Sergio Moro não teria dificuldade em se eleger deputado federal por São Paulo e, com apoio da imprensa independente e dos cidadãos lúcidos, ajudar a recobrar a confiança do eleitor na política e construir as pontes necessárias para um projeto presidencial em 2026 ou 2030. Mas preferiu lançar sua pré-candidatura à Presidência, esquecendo-se de que a corrupção é como a Hidra de Lerna (detalhes no capítulo anterior) e de que ele não é Hércules.
Depois que o semideus togado da mitológica justiça tupiniquim passou de apoiador incondicional a inimigo figadal da Lava-Jato, os ventos frios que sopravam desde Curitiba mudaram de direção. E quando o pasquim panfletário de Verdevaldo das Couves passou a divulgar — seletivamente e a conta-gotas — conversas supostamente mantidas pelo ex-juiz com o coordenador da força-tarefa, e deste com outros procuradores, a operação Vaza-Jato culminou com a soltura de Lula, sua conversão a “ex-corrupto” e subsequente reinclusão no xadrez (sem trocadilho) da sucessão presidencial tupiniquim.
O material vazado pelo “jornalista investigativo americano” — dono de invejável capivara — foi obtido criminosamente por uma “quadrilha de hackers” e sua autenticidade sempre foi contestada. Não se sabe se os arquivos foram editados ou não, mas sabe-se que eles foram selecionados a dedo para favorecer o ex-presidiário de Curitiba e pôr em xeque a lisura do magistrado que o condenou no processo sobre o tríplex do Guarujá (que acabou sendo anulado pelo ministro Edson Fachin, juntamente com outras três ações que tramitavam ou haviam tramitado na 13º Vara Federal de Curitiba).
Numa democracia minimamente respeitável, condenável seria usar material espúrio como prova, mas não no Brasil, onde a mais alta cúpula do Judiciário só precisava de um subterfúgio para desmantelar a mais bem sucedida operação anticorrupção da história e conspurcar a reputação de um magistrado que a população de bem via como “paladino da Justiça”.
Por uma abjeta e absurda decisão suprema, Moro passou de herói nacional a juiz parcial, suspeito, indigno do cargo que exerceu por 22 anos (vale destacar que “embargos auriculares” não são exatamente incomuns em nossos tribunais, inclusiva nas cortes superiores). Deltan Dallagnol foi acusado de ser o Robespierre das Araucárias, de fazer uso de provas falsas (?!), de ameaçar a democracia, de ser o inimigo número um do direito de defesa no Brasil. Graças às “provas definitivas” apresentadas por Verdevaldo e Cia. e reverberadas por toda a mídia que foi na sua cola, ficou entendido que a Lava-Jato e todos os atos por ela deveriam ser anulados de cabo a rabo.
Moro e Dallagnol conseguiram um prodígio inusitado num país polarizado: ser odiados tanto por Lula et caterva quanto por Bolsonaro e sua quadrilha de apoiadores — sem falar no eminente mandachuva do STF, entre outras sombras togadas. Se Moro tivesse continuado à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba, talvez Lula tivesse sido condenado nos demais processos e continuasse gozando férias compulsórias na Superintendência da PF de Curitiba, na Papuda, em Presidente Venceslau ou na ponte que partiu. Mas é aí que entra o bendito “se” (detalhes na postagem anterior).
Ulysses Guimarães, um dos grandes nomes da política brasileira, nunca foi presidente da República, mas dignificou o mandato de deputado federal. Bolsonaro e Lula, cada qual a sua maneira, emporcalharam o instituto da Presidência. Se falta grandeza às instituições, é por causa da baixíssima estatura moral dos homens que as ocupam. E se homens de baixíssima estatura moral tomaram de assalto as instituições, a culpa é do “esclarecidíssimo” eleitorado tupiniquim. Simples assim.
Sobrando tempo e dando jeito, assista a este vídeo: