Michel Temer, Eurico Dutra e Nereu ramos
são bons exemplos de políticos que ascenderam à presidência a despeito se sua
falta de carisma. Isso sem falar no picolé de chuchu, cuja sensaborice
contribuiu para o fiasco do tucano nas duas vezes que disputou a Presidência, a
despeito de ter sido o político que governou São Paulo por mais tempo desde a
redemocratização.
Observação: Comenta-se à boca pequena que Alckmin
será candidato a vice-presidente na chapa de Lula (o que é no mínimo
vergonhoso), mas não será com as bênçãos de Gilberto Kassab: na semana
passada, o cacique do PSD foi curto e grosso: "Eu não estarei
com o Lula no primeiro turno, e isso já foi dito a ele. Não é porque é o
Geraldo, fulano ou sicrano, é porque teremos candidatura própria". Kassab
disse ainda que, para ele, o
"projeto redondo" em São Paulo "acabou", e outro nome será
procurado.
João Batista Figueiredo era insuperável em falta de
carisma e papas na língua. Sempre se soube que o
último general a governar o Brasil durante a ditadura não nascera para ser
figura pública. "Estou
fazendo uma força desgraçada para ser político, mas não sei se vou me sair bem:
no fundo, gosto mesmo é de clarim e de quartel", afirmou
certa vez. Os marqueteiros chapa-branca até tentaram transformar o casca-grossa
numa figura popular, com a alcunha de João do Povo, mas deram com os
burros n’água.
Entre outras pérolas de sutileza, o militar carioca disse
preferir “o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo". Quando uma
criança perguntou o que ele faria se fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo,
respondeu sem pestanejar que daria “um tiro na cuca”. Sobre a abertura
política, esbravejou: "É
para abrir mesmo. Quem quiser que não abra, eu prendo e arrebento".
Mas nada se compara a sua lapidar constatação de que "um
povo que não sabe nem escovar os dentes não está preparado para votar".
Observação: Nas palavras do próprio Figueiredo:
"Vejam se em muitos lugares no Nordeste o brasileiro pode votar bem, se
ele não conhece noções de higiene? Aqui mesmo em Brasília, eu encontrei outro
dia, num quartel, um soldado de Goiás, que nunca escovara os dentes e outro que
nunca usara um banheiro. E por aí vocês me digam se o povo já está preparado
para eleger o presidente da República."
Figueiredo era racista. Chegou a dizer que “a
solução para as favelas é jogar uma bomba atômica”. Outra declaração típica
do fardado: "Eu
cheguei e as baianas já vieram me abraçando. Ficou um cheiro insuportável,
cheguei no hotel tomei 3, 5, 7 banhos e aquele cheiro de preto não saía".
"Pérolas" como essas suscitam uma inevitável
comparação entre Figueiredo e Bolsonaro. Há semelhanças, mas o
general era autêntico, inclusive na grosseria, e o que o
"mito" dos despirocados fala não passa de mise en scène para
acirrar a escumalha que lhe dá respaldo nas urnas e nas redes sociais. Como
quando disse que cagou
para a CPI e que o
Omar Aziz tem cara de capivara (o senador rebateu o insulto
referindo-se ao ofensor como "aquele
carioca que tira proveito de funcionários do próprio gabinete" e
que "abre
a boca para jogar fezes").
Numa entrevista concedida à Folha em 1978 (que
recebeu o Prêmio Esso de Jornalismo), Figueiredo, então chefe do SNI, falou diversas
vezes em "Revolução" e justificou muitas de suas opiniões,
como ser contra a independência entre os Poderes, a anistia e as eleições
diretas para Presidente. Perguntado sobre o eleitorado tupiniquim, respondeu
aos entrevistadores: "Getúlio não fez uma ditadura sanguinária e acabou
sendo eleito? Vocês sabem que no Rio Grande do Sul houve uma seca, e os
eleitores decidiram votar contra o governo, por que não choveu? Um eleitorado
não elegeu
o Cacareco [rinoceronte do Zoológico de São Paulo]? Então uma
coisa dessas tem cabimento?".
A pergunta do finado fazia sentido, mas é absurdo ter
saudades dos anos
de chumbo, como fazem jovens abilolados de 20~30 anos, que cantam
"those were the days" para a ditadura apoiam atos
antidemocráticos estimulados pelo “mito” — que teve o desplante de participar
pessoalmente de manifestações em que a récua pugnava pelo fechamento do STF
e do Congresso, volta do AI-5 e ditadura com Bolsonaro na Presidência —
quando sequer haviam nascido naquela época.
Saudosistas de fancaria (como são os apoiadores do nosso
mandatário de fancaria) idolatram um passado que nunca existiu. Bolsonaro
é uma aberração que foi eleita para impedir a volta do lulopetismo corrupto,
quando poucos podiam imaginar que se estava removendo o pino de uma granada de
efeito retardado, desarrolhando a garrafa de um ifrit megalômano, abrindo
a caixa de
Pandora, enfim, deixo a escolha da analogia a critério do freguês.
Desde sua posse, em janeiro de 2019, o dublê de mau
militar e parlamentar
medíocre nada fez senão articular sua reeleição e cagar
solenemente para quem não pensa como ele. De cagada em cagada, o
Messias que não miracula vai esmerdeando o lema chauvinista e enjoadinho associado
a sua campanha: "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos".