A morte trágica de
Teori
Zavascki se tornou ainda mais trágica porque ele era o relator dos
processos da Lava-Jato no STF. Não fosse por isso, seria pranteada por parentes
e amigos, algumas autoridades compareceriam ao funeral e o dito ficaria pelo
não dito. No entanto, mesmo quando o imprevisto tem voto decisivo na assembleia
dos acontecimentos, a vida precisa seguir seu curso e o show tem de continuar.
Passada a estupefação inicial, causada pela inesperada e
imponderável fatalidade, a ministra Carmen
Lucia determinou aos assessores do colega falecido que retomassem os trabalhos
e, dias depois, homologou ela própria as delações dos 77 da Odebrecht ― mulher de fibra, essa mineira de Montes Claros,
bem diferente da conterrânea de Belo Horizonte que foi penabundada da presidência
da Banânia no ano passado. Enfim, feita a homologação, restava decidir a questão
da relatoria da Lava-Jato no Supremo. Tecnicamente, quem ocupasse a vaga de Zavascki herdaria também os casos que
estavam sob seus cuidados. Mas isso aqui é Brasil e, na prática, a teoria é
outra, para o bem ou para o mal.
A indicação de ministros do Supremo é prerrogativa do presidente da
República. No entanto,
Michel Temer preferiu esperar a definição da
relatoria, e assim deu-se início a mais um folhetim tupiniquim, com direito a
opiniões as mais variadas, muitas vezes oferecidas pomposamente por apedeutas
que jamais leram um único artigo da Constituição. Depois de muito
disse-que-disse, o ministro
Luiz Edson
Fachin acabou mudando de Turma, ocupando o lugar de
Zavascki e assumindo a relatoria das ações da Lava-Jato. Simples
assim ― ou nem tanto.
Desde o início desse monumental imbróglio, cogitaram-se diversas
possibilidade, tais como
Carmen Lucia
avocar para si a relatoria da Lava-Jato ― como já havia feito com homologação
da Delação do Fim do Mundo ―, nomear o novo relatar mediante um acordo
costurado nos bastidores com os demais ministros ou realizar um sorteio entre
todos os 9 magistrados remanescentes ou somente entre os integrantes da 2ª
Turma, da qual fazia parte
Teori
Zavascki. Fosse como fosse, tudo se resolveria na última quarta-feira, dia
em que o Supremo voltaria do recesso de quase 40 dias. Só que não.
Ao fim e ao cabo, a solução foi um pouco de cada coisa e saiu na
quinta-feira, 2, depois que o novato da Corte foi transferido da primeira para
a segunda Turma ― foi preciso obter a concordância dos demais ministros, já que
no STF, como nos quartéis, antiguidade é posto. Aí, sim, realizou-se o tal
“sorteio” e... Surpresa: deu
Edson Fachin na cabeça!
Observação:
Fachin foi nomeado para o Supremo em meados de
2015, durante o mandato da anta vermelha. À época, muitos criticaram seu
suposto “menosprezo pelo preceito constitucional que garante a propriedade
privada no Brasil” e seus laços afetivos com o desprezível MST. Houve até quem
dissesse que a indicação do magistrado para o Supremo fazia parte de uma estratégia
de Dilma e do PT para melar a Lava-Jato, que o indicado havia se comprometido a
conceder um determinado habeas corpus que abriria espaço para a anulação de
todas as delações premiadas, e assim por diante. Mas Fachin deu a volta por cima com decisões que, se não foram unânimes
no plenário, não tiveram contestação óbvia. Assim, o fato de ele ser o novo
relator da Lava-Jato, se não foi a melhor solução, pode ter sido a “menos pior”.
Até porque o decano Celso de Mello
já havia dito que declinaria da relatoria caso fosse o escolhido, e os demais
componentes da segunda turma são Gilmar
Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski (precisa dizer mais
alguma coisa?).
Como diz um velho ditado, “cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça”.
Depois de ver tanta coisa “acabar em
pizza”, em conchavos espúrios e “acordões” estarrecedores, não é de estranhar
que o brasileiro tenha visto com desconfiança o resultado desse “sorteio”.
Houve quem dissesse que
Carmen Lucia
havia “mexido os pauzinhos”, e coisa e tal. Prova disso foi a enxurrada de
posts nas redes sociais a propósito do tema. Muitos davam como certa a escolha
de
Lewandowski (cujas decisões favoráveis ao
PT
e aos petralhas são notórias, para dizer o mínimo), ao passo que outros
apostavam em
Gilmar, e outros,
ainda, em
Toffoli (que, vale
lembrar,
foi
citado por Leo Pinheiro num acordo de delação premiada que acabou
barrado por
Rodrigo Janot depois que
a notícia foi publicada pela revista
Veja).
O fato é que, na impossibilidade de
Celso
de Mello assumir a relatoria da Lava-Jato, a maioria esperava que
Fachin fosse o escolhido. Sorte nossa?
Talvez. A postura de
Fachin chega a
lembrar a do finado
Teori, que
preferia falar nos autos a dar entrevistas e fazer pré-julgamentos. Mas ele é o
mais novo membro da Corte e a maneira como irá proceder é uma incógnita. Seja
como for, o sorteio foi realizado com a ajuda de um
algoritmo
que, dentre outras variáveis, levou em conta a quantidade de processos a cargo
de cada magistrado, de maneira a evitar que o “vencedor” ficasse sobrecarregado.
Assim,
Fachin levou vantagem no
sorteio (se é que se pode considerar “vantagem” herdar um “abacaxi” dessa
magnitude).
Observação:
Segundo o Jornal Nacional, o
sorteio foi realizado numa sala do terceiro andar do edifício-sede do Supremo,
na presença da presidente ministra Carmen
Lucia e mais quatro funcionários. Apenas os integrantes da 2ª Turma foram
considerados. Seus nomes foram distribuídos numa “régua”, onde cada um tinha
20% de chances. Depois, foi feito um ajuste que levou em conta o número de
processos a cargo de cada participante, aspecto que favoreceu o novato da Turma
e, em menor medida, o ministro Gilmar
Mendes (que, por acumular o cargo de Presidente do TSE, recebeu menos
processos que seus pares. Mas o gabinete que Fachin herdou ficou um ano sem receber processo algum ― período
entre a aposentadoria de Joaquim Barbosa
e a indicação de seu substituto pela ex-presidanta vermelha) ― e, portanto,
havia, realmente, mais chances de o novato ser sorteado.
Resumo da ópera: Para o bem ou
para o mal,
Fachin é o relator da
Lava-Jato no STF. Como ele vai desempenhar essa função, aí já é outra história.
No geral, no entanto, as opiniões têm sido favoráveis. Alguns palpiteiros veem
com preocupação o fato de ele ter sido indicado para a Corte pela mulher
sapiens de pouco saudosa memória, mas
Joaquim
Barbosa foi indicado por
Lula e
ganhou notoriedade como relator do Mensalão, notadamente por seus embates
contra
Ricardo Lewandowski ― a quem ele acusou diversas vezes de atuar mais como
defensor dos petralhas do que como julgador da ação.
Fachin é tido como insuscetível a ideologias partidárias, avesso a
comentários, discreto na vida social e mundana e pouco afeito a protagonismos midiáticos.
Já demonstrou ter consciência de que não foi indicado ao
STF para fazer favores, mas para julgar segundo as leis (como
comprovou ao relatar ação do PCdoB contra o rito fixado por
Eduardo Cunha para a tramitação do
impeachment da nefelibata da mandioca). Também decidiu que o réu
Renan Calheiros não podia assumir a
Presidência da República, mas defendeu a manutenção de seu mandato e do cargo
de presidente do Senado. Também abraçou a tese de que condenados em segunda
instância devem aguarda na prisão o julgamento de eventuais recursos. Quando,
como plantonista durante um recesso do Judiciário,
Lewandowski mandou soltar
José
Vieira da Silva, prefeito de Marizópolis condenado em segunda instância,
alegando ser preciso “prestigiar o princípio da presunção de inocência”,
Fachin cassou a liminar e mandou o político
de volta para a prisão, respaldando-se na “necessidade de se preservar a
estabilidade dos entendimentos fixados em decisões do Supremo.
ALEA JACTA EST!