domingo, 5 de dezembro de 2021

ESTÁ EXPLICADO

 

O BÊBADO E A EQUILIBRISTA — composição de João Bosco e Aldir Blanc que Elis Regina imortalizou em seu LP "ESSA MULHER", no final dos anos 1970 — me cruzou a mente durante a sabatina de André Mendonça, que arrasou no exercício de equilibrismo entre suas convicções religiosas (Glória a Deus!) e o posicionamento que deverá adotar quando receber a suprema toga e os 1.105 processos que herdará do ministro das causas perdidas.

"Na vida, a Bíblia, no STF, a Constituição", disse o indicado "terrivelmente evangélico" do sultão do bananistão, que deve tomar posse na semana que vem, fulminando as esperanças do passador-de-pano-geral da República de ter os ombros recobertos por uma toga igual as que Toffoli e Lewandowski ganharam de Lula (e vestiram por cima da farda de militante petista) e Nunes Marques, do capetão (por ter "tomado muita tubaína com ele"). Melhor sorte na próxima, meu rei.

Graças à teimosia de Davi Alcolumbre, o ungido do pajé da cloroquina teve 4 meses e 17 dias para beijar mãos e estreitar relações com os senadores, aprender as manhas da Casa e adequar suas respostas ao que a audiência (interna e externa) gostaria de ouvir. Acendeu velas a Deus e ao diabo, repetiu várias vezes o lema da valorização da política e da importância dos políticos. Nenhum outro membro da atual composição do STF colecionou tantos votos contrários quanto ele (9 na CCJ e 32 no plenário) quanto ele, mas é incontestável que tenha se saído melhor que a encomenda.

No que tange a Alcolumbre, o feitiço se virou contra o feiticeiro. O senador foi buscar lã e saiu tosquiado. Mas não perdeu a pose: durante a sessão afinal realizada, desmanchou-se em rapapés ao protegido do Belzebu palaciano. Já Mendonça, calçado em pelica, agradeceu a “gentileza e a imparcialidade” (pois é, podem rir que eu espero) do senador amapaense.

Mudando de um ponto a outro, João Doria derrotou Eduardo Leite (e Arthur Virgílio) nas prévias tucanas. Em outros tempos, a definição de um nome do PSDB para disputar a Presidência causaria agitação na atmosfera; agora, o que se tem é um misto de indiferença, descrença e desconfiança. Pode-se argumentar que esse "aparente descaso" seja uma estratégia para não fornecer azeitonas à empada do governador paulista, mas essa tese não se sustenta diante da excitação produzida pela filiação de Sergio Moro ao Podemos, pondera Dora Kramer em sua coluna.

Ganhar as prévias é pré-requisito, mas está longe de ser solução. São Paulo é forte, mas não é o Brasil. Vale lembrar que Maluf derrotou Andreazza na convenção do PDS em 1984 e perdeu para Tancredo, no ano seguinte, por uma diferença de 300 votos de um colegiado composto por 686 eleitores. Claro que o mundo é outro e o Brasil, completamente diferente. Mas o episódio serve de ilustração sobre a distância entre o poderio da conquista de votos em espaços de regras controláveis e o poder de sustentar êxitos obtidos sem o engajamento expressivo e inequívoco de seus pares. O estado de espírito no “ninho tucano" é de apatia e a reação algo discreta de Doria, que foi moderado no cântico da vitória, pode indicar que ele tem noção exata dos desafios à frente. Engajar o partido na sua candidatura não é o único, mas é imprescindível até mesmo como premissa para a construção de pontes para fora do PSDB.

Dias depois da cerimônia de filiação ao PL e do discurso em que Jair Bolsonaro disse "estar se sentindo em casa", a revista eletrônica Crusoé publicou uma matéria que detalha um flagrante feito pela PF há cerca de um ano, em meio a uma investigação que envolve emendas do famigerado "orçamento secreto". No vídeo divulgado pela revista vê-se o deputado Josimar Maranhãozinho manuseando maços de dinheiro. Como isto aqui é Brasil, nenhuma medida além das ações de busca e apreensão foi adotada até o momento.

Maranhãozinho não só segue no mandato como articula sua candidatura ao governo do Estado. Mas não é só. O deputado é duplamente investigado no STF por compra e venda de emendas parlamentares e por suspeitas de cooptar outros políticos para participarem com ele do desvio de emendas a municípios controlados por aliados que contratam empresas ligadas ao esquema e lhes devolver o dinheiro lavado e em espécie.

O detalhe — e o diabo mora nos detalhes — é que o parlamentar em questão é filiado ao PL e tido como fiel escudeiro do mensaleiro e ex-presidiário Valdemar Costa Neto, que acontece de ser o dono do partido no qual nosso indômito mandatário disse "sentir-se em casa". 

Dias atrás, num documento de compromissos apresentado para a organização da Cúpula da Democracia — a ser realizada em Washington nos próximos dias 9 e 10 — o desgoverno federal afirmou que a mídia tradicional é responsável pela desinformação que circula no país e ressaltou que o combate ao problema não pode acabar em censura — bandeira também levantada pelo ex-presidente Donald Trump. Segundo o documento, vozes conservadoras e governistas têm sido perseguidas e censuradas por plataformas de internet e pelo STF, que determinou a prisão do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos.

Integrantes do governo americano consideraram as promessas do governo tupiniquim "inusuais" para a cúpula, que tem como um dos objetivos a proteção de jornalistas profissionais e o "incentivo à imprensa livre e independente". Outras promessas a serem apresentadas pelo Brasil durante o evento são o comprometimento com o Estado de Direito, a liberdade de pensamento e expressão, inclusive na internet, a realização de eleições livres e justas e a manutenção dos avanços em direitos humanos. Podem rir.

Vale lembrar que Bolsonaro se tornou alvo de mais um inquérito no STF, agora por divulgar uma “fake news” que associava a vacina contra a covid ao risco de contrair o vírus HIV. Está explicado ou será que eu preciso desenhar?

Só falta agora o deus pai da Petelândia se filiar à quadrilha do Vavá. 

Glória a Deus!