Num instante em que o país se horroriza com o escândalo da "Abin paralela", a PF sinaliza que o brasileiro deve suprimir a surpresa dos seus hábitos. O ponto de exclamação é insuficiente para expressar o espanto provocado pela revelação de que identidades comercializavam, num varejão por assinatura, informações pessoais capturadas em bancos de dados federais ao longo dos últimos 14 anos. Na era do ódio eletrônico e dos golpes cibernéticos, o varejão de identidades operado pelo Estado paralelo da bandidagem deixa o escândalo da Abin paralela parecido com um brinquedo de criança bolsonarista.
À medida que a PF coleciona indícios sobre a obviedade de quem era o destinatário preferencial do material coletado pela Abin paralela, Bolsonaro vai ficando numa posição constrangedora. Ao sustentar que, se existiu uma coleta ilegal de dados, as informações não chegaram a ele, o imbrochável insuportável pede para ser tratado não como criminoso, e sim como um tolo. Seja como cúmplice de crime, seja como abobalhado incapaz de perceber a bisbilhotagem que proliferava ao redor, o "mito" de festim não é o político que seus devotos supunham que ele fosse. O atoleimado não faz jus à imagem que construiu de si mesmo ao rodar a baiana na fatídica reunião ministerial de abri de 2020: "Não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha...". Soou categórico: "Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira."
Não faz sentido que esse Bolsonaro capaz de tudo peça agora ao país que o trate como um personagem incapaz de todo. Embora um pedaço do eleitorado insista em tratar um certo político como político certo, as evidências desaconselham a conversão de potenciais encrencados em tolos.