Quando o Congresso Constituinte transformou o Ministério Público numa entidade independente, imaginou-se que o país havia sido presenteado com uma instituição forte. Passados 34 anos, o brasileiro constata que foi condenado a conviver com mais uma corporação viciada em privilégios.
Há no MPF 1.145 procuradores. Desse total,
720 (62,8%) receberam supersalários em dezembro. Foi uma farra: 491
procuradores ganharam mais de R$ 100 mil, 158 receberam mais
de R$ 200 mil, 53 beliscaram mais de R$ 300 mil e 18
felizardos foram agraciados com cifras superiores a R$ 400 mil. Um
único procurador levou R$ 446 mil, e outro, quase meio milhão
(R$ 471 mil).
Nesse Natal custeado pelo contribuinte, coube a Augusto
Aras o papel de Papai Noel. Ele autorizou, entre outras regalias, o
pagamento de abono de férias de 2022, além de liberar o pagamento de um
benefício extrassalarial chamado “licença-prêmio” (a cada cinco anos de
trabalho, o sujeito ganha um descanso remunerado de três meses, que pode ser
convertido em dinheiro).
Em condições normais, seria apenas mais um escândalo. Numa
época de pandemia, tornou-se um escárnio especialmente revoltante, porque o
desemprego, a redução de jornada e a poda de salários converteram-se fenômenos
ainda mais triviais na iniciativa privada.
Em nota, a PGR o absurdo de "dívidas
da União para com membros do Ministério Público" e atribuiu os
desembolsos a uma "sobra orçamentária" para ficar com a cara de coisa
feita dentro da lei.
Recomenda-se a Aras que evite repetir esse
tipo de argumento no balcão de uma lanchonete de rodoviária. Ali, trabalhadores
que aguardam pelo transporte teriam dificuldades para compreender como
procuradores recebem contracheques de mais de R$ 400 mil num
país em que metade da população rala para obter menos de três salários-mínimos,
convivendo com a sobra do mês no fim do salário.
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Bolsonaro escreveu num grupo de WhatsApp que utiliza para se comunicar com auxiliaresque Abraham Weintraub "não está para colaborar, mas para tumultuar".
O tumulto sempre foi uma especialidade do personagem, mas o capitão não se importava quando o ex-ministro usava seus dotes para convulsionar o setor educacional. Agora, abespinha-se porque foi enfeitiçado pelo feitiço de Weintraub.Após insinuar que Bolsonaro recebeu informações
privilegiadas sobre a rachadinha que explodiria na cabeça de Bobi Filho, Weintraub disse
que Bibo Pai substituiu os "conservadores" do governo por "essa
turma do Centrão". E foi ecoado pelo ex-chanceler Ernesto
Araújo.
Bolsonaro já não precisa de inimigos.
Ex-ministros como Weintraub se encarregam de mostrar quem é o
presidente.
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Segundo Diogo Mainardi, desde o primeiro dia de mandato que Bolsonaro só pensa numa coisa: escapar da cadeia. Seus atos, que podem parecer incoerentes, sempre foram ditados pelo pavor de ser preso: o golpe na PF, a escolha de Augusto Aras, o chute em Sergio Moro, o cafezinho com Gilmar Mendes, a pizza com Dias Toffoli, a sabotagem da Lava-Jato, o conluio com mensaleiros e quadrilheiros. Em meados do ano, com seu derretimento nas pesquisas e nas redes sociais, o sociopata deve pular fora da disputa presidencial e se candidatar a senador, em busca de blindagem.
Com Josias de Souza e O Antagonista