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Não bastassem as letrinhas miúdas e a linguagem indecifrável do EULA (que 11 de cada 10 usuários aceitam sem ler), nossa privacidade é "atacada" pelos cookies — que não são biscoitos, mas porções de código destinados a monitorar nossa navegação e cujo uso vem sendo questionado há muito tempo.
A maioria dos websites compartilha os dados capturados com empresas de marketing, que os utilizam para ajustar a exibição de propagandas ao público-alvo de seus clientes. Se, por exemplo, os sites A, B, e C usam a mesma rede de publicidade, ela pode cruzar as informações para direcionar os anúncios com base nesse histórico de navegação.
Várias medidas já foram adotadas para manter a bisbilhotice digital sob controle. Em 2020, o Google foi pressionado a trocar os cookies de terceiros pela FLoC — que foi substituída 2 anos depois pelo Topics. Mas não é só. Além da invasão de privacidade, há ainda a questão da segurança.
Segundo a CloudSEK, malwares se aproveitam da saída "MultiLogin" do Google OAuth (protocolo de autorização utilizado para sincronizar o login em diversos serviços do Google) para restaurar cookies expirados e fazer login em contas. A falha foi divulgada pela primeira vez em meados de novembro do ano passado, de modo que já deve haver malwares circulando por aí. Como não está claro se eles conseguem superar métodos de autenticação de dois fatores, a dica para evitar invasões é e manter o antivírus atualizado e não baixar aplicativos de fontes desconhecidas. Mas tudo seria bem mais simples e transparente se os sites não nos obrigassem a autorizar a coleta dos dados mediante banners com letrinhas miúdas e o famigerado botão de "aceite" — que só libera a navegação na página quando é clicado.
O Relatório de Engajamento do Cliente 2023 apontou que os consumidores querem uma transição mais rápida para um futuro sem cookies. No Brasil, em 2023, 46% dos internautas preferiram deixar de acessar um site a aceitar os cookies (a média global é de 50%), 72% disseram desejar mais controle sobre seus dados de identidade e 47% sobre seus dados de comportamento. Mas o problema não está na cessão das informações, e sim em cedê-las de forma consciente.
Com o pós-cookies batendo à porta, os dados primários serão uma maneira mais segura e transparente de interagir com os consumidores. O Google criou um recurso que impede os sites de acessar cookies de terceiros (ele chegará inicialmente a 1% dos usuários e será estendido a toda a base no segundo semestre). A ferramenta é ativada por padrão; se houver problemas na hora de abrir algum site, o navegador perguntará ao usuário se ele quer reativar os cookies de terceiros temporariamente para aquele endereço.
Bloquear cookies de terceiros não é uma novidade. Edge, Firefox e Safari já fazem isso há tempos. O Chrome demorou a aderir porque, como o Google ganha muito dinheiro com publicidade, o jeito foi criar uma solução que colete menos informações, mas continue a direcionar anúncios. Com o fiasco da FloC — que a Mozilla criticou e a Microsoft desativou em seu browser —, a gigante de Mountain View apostou sua fichas na Privacy Sandbox. Mas anunciantes e empresas de tecnologia e publicidade ouvidos pelo Wall Street Journal manifestaram sua insatisfação, seja porque o lançamento do bloqueio se deu durante o período do ano em que o setor mais ganha dinheiro, seja porque o Google fez pouco para preparar o mercado.
Como se costuma dizer, "no fim dá tudo certo; se ainda não deu é porque não chegou no fim".