domingo, 23 de janeiro de 2022

CIRCO SEM BILHETERIA

No Rio, a criminalidade não está apenas nas bocas de fumo ou nos escritórios da milícia. O crime organizado ocupou os palácios Guanabara e Laranjeiras, sede da administração estadual e residência oficial do governador.

Quando era deputado federal pelo Rio de Janeiro, Bolsonaro ocupou a tribuna da Câmara para elogiar milicianos — gente que despia a farda de policial nas horas vagas para vender segurança a preços módicos a comerciantes e moradores das áreas conflagradas. Na campanha de 2018, ensaiou um lamento: "As milícias tinham plena aceitação popular, mas depois acabaram se desvirtuando. Passaram a cobrar “gatonet” e gás".

O então presidenciável esqueceu de mencionar o transporte clandestino e as construções ilegais. Mas lapsos de memória são compreensíveis. Bolsonaro tinha ao seu redor o ex-sargento e operador de rachadinhas Fabrício Queiroz, além do ex-capitão Adriano da Nóbrega. O primeiro livrou-se da cadeia graças ao prestígio dos amigos nos tribunais superiores de Brasília, e o segundo foi passado nas armas no interior da Bahia.

Bolsonaro impulsionou a eleição de Witzel, um ex-juiz que prometeu extinguir a corrupção e "mirar na cabecinha" dos bandidos. Foi deposto por desvio de verbas da saúde. Antes disso, Luiz Pezão, o antecessor de Witzel, armou com Michel Temer uma intervenção federal cenográfica na segurança do Rio quando faltavam dez meses para o melancólico final de sua gestão. E deu no que está dando.

Chefiava a "intervenção" o general Braga Netto, hoje ministro da Defesa e opção de candidato a vice na chapa de Bolsonaro. Na última quarta-feira, enquanto a polícia escalava o Jacarezinho, o governador-tampão passava o pires em Brasília. Sob intensa oposição do Tesouro Nacional e da Procuradoria da Fazenda Nacional, tentava convencer a gestão Bolsonaro a ignorar pareceres técnicos que desaconselham a admissão do Rio na UTI federal do plano de recuperação fiscal.

De duas, uma: ou Bolsonaro adere ao espetáculo do seu aliado, ou Castro terá de explicar como fará para levantar a lona do circo eleitoral da segurança pública, com o prometido viés social, sem bilheteria.

Com Josias de Souza