terça-feira, 17 de maio de 2022

E ASSIM A COISA VAI... DE MAL A PIOR


Houve um tempo em que as forças do centro à esquerda nem discutiam sobre a conveniência de determinadas alianças se o plano era derrotar um inimigo comum (no caso, a ditadura). Em 1978, quando Paulo Maluf ganhou a convenção da Arena derrotando Laudo Natel, a vitória turco lalau foi festejada como uma derrota do regime militar. Foi nessa lógica que se construiu uma grande aliança para empurrar a ditadura ladeira abaixo nas batalhas da anistia e das Diretas Já. Só o PT não embarcou.

Lula et caterva preferiram marcar posição expulsando os deputados do partido que votaram em Tancredo e tentaram repetir a dose em 1988, recusando-se a assinar a nova Constituição. Aliás, o PT foi o único partido a não participar da ampla aliança em torno do governo Itamar Franco após o impeachment de Collor.

Nessa toada sectária, partido dos trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam imprimiu clareza à sua atuação, mas perdeu as três eleições presidenciais que disputou até alcançar a vitória em 2002, quando modulou o discurso e a política de alianças com a incorporação do PL à chapa (na figura do empresário-senador José Alencar na Vice-­Presidência). Agora, vinte anos depois, tenta reeditar a lógica da unidade geral e irrestrita para derrotar Bolsonaro

O partido de Lula reincorpora o conceito de amplitude, mas na prática atua com a estreiteza de antigamente. Não faz concessões. Agora não mais pela necessidade de construir e consolidar sua marca, mas devido à dianteira nas pesquisas e a ausência de competidores no campo da oposição ao capetão. O sumo pontífice da seita do inferno diz ter ciência de que a eleição não está ganha, mas age exatamente como se estivesse. 

O “venha a nós” impera em suas atitudes, mas nada ou muito pouco acena ao reino dos aliados e potenciais apoiadores a ser conquistados. À faixa dos que ainda vagam entre os líderes das pesquisas, que resistem tanto ao criminoso que quer voltar à cena do crime quanto ao que nela deseja permanecer, o picareta dos picaretas não tem fornecido bom material para atração. A aliança com o picolé de chuchu só trouxe vantagem para o PT

E o que dizer do tratamento dispensado a Marina Silva? A Rede entrou na aliança, mas Marina não firmou apoio. Lula se disse surpreso; Marina demonstrou surpresa com a surpresa de Lula. Para quem não está lembrado, em 2014 Marina foi combatida de maneira torpe, à base de mentiras, o que deteriorou de vez uma relação seriamente machucada desde que ela deixou o Ministério do Meio Ambiente de Lula dizendo que preferiria perder o pescoço a perder o juízo. Merecia ao menos um gesto, mas a soberba leva o petralha a achar que, se o fizer, os outros nove dedos da mão podem cair.

O PT quer reeditar o ambiente de frente ampla contra o inimigo comum que tantas batalhas venceu no processo de derrocada do regime militar. É um desejo de difícil realização se a ele não se incorpora o conceito da reciprocidade, do desprendimento e da prática da mão dupla.

Ciro Gomes começa a sofrer uma ofensiva para desistir. Não mediante proposta de pacificação, mas com tentativa de atrair os candidatos do PDT a governos estaduais. Ou seja, não é no jeito, é na força. Pela "porcínica" terceira via (aquela que se foi sem nunca ter chegado), Doria insistirá até vencer as resistências dentro do PSDB. Sua confiança chega a ponto de considerar, a sério, que disputará o segundo turno contra Lula (o que seria um sopro de esperança).

Doria não contesta em público as movimentações da mitológica terceira via em busca de um nome para representá-la, mas, no privado, toca a campanha disposto a ir até a Justiça para assegurar o resultado das prévias do partido. Parece dar de ombros para o critério de se fazer a escolha a partir de pesquisas qualitativas e quantitativas. Tanto é assim que já encontrou um slogan baseado em suas próprias consultas de opinião: “É chato, é coxinha, usa calça apertada? É tudo isso, mas sabe como resolver os seus problemas”.

O ex-governador confia que a partir de agosto a candidatura vai deslanchar. E por que ainda não deslanchou? Segundo sua equipe, porque os levantamentos feitos no mundo digital (hoje visto como o “mundo real”) sobre assuntos de interesse das pessoas indicam que apenas 4% dizem respeito a temas relacionados à política e à eleição. A conferir.

Os demais candidatos ainda hesitam sobre a conveniência de deflagar um movimento conjunto contra a intenção de Bolsonaro de alegar fraude nas eleições. Consideram que algum ato será necessário, mas no momento a dúvida é se isso não poderia significar a adesão a uma ideia ruim, de “golpe”, que só leva água para o moinho bolsonarista. Por enquanto, a tendência é não cair na provocação e ressaltar a falta de condições objetivas para contestação do resultado sob a alegação artificial de fraude.

Com Dora Kramer