Observação: Nos meus tempos de ginásio, desinteligências eram resolvidas na base do "te pego lá fora", pois pugilatos intramuros não eram tolerados pelo corpo docente. Embora os ânimos se acalmassem até o momento do embate, a falta de uma "saída honrosa" e a pressão dos colegas (que queriam ver o circo pegar fogo) inviabilizava o armistício, pois quem o propusesse seria taxado de "arregão". Mas isso era coisa de pré-adolescentes que compravam merenda com dinheiro da mesada, de jovens impúberes cujas opiniões não valiam um traque.
Moraes voltou atrás no tocante ao bloqueio de VPN nas lojas App Store e Google Play Store — que, segundo ele próprio reconheceu, prejudicaria empresas que nada têm a ver com o peixe —, mas manteve a suspensão do X e a multa de R$ 50 mil a qualquer pessoa (natural ou jurídica) que ouse burlar a proibição.
Moraes deixou Musk numa sinuca de bico. Se nomear um representante legal, o bilionário estará mandando essa pessoa para a cadeia, a menos que capitule cumpra as determinações anteriores e censure os alvos do ministro. Se não quiser nenhum desses desfechos, só lhe resta continuar desobedecendo as determinações judiciais e arcando com as consequências. Em contrapartida, Musk transformou o que Moraes imaginava ser uma cruzada em defesa do Estado Democrático de Direito numa briga de bar. Na última sexta-feira, em meio a memes e garrafadas virtuais, Moraes rejeitou um recurso do X contra o bloqueio de 34 perfis sem analisar o mérito. Alegou que cabe à plataforma cumprir as ordens judiciais, não recorrer em nome dos bloqueados.
Com um patrimônio estimado em US$ 250 bilhões, Musk está cagando e andando para dinheiro. Mas o desenlace da novela, qualquer que ele seja, trará prejuízos para os usuários do Xwitter e sobretudo para os brasileiros conectados à internet pela Starlink. Mas as leis existem para serem cumpridas. Moraes não tinha alternativa senão intimar Musk, que pode discordar de suas decisões, mas a maneira correta de contestá-las é a interposição de recursos, e ele tem dinheiro de sobra para apresentar recursos.
Em mais um emocionante capítulo da novela (que parece estar longe de terminar), Musk criou a conta "Alexandre Files" para divulgar supostos "crimes" de Moraes no âmbito do bloqueio de conteúdos e perfis da plataforma. Uma publicação promete "lançar luz sobre os abusos" e outra qualifica de "violação frontal da lei" uma determinação do ministro de bloquear os perfis do senador bolsonarista Marcos do Val e da filha adolescente do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio, entre outros.
Observação: "ELON MUSK confunde LIBERDADE DE EXPRESSÃO com uma inexistente LIBERDADE DE AGRESSÃO, confunde deliberadamente CENSURA com PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL AO DISCURSO DE ÓDIO E DE INCITAÇÃO A ATOS ANTIDEMOCRÁTICOS", escreveu Moraes ao derrubar o X, usando letras maiúsculas, e afirmou ainda que "não se trata de novidade" a instrumentalização das redes sociais para "divulgação de diversos discursos de ódio", e que o "ápice dessa instrumentalização" contribuiu para a tentativa de golpe de estado de 8 de janeiro de 2023.
Tão importante quanto a continuidade dos processos é sua conclusão. A sensação de invulnerabilidade do refugo da escória da humanidade e do alto comando do golpe vai se tornando um novo atentado à democracia. De resto, a atmosfera de emergência institucional perdeu o prazo de validade: Aras foi para casa, os réus do 8 de janeiro colecionam sentenças e a PF faz o seu trabalho. Se Moraes voltasse a ser apenas Alexandre, não haveria um Xandão para Musk chutar. O ministro ainda não percebeu, mas está lidando com um porco-espinho, e esse porco-espinho o está arrastando para seu chiqueiro.