Bolsonaro disse que os militares propuseram ao TSE a realização de uma apuração paralela nas eleições de outubro. Segundo ele afirmou em várias oportunidades, os votos são contados numa “sala secreta”, donde a proposta de os dados serem transmitidos concomitantemente para um computador específico das Forças Armadas.
A existência da tal “sala secreta” — tese baseada em relatos mentirosos — já foi contestada pela Corte Eleitoral. Na verdade, a apuração é feita automaticamente em cada urna eletrônica e as informações são impressas nos chamados boletins de urna. Além disso, o ministro Fachin, atual presidente do TSE, afirmou que sugestão em questão jamais constou das propostas feitas pela Ministério da Defesa.
A Folha de S. Paulo pediu ao Ministério da Defesa a lista de todos os questionamentos das FFAA ao TSE sobre as eleições desde 1996, ano de lançamento das urnas eletrônicas, e a resposta foi que “não foram encontrados ‘questionamentos’ feitos por este ministério ao TSE antes de 2021/2022, versando sobre o sistema eleitoral”.
Bolsonaro vem usando as Forças Armadas contra a democracia. Segundo Ricardo Noblat (lulista até o último fio de cabelo), ele receia não se reeleger e ser preso após passar o cargo a seu sucessor — daí ter implorado ajuda a Biden para derrotar Lula. O presidente reconhece que “conversou vagamente” com o colega americano sobre as eleições de outubro, mas negou ter pedido ajuda, embora essa informação tenha sido confirmada pela agência de notícias americana Bloomberg. Biden teria desconversado e enfatizado a importância de preservar a integridade das eleições brasileiras. Nem o Planalto e nem Casa Branca — de onde certamente a notícia vazou — quiseram se pronunciar, mas tampouco negaram a informação.
No ano passado, emissários de Biden vieram três vezes ao Brasil para advertir Bolsonaro de que o governo americano jamais apoiará um golpe. Bolsonaro seria mais permeável aos interesses dos EUA do que Lula. O capitão bate continência para a bandeira americana toda vez que vê uma ser hasteada; Zero Três, antes de se eleger deputado, trabalhou numa lanchonete no estado do Maine, e chegou a ser cogitado para o posto de embaixador do Brasil em Washington.
O que Bolsonaro fez configura crime de responsabilidade, e crime de responsabilidade é motivo para um processo de impeachment. Mas seria apenas mais um para a coleção de Arthur Lyra, que já engavetou mais de 140 pedidos de impeachment contra Bolsonaro. Lyra e seus cupinchas na Câmara têm interesse em blindar o chefe do Executivo, até porque essa é uma via de mão dupla.
Fala-se que o presidente se tornou refém do Centrão, mas a recíproca é verdadeira, na medida em que a liberação do dinheiro do Orçamento Secreto depende da caneta Bic mais poderosa desta banânia. No início do governo, achava-se que os militares atuariam como curadores de Bolsonaro — um político que só “falava merda” —, mas salários polpudos, mordomias e prestígio levaram uma parcela do generalato a bater continência para o capitão, quando não apoiar seu plano de melar as eleições.
Sem dedicar uma hora de trabalho na Cúpula da Américas, Bolsonaro emendou o fim de semana em Orlando. Sextou a semana inteira e ainda constrangeu o país (mais uma vez) participando de uma motociata nos EUA. A ida a Los Angeles foi apenas mais um pretexto para veranear na Flórida. Trabalhar que é bom, neca. Só repetição de seu velho e batido discurso (que não se renova jamais), um script decorado com ataques ao sistema eleitoral brasileiro e negacionismo quanto a destruição da Amazônia.
No Brasil, 33 milhões de bocas abertas sem comida, enquanto o “mito” dos descerebrados culpa os empresários, os desaparecidos, os pobres pela miséria, inflação e desgoverno. Sextou para o capitão. A semana toda.