segunda-feira, 20 de novembro de 2023

A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM...

 

A decisão do Conselho de Justiça Federal de que magistrados que acumulam funções podem gozar de um dia de folga a cada três trabalhados ou receber adicional salarial pela tarefa foi ultrajante (para dizer o mínimo). É imoral uma casta já ultraprivilegiada, que recebe proventos mensais de quinze, vinte, trinta salários-mínimos e um sem-número de mordomias e penduricalhos, se autoconceder um prêmio que pode chegar a até 1/3 do ano.
Somadas aos fins de semana e feriados prolongados, as férias de 60 dias do Judiciário permitem que suas excelências trabalhem menos de 240 dias por ano. Agora, com mais (até) 120 dias de descanso, elas poderão viver literalmente de brisa, sombra e água fresca — custeadas com o dinheiro de uma população que, em sua absoluta maioria, vive com menos de R$ 3.5 mil mensais. 
Acúmulo de funções só tem duas razões: falta de planejamento interno ou falta de pessoal. No caso do Judiciário, somam-se férias, feriados etc. Como parece não faltar magistrados no Brasil, ou se planeja adequadamente cargos, funções e tarefas ou — o que seria minimamente razoável e racional — ou se coloca essa gente para trabalhar de verdade.

No início do segundo mandato de Dilma, o então ministro Gilberto Kassab foi vaiado por mais de 1,500 empresários, em Salvador, enquanto tentava atribuir a tragédia anunciada da economia — que caminhava para uma retração de 3,8% — à desaceleração chinesa. O constrangimento imposto ao ministro deixou claro que a crise cobraria seu preço político, e a inabilidade da gerentona de festim em dialogar com o Congresso avivou as chamas da fogueira do impeachment. 

Mas a pergunta "o que o PT aprendeu após o governo Dilma" passou longe de ser respondida durante a campanha e continua sendo feita com frequência pelo mercado e pelo Congresso, que ainda não conseguiram identificar qual é o plano de D. Lula III (se é que existe algo além de aumentar o endividamento com investimentos estatais). Ao tentar explicar, na live da última terça-feira, a acusação de que Israel "mata inocentes sem nenhum critério", o "Sun Tzu de Atibaia" — que sugeriu à Ucrânia entregar a Crimeia à Rússia e disse que, no Brasil, aquela questão seria resolvida em mesa de bar — apresentou sua nova lição ao mundo: 

"É por isso que eu disse que a atitude de Israel com relação às mulheres e às crianças é igual a um terrorismo. Não tem como dizer outra coisa. Se eu sei que está cheio de criança naquele lugar, pode ter um monstro lá dentro, eu não posso matar as crianças porque quero matar o monstro. Eu tenho é que matar o monstro, mas sem matar as crianças. É simples assim."

 

Lula — que se baseia em números do Hamas sobre mulheres e crianças mortas  nunca deu um pio sobre o uso de civis como escudos humanos nem mencionou que os "monstros" ficam ali atrás por escolha estratégica. É como se a presença de terroristas, mulheres e crianças em áreas de hospitais e escolas fosse mera coincidência com a qual Israel não sabe lidar — ao contrario dele, claro, dada sua expertise em deslocamentos internacionais (entre o avião presidencial e hotéis de luxo, pagos com dinheiro dos "contribuintes")


A alegação de que "não tem como dizer outra coisa" senão acusar de terrorismo a vítima do terror não resiste à menor comparação com discursos de democratas de fato, como o do premiê britânico Rishi Sunak, segundo o qual "este é um momento de clareza moral", porque "o passado está tentando impedir que o futuro nasça". De acordo com Sunak, o ataque do Hamas não foi motivado somente pelo ódio, mas também pelo medo de um novo Oriente Médio renascer com Israel normalizando as relações com seus vizinhos. A Rússia invadiu a Ucrânia porque Putin temia o surgimento de uma democracia moderna, reformadora e próspera à sua porta, e queria puxá-la de volta para alguma fantasia imperialista do passado. É preciso manter viva a promessa de um futuro melhor e defender os inocentes que a Rússia vê como alvos e o Hamas, como escudos humanos.

 

Sem deixar de defender prudência no avanço sobre áreas sensíveis de Gaza, Sunak mostrou, na prática, como é possível "dizer outra coisa", manifestando compaixão e solidariedade, apoio à autodefesa de países atacados, repúdio ao terrorismo do Hamas e ao imperialismo de Putin, com o tom, a forma e o cuidado que se esperam de um chefe de Estado Democrático de Direito em tempos de guerra, não de um papagaio de ideólogos antiamericanos que tenta desviar o foco das reuniões de seu governo com a mulher de um líder do Comando Vermelho.


Em Brasília, subverte-se até o brocardo. Há males que vêm para pior. Sabia-se que Luciane Barbosa Farias foi recebida no Ministério da Justiça por dois secretários de Flavio Dino, mas não que pasta dos Direitos Humanos, chefiada pelo ministro Silvio Almeida, bancou com verbas do erário (ou seja, dinheiro do contribuinte) a viagem da "dama do tráfico amazonense" a a Brasília. Na Justiça, Luciane tratou com auxiliares de Dino da precariedade do sistema carcerário; nos Direitos Humanos, participou de encontro dedicado a prevenir a tortura. Os dois ministérios alegam que desconheciam os vínculos de madame com o crime. Num, diz-se que ela foi levada pela ex-deputada psolista Janira Rocha, no outro, sustenta-se que ela foi indicada por comitê antitortura do Amazonas.

 

No jargão policial, a ficha criminal recebe o apelido de capivara. No caso de Luciane, os ministérios engoliram um elefante: condenada a 10 anos de cadeia, a "dama do tráfico" recorre da sentença em liberdade. Seu marido, o chefão do Comando Vermelho no Amazonas Clemilson dos Santos Farias, também conhecido como Tio Patinhas, puxa 31 anos de cana em regime fechado. Não é apenas o erro que arruina a imagem do governo, mas o modo como os ministérios reagem depois de cometê-los. A pasta da Justiça modificou as regras de triagem dos visitantes, e a dos Direitos Humanos limitou-se a admitir que desperdiçou dinheiro. Nem sinal de demissões.

 

Quando compensa, o crime muda de nome no Brasil. Tráfico de drogas, por exemplo, pode ganhar uma aparência de tráfico de influência. A propósito, leia a íntegra da nota divulgada pelo Ministério dos Direitos Humanos.


ATUALIZAÇÃO: Para não dizer que não falei das flores (!?), o clone bolsonarista portenho Javier Milei  foi eleito presidente da Argentina, com 56% dos votos válidos contra 44% do peronista Sergio Massa, o execrável demolidor da Economia do país. Às 20h40 de ontem, o Sun Tzu de Atibaia reconheceu o resultado, mas não citou nominalmente o vencedor, sinalizando a intenção de estabelecer um relacionamento pragmático afinal, países não têm amigos, têm interesses. Em seu primeiro pronunciamento como presidente eleito, Milei não fez uma mísera referência ao Brasil, maior parceiro comercial da Argentina. Desejo boa sorte a nossos "germanos". Eles vão precisar.


Com Felipe Moura Brasil e Josias de Souza