará algo para piorar as coisas, mesmo quando elas já estiverem muito ruins.
No último fim de semana, o presidente confirmou quer vai participar dos atos golpistas marcado para 7 de setembro. Ontem vieram a público que as manifestações têm apoio das polícias militares de vários Estados.
Bolsonaro quer transformar o 7 de setembro em uma prévia da quartelada que pretende fazer caso perca as eleições de 2022, como mostram todas as pesquisas. Ontem pela manhã, ele disse que não poderia "aceitar passivamente" as prisões de Roberto Jefferson, Oswaldo Eustáquio e Daniel Silveira, detidos depois de ameaçarem o ministro cujo pedido de impedimento ele próprio mandou protocolar na última sexta-feira.
Em São Paulo, o chefe do Comando de Policiamento do Interior da Polícia Militar de São Paulo, coronel Aleksander Lacerda, convocou policiais para o ato golpista, como revelou o repórter Marcelo Godoy, do Estadão.
O coronel, que comanda 5 mil soldados na região de Sorocaba,
pediu tanques nas ruas e ameaçou os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz
Edson Fachin e Alexandre de Moraes. O governador João Doria o
afastou do cargo, mas o insurreto e uma das dezenas de oficiais das PMs estão
usando suas redes de WhatsApp para convocar "amigos" para os
atos golpista.
Numa das postagens, Lacerda afirma que o governador
tucano — que aparece numa fotomontagem como um travesti — é uma "cepa
indiana", que Rodrigo Maia é "mafioso" e que Rodrigo
Pacheco um "covarde". Segundo Godoy, o coronel escreveu
ainda que "o caldo vai entornar" no dia 7 de setembro e que "Liberdade
não se ganha, se toma. Dia 7/9 eu vou".
Vinícius
Nunes, repórter do Poder360, mostrou preparativos similares em grupos
de atuais e ex-policiais da Rota, o grupo de elite da PM paulista, no
Ceará e no Rio de Janeiro. Policiais do Rio de Janeiro pretendem marchar de
Niterói até a praia de Copacabana. Segundo a última mensagem no grupo "PMS
DO BRASIL BR", cinco ônibus lotados de agentes são esperados no dia 7.
"Sangue nos olhos e muito amor no coração pela nossa pátria! Deus, Pátria,
Família e Liberdade!!! Que os bons se unam!", diz a postagem.
Na democracia, a manifestação é livre, mas o que os bolsonaristas pretendem não tem relação com a democracia. É uma tentativa de intimidação da sociedade usando tropas armadas como força de choque para impor a sua vontade. Não difere em nada das táticas das ocupações dos chefes milicianos no Rio de Janeiro.
Torçamos para que essa sandice não vá adiante. E
que o Legislativo e o Judiciário despertem para a realidade e desarmem essa
bomba-relógio, essa barbárie que está só esperando o momento de acontecer.