A colunista social da Folha de S.Paulo publicou uma nota sobre a festa de aniversário da sogra de Gilmar Mendes. Sua leitura vale mais do que quatro anos na faculdade de jornalismo. Mas ela pode ser apreciada também como um tratado concentrado de antropologia.
“Maria da Conceição Feitosa, a Doninha, completou 90 anos no mês passado com uma festa que celebrou também os 70 anos da advogada Guiomar Mendes, sua filha, e os 50 anos da neta Ketlin Feitosa Scartezini. Marido de Guiomar, o ministro do STF Gilmar Mendes esteve na comemoração, que foi realizada na Fazenda Boísa, no Ceará. Enquanto o aniversário da matriarca Doninha é comemorado em abril, o de Guiomar ocorre em agosto e o de Ketlin, em março.”
Mais do que uma festa de aniversário, portanto, foi um tributo à glória da estirpe, que nunca vai acabar.
“O dia de celebrações foi marcado por uma missa e por uma festa que teve como atrações musicais Bernardo e Manoel, Sirano e Sirino e Vicente Nery. O ministro Gilmar Mendes soltou a voz ao microfone, cantando o clássico sertanejo ‘Chalana’ em homenagem à sogra nonagenária.”
A nota incluiu até uma fotografia para eternizar esse radioso momento musical.
Ao contrário da colunista social da Folha de S. Paulo, sempre evitei qualquer contato com o ministro do STF. A escolha reflete um senso de pudor que, por mais de trinta anos, caracterizou meu trabalho na imprensa e me afastou preventivamente de determinadas fontes. Trata-se de uma barreira intelectual e, sobretudo, estética, que resultou nesse fracasso estrondoso que é a minha carreira no jornalismo.
Nos últimos tempos, tenho pensado um bocado sobre o assunto. De fato, consegui fracassar até quando obtive algum sucesso. O impeachment de Dilma Rousseff, por exemplo, do qual participei ativamente, deu em Michel Temer. O encarceramento de Lula, que também contou com meu empenho direto, deu em Jair Bolsonaro e, a partir do ano que vem, novamente em Lula. A responsabilidade é de Gilmar Mendes, claro, mas tenho de reconhecer que o saldo da minha atividade profissional, analisado friamente, é um verdadeiro desastre.
Foi por isso que resolvi escrever esta coluna. É um agradecimento enviesado à colunista social da Folha de S. Paulo, da qual eu costumo debochar. Num momento em que tudo ao meu redor parecia desmoronar, apontando para meu fim, ela foi capaz de restaurar minha autoestima, com aquela nota singela sobre a sogra de Gilmar Mendes.
Obrigado, Monica. Seu vexame me redimiu.
Texto de Diogo Mainardi