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sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

MAIS DO MESMO E O SÓSIA DO CAPITÃO CAVERNA




Para quem está de saco cheio das parvoíces bolsonaristas, talvez sirva de consolo imaginar como estaria o Brasil se o bonifrate da autodeclarada alma viva mais honesta do Brasil tivesse derrotado o capitão caverna, e não o contrário. Só que isso não muda o fato de este governo ser uma usina de crises e seu comandante em chefe, PhD em descumprir promessas de campanha e priorizar o que convém a si e a sua prole.

Falando em prole, se você atribui grande parte dos problemas nacionais às estultices dos "príncipes herdeiros", prepare-se: Jair Renan Bolsonaro, de 21 anos, foi eleito para a direção nacional do novo partido do presidente — será membro com direito a voto. Bolsokid, como se apresenta o zero quatro, estuda análise de sistemas em Brasília, joga videogame, especialmente o League of Legends, frequenta festas badaladas e alimenta suas redes sociais, embora não com a mesma voracidade dos irmãos mais velhos. Com o pai, Renan compareceu a alguns eventos, como a reunião do Mercosul na Argentina, em julho, quando foi apresentado como “embaixador mirim”. É mole?

Mas não é só. Paulo Guedes parece ter absorvido por osmose (ou simbiose?) alguns traços da personalidade do chefe. É público e notório que ministro da área econômica não deve opinar sobre câmbio e taxa básica de juros, mas o Posto Ipiranga quebrou a regra, numa entrevista em Washington, ao dizer que "é bom se acostumar com câmbio mais alto e juro mais baixo por um bom tempo”. Isso bastou para a moeda brasileira encolheu quase 2%, passando a seu maior valor nominal desde 1994.

A fala de Guedes foi imprudente, mas não despropositada, pois passou o recado de que quem esperava encontrar câmbio mais favorável na temporada de férias de final de ano tirar o cavalo da chuva. Felizmente, basta ir a Brasília para ver o Pateta, sem mencionar que sai bem mais barato do que ir à Disney.

O plano é manter o dólar mais caro e a Selic mais baixa para estimular investimentos e dar fôlego às indústrias exportadoras, o que, espera-se, refletirá positivamente no PIB e propiciará um crescimento mais sustentável da Economia — às favas com o desejo da classe média de fazer compras em Miami e as necessidades do setor produtivo, que precisa ganhar competitividade para impulsionar as exportações com um câmbio mais favorável. Mas a debandada de investidores estrangeiros nos últimos meses transformou a volatilidade cambial em uma preocupação constante. Tanto é que na terça-feira 26 o BC despejou US$2 bilhões no mercado à vista de câmbio em menos de seis horas (foi a maior intervenção desde fevereiro de 2009 — quando se vivia o auge da crise econômica global — que, contrariando as mentiras de Lula, foi bem mais que uma simples "marolinha").

Enquanto isso, o Pato Donald acusa (injustamente) o Brasil e a Argentina de desvalorizarem suas moedas e promete taxar as importações de aço e alumínio dos dois países. Isso mostra que a "relação especial" que o Pateta diz ter com Donald não passa de mais uma aleivosia. Aliás, alguém deveria informar ao capitão que países não têm amigos, têm interesses, sendo ingenuidade, portanto, achar que o Brasil obterá alguma deferência especial porque seu presidente é baba-ovo do colega norte-americano.

Para Josias de Souza, a ameaça de Trump foi uma paulada, mas Bolsonaro reagiu com inusitado respeito e inesperada compostura: "Não vejo isso como retaliação", disse o presidente, ainda sob efeito da pancada. Se Bolsonaro reagisse como Bolsonaro, diz Josias de Souza, ele esfregaria na cara do inquilino da Casa Branca a expressão preferida do próprio: "Isso é fake News, tá ok?". Em se tratando do mito, porém, a ficha demora a cair: "Se for o caso, falo com o Trump, tenho um canal aberto com ele."

Bolsonaro ainda não se deu conta de que sua relação especial com a Casa Branca foi uma espécie de conto do vigário que o levou a entregar a Trump a base espacial de Alcântara, a liberação da catraca do Brasil para turistas americanos, a importação de uma cota extra de etanol americano e até amor verdadeiro, e, em troca, só recebeu pauladas. Dizer que o Brasil quis derrubar a cotação do real de propósito para se tornar mais competitivo no agronegócio, prejudicando os produtores americanos, é bullshit de um Trump que tenta adular o eleitorado interno às vésperas de disputar uma reeleição difícil. Goofy já disse que ama Donald Duck, mas diplomacia não é coisa para amadores nem para amantes. Em condições normais, a relação pessoal dos dois deveria ser regulada pela Lei Maria da Penha, mas, na briga dos Estados Unidos com o Brasil, quem apanha é o interesse tupiniquim.

Agora o cúmulo dos cúmulos deste governo desajustado: O debate sobre a volta da prisão em segunda instância transformou nosso indômito presidente no segundo desaparecido político do regime bolsonarista. O primeiro foi o Fabrício Queiroz, o "faz-tudo" da família Bolsonaro.

Quando Fernando Bezerra, líder do governo no Senado, articula a coleta de assinaturas para retardar a votação do projeto sobre prisão prisão em segunda instância, diz Josias de Souza, a plateia fica autorizada a suspeitar que há um sósia de Bolsonaro no Palácio do Planalto.

O silêncio do presidente é estridente. O Bolsonaro legítimo, todos sabem, elegeu-se enrolado na bandeira da moralidade. Eleito, esse Bolsonaro inflexível com os maus costumes nomeou para o posto de ministro da Justiça Sergio Moro, um personagem que o presidente enxergava como símbolo nacional do combate à corrupção. De repente, o sósia do Planalto suja com o seu silêncio a imagem daquele Bolsonaro da campanha eleitoral.

Alguém se fazendo passar por Bolsonaro decerto nomeou Fernando Bezerra para o posto de líder. Trata-se, como também se sabe, de um ex-apoiador de Lula, ex-ministro de Dilma, cliente de caderneta da Lava-Jato. Agora, Bezerra se associa ao PT na articulação para retardar a volta da prisão na segunda instância.

Com o nó no pescoço, o líder do governo tenta afrouxar a corda. O pior é que ele é o único a fugir do nó. Há na Esplanada ministros investigados e denunciados. Há até um ministro condenado por improbidade. Há na casa de Bolsonaro um filho, Flávio, sob suspeita de peculato e lavagem de dinheiro. O Bolsonaro legítimo jamais silenciaria diante de um quadro assim.

Alguém precisa organizar uma incursão nos porões do Alvorada. O Bolsonaro genuíno, o autêntico, deve estar aprisionado em algum recanto sombrio do palácio residencial

Que Deus nos ajude.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

FILHOS? MELHOR NÃO TÊ-LOS — OU: FILHO DE LULA, LULINHA É!


FILHOS? MELHOR NÃO TÊ-LOS. MAS SE NÃO OS TEMOS, COMO SABÊ-LO?

A frase acima abre o POEMA ENJOADINHO, de Vinicius de Moraes, (que você pode apreciar clicando aqui). Mas nem tudo é poesia na política nem flores no jardins do Palácio do Planalto.

Três dos cinco filhos de Jair Bolsonaro têm mandato. Zero um é senador, zero dois, vereador e zero três, deputado federal, mas ficam sob as asas do presidente como pintinhos de uma galinha, e são tão barulhentos quanto. E zero quatro — ou Bolsokid, como Jair Renan se apresenta — deve se juntar aos irmãos em breve. Que Deus nos ajude.

Flávio Bolsonaro está tão afundado no caso Queiroz quanto os destroços do Titanic na costa de Newfoundland, no Canadá. As investigações foram suspensas por uma estapafúrdia liminar do togado supremo que preside os demais togados, mas o plenário fechou esse guarda-chuva ao deliberar pela constitucionalidade de troca de dados entre o UIF (antigo Coaf) e a Receita Federal com o Ministério Público sem prévia autorização judicial. 

Semanas atrás, o primogênito do capitão-super-herói da luta contra a corrupção votou a favor do aumento do fundo eleitoral de R$ 1,7 para R$ 3,8 bilhões. Cuspiu na cara dos 4 milhões de brasileiros que o elegeram senador. "Foi por engano, e agora não dá para voltar atrás”, justificou-se o senador distraído. Pode uma coisa dessas? Ele acha que sim. Mas isso demonstra que, além de compactuar com as gangues partidárias do Congresso, o sujeito ainda nos tem na conta de burros.

Observação: Pressionados pelo governo, líderes do Congresso já admitem reduzir a verba para R$ 2,5 bilhões. Em reunião nesta terça-feira, 10, para fechar acordo sobre votações no Legislativo até o fim do ano, os parlamentares ouviram que o novo valor não enfrentaria resistência por parte de Jair Bolsonaro.

Mudando o foco para Fabio Luiz Lula da Silva, o Lulinha, (que, por sinal, detesta o apelido), e os sócios dele, Fernando Bittar, Kalil Bittar e Jonas Suassuna (tutti buona gente), que são alvos da 69ª fase da Lava-Jato. Há anos que se tem conhecimento de que a ascensão profissional/patrimonial do "Ronaldinho dos Negócios" é, no mínimo, suspeita. Até o criminoso de Garanhuns ser eleito presidente, seu primogênito trabalhava como catador de bosta de elefante no zoo de São Paulo. Com o papai no Planalto, esse gênio das finanças abriu uma firmeca de tecnologia chamada Gamecorp, travestiu-se de empreendedor bem sucedido e amealhou um patrimônio considerável.

O menino-prodígio mora num apartamento registrado em nome de Jonas Suassuna — o mesmo que figura como um dos donos do folclórico Sítio Santa Bárbara, em Atibaia. Nunca houve contrato formal assinado entre eles, apenas o repasse de umas poucas mensalidades de R$ 15 mil, que, segundo os investigadores, “não contemplavam todos os meses do período de maio de 2014 fevereiro de 2016, assim como eram em valor inferior à estimativa realizada pelo fisco federal para valor do aluguel do imóvel” (que em 2016, foi estimado em R$ 40 mil mensais).

Impulsionado pelo grupo telefônico Oi/Telemar, cuja fusão com a Brasil Telecom foi azeitada graças à benevolência do governo durante o reinado de Lula, o filho do pai se tornou um próspero empresário. Segundo a força-tarefa de Curitiba, a boa vontade de Brasília resultou em repasses injustificados da telefônica para a firma de Lulinha que somaram R$ 132 milhões entre 2004 e 2016. Por uma dessas doces coincidências, dois dos sócios do Bill Gates tupiniquimBittar e Suassuna— se juntaram para comprar o sítio em Atibaia que era desfrutado pelo ex-presidente lalau. Foi nesse sítio que a Odebrecht e a OAS despejaram verbas roubadas da Petrobras para financiar os confortos do petralha — e que rendeu uma pena de mais de 17 anos na recente sentença condenatória de segunda instância.

Lula, o pai, foi libertado após amargar um ano e sete meses de cana. Só continua livre porque o Supremo derrubou por 6 votos a 5 a regra que permitia a prisão de condenados em segunda instância. O sucesso da Lava-Jato era atribuído a três novidades: 1) A corrupção passara a dar cadeia; 2) O medo da prisão potencializara as delações; 3) As colaborações judiciais impulsionaram as descobertas. Esse círculo virtuoso foi interrompido pela suprema banda-podre. Assim, é improvável que Lulinha passe na cadeia temporada semelhante à que foi imposta ao pai. Não por falta de material, mas porque a Lava-Jato, agora aleijada, arrasta-se pela conjuntura sem meter medo. O supremo retrocesso reintroduziu no processo penal brasileiro dois vocábulos nefastos: prescrição e impunidade.

Para assistir a um vídeo onde o assunto é abordado forma bem-humorada, clique aqui.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

SOBRE O PL DA PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA NA CCJ DO SENADO E AS REVELAÇÃO DA ÚLTIMA PESQUISA DATAFOLHA




A CCJ do Senado aprovou ontem o Projeto de Lei da prisão em segunda instância. Rogério Carvalho, do PT de Sergipe, foi o único dos 23 senadores a votar contra a proposta — veja aqui como cada parlamentar votou. Como se trata de um substitutivo, a proposta ainda terá de passar por nova votação na Comissão. Simone Tebet, presidente do colegiado, pautou o turno complementa para as 11 horas de hoje.

Por ter caráter terminativo, o projeto, se aprovado nos dois turnos, seguirá direto para a Câmara — ou seja, se não houver apresentação de novas emendas até a próxima sessão, nem será preciso que ele passe passar por nova votação na CCJ. No entanto, segundo O Antagonista, senadores do PT estão tentando reunir 9 assinaturas para apresentar um recurso que exigiria a análise do texto no plenário, o que atrasaria ainda mais a análise do projeto (para mais detalhes, clique aqui).

O Brasil assiste há seis anos uma corrida entre as oligarquias corruptas e o aparato repressor. A Lava-Jato, por surpreendente e inusitada, largou na frente. Mas o esforço anticorrupção foi perdendo terreno. Nesse instante, a banda podre assumiu a dianteira. E as ruas ainda não conseguiram esboçar uma reação à altura do retrocesso. Num contexto assim, manifestações como as que ocorreram neste domingo são úteis, mas insuficientes para deter o retrocesso. (veja comentário abaixo).


Mudando de pato para ganso: Segundo Josias de Souza, a última pesquisa Datafolha expõe alguns paradoxos. Na comparação com a pesquisa realizada em agosto, o índice de aprovação da forma como o governo lida com a corrupção caiu de 34% para 29%. Mas a gestão de Sergio Moro é aprovada por 53% dos brasileiros. Isso ocorre porque a sujeira ao redor — do rolo do primogênito Flávio Bolsonaro ao laranjal do ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio — essa sujeira não grudou na imagem que o hoje ministro construiu como juiz da Lava-Jato.

Em movimento inverso, subiu de 20% para 25% a taxa de aprovação do modo como o governo gerencia a Economia. A despeito disso, a aprovação de Paulo Guedes, de 39%, é inferior à de Damares, aprovada por 43% dos brasileiros. É preciso levar em conta, porém, que o índice da ministra-pastora é anabolizado pela religião, pois a pesquisa revela que o grosso de sua popularidade vem dos evangélicos pentecostais. De resto, 39% de aprovação para um ministro da Economia, associado a cortes e arrochos, não chega a ser uma má avaliação.

Atribui-se ao aroma de crescimento que começou a exalar do PIB o estancamento da sangria na aprovação de Bolsonaro, que não só parou de cair, mas subiu de 29% para 30%. Se a pesquisa serve para alguma coisa é para mostrar ao capitão que ele deveria administrar melhor a língua, colocar as encrencas em pratos limpos e se concentrar na Economia. A prosperidade do país depende da Economia. A popularidade do presidente também. Não fica bem a um candidato à reeleição ostentar uma aprovação de sub-Damares.

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

SÉRGIO MORO, PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA E OUTRAS QUESTÕES



Não sei se Sérgio Moro está arrependido de abrir mão de vinte e tantos anos de carreira na magistratura para assumir o ministério da Justiça com a promessa de ser indicado para a primeira vaga que se abrir no STF, ou se realmente pretende aproveitar sua enorme popularidade para disputar presidência (ou outro cargo eletivo qualquer) em 2022. Mas salta aos olhos que ele está cada vez menos "juiz" e mais "político".

Em vez de criticar os parlamentares que desidrataram seu pacote anticrime e anticorrupção, Moro prosseguiu em seu périplo pelo Congresso, buscando apoio para reincluir, no Senado, a prisão em segunda instância via alteração do Código de Processo Penal, que tem tramitação mais célere que a de uma PEC e pode ser terminativo na própria CCJ — a não ser que oito ou mais senadores peçam expressamente, o assunto não precisa ir a plenário.

Nada impede que o tema seja tratado das duas maneiras, sem que o projeto de lei do Senado prejudique a emenda constitucional da Câmara. A presidente da CCJ, senadora Simone Tebetpautou a votação para hoje, e um documento assinado por 43 senadores, pedindo que o assunto siga adiante sem esperar a decisão da Câmara, nos leva a supor que a aprovação ocorra sem maiores problemas.

Também foram de caráter eminentemente político a declaração do ex-juiz sobre sua intenção de não disputar a presidência em 2022 (segundo ele, o lugar é do general Mourão) e sua fala sobre a tragédia na favela de Paraisópolis (ou comunidade, como prefere a patrulha do politicamente correto), na qual ele favoreceu Bolsonaro, mas criou arestas com o governador João Doria (que lhe havia oferecido guarida quando sua relação com o instável e imprevisível capitão caverna parecia ter desandado).

Para encerrar, mais uma pergunta que não quer calar: Será que Bolsonaro recruta seus ministros e funcionários e membros do primeiro escalão em algum manicômio? A pastora Damares Alves levanta esta suspeita — aliás, por que cargas d'água precisamos de um Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos? Outro exemplo é o ministério da Educação, originalmente comandado pelo luminar Ricardo Vélez Rodríguez, posteriormente substituído por Abraham Weintraub, outro portento que só caiu porque a imprensa pediu sua cabeça e o presidente, por enquanto, não lhe quis dar esse gostinho.

Outros caso digno de nota: Sérgio de Camargo, nomeado para a Fundação Palmares, teve a posse suspensa pela Justiça por defender a extinção do movimento negro e afirmar que a escravidão foi terrível, mas benéfica para os descendentes, já que negros viveriam em condições melhores no Brasil do que na África. Ele defendeu também o fim do feriado do Dia da Consciência Negra, que, em sua opinião, foi instituído para o “preto babaca” que é um “idiota útil a serviço da pauta ideológica progressista”. Segundo Camargo, há no Brasil um racismo “Nutella”, enquanto nos Estados Unidos o racismo seria “real”. “A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”, disse.

Embora fuja ao escopo desta postagem, cito ainda o curioso caso do procurador do Ministério Público Estadual do Pará Ricardo Albuquerque, que causou polêmica ao dizer, numa palestra a alunos de direito de uma universidade privada que “a escravidão só existiu no Brasil porque os índios não gostavam de trabalhar" (e foi afastado do cargo no último dia 5). Classifico esse episódio de "curioso" porque era justamente isso que os professores ensinavam nos anos 1960. Vai ver que a patrulha do politicamente correto reescreveu esse capítulo da nossa história e eu não fiquei sabendo...

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

COM JEITO VAI



A maior demonstração de que os vícios da velha política permanecem intactos num Congresso que se orgulha de ser “reformista” é a decisão de cortar verbas de impacto social, como para educação e saneamento, a fim de mais que dobrar o fundo eleitoral para a campanha das eleições municipais do ano que vem. 

Transformar o financiamento público de campanhas eleitorais em pretexto para reduzir os gastos sociais no orçamento federal é o típico comportamento de políticos que vivem numa redoma, descolados da sociedade que representam. A esquerda alega que criticar o valor gasto em eleições é criminalizar a política. A direita trabalha para a volta do financiamento privado. Todos se vêm como servidores públicos injustiçados pelas críticas, e gostariam que mais que dobrar a verba para suas campanhas eleitorais fosse visto pela sociedade como um investimento na democracia.

O aumento sugerido, de R$ 1,7 bilhão na eleição de 2018 para R$ 3,8 bilhões agora, foi um pedido de nada menos que 13 partidos (PT, PSDB, MDB, PSL, PSD, Solidariedade, DEM, Republicanos, PSB, PDT, PTB, PP e PL). O argumento inicial era de que as eleições municipais são mais amplas, e exigiriam mais dinheiro que uma eleição presidencial, de deputados federais e estaduais e senadores. Não satisfeitos, os políticos encontraram um jeito de mais que dobrar o fundo e, para tal aberração, foram buscar em áreas do orçamento o dinheiro que lhes faltava. 

O aumento, já aprovado em comissão, ainda tem de ser votado no plenário em reunião conjunta do Congresso. Se confirmado, as duas maiores bancadas, PT e PSL, juntas, terão quase R$ 800 milhões do fundo eleitoral, cerca de 20% do total para distribuir aos seus candidatos a prefeito e vereador.

Resumo da ópera: Para coibir a roubalheira privada, aumenta-se o saque ao orçamento público, como se não prejudicasse o país da mesma maneira. Especialmente num momento em que se pede sacrifícios à população. Teremos, ao final, mais uma crise, pois o líder do governo, Fernando Bezerra, garantiu que o Bolsonaro vetará qualquer aumento acima de R$ 2,5 bilhões.

Mudando de pato para ganso, há no ar uma forte impressão de que existem semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa, há nove anos, e a atmosfera que se forma agora em torno das propostas de autorização de prisão dos condenados em segundo grau de Justiça, seja em lei ordinária, como se quer no Senado, seja na Constituição, conforme sugestão originária da Câmara.

A voz, ou melhor, a grita corrente, denuncia como manobra protelatória o acordo ainda não escrito entre os presidentes da Câmara e do Senado em prol da concentração de esforços na proposta de emenda constitucional cujo teor, em miúdos, dá à segunda instância o caráter de trânsito em julgado, podendo o réu recorrer de aspectos formais do processo, mas já sem direito pleno à liberdade dado o esgotamento do exame das razões de autoria e materialidade do crime.

O deputado Rodrigo Maia e o senador Davi Alcolumbre estariam, por essa versão, mancomunados com a ala dita garantista do Supremo para fazer a proposta morrer de inanição. Isso porque a ideia defendida por senadores de alterar a legislação ordinária mediante mudanças no CPP seria mais fácil e rapidamente aprovada. Uma emenda constitucional precisa ser votada em dois turnos nas duas Casas e ainda contar com quórum qualificado de 308 deputados e 49 senadores para ser aprovada.

Ocorre que o mais fácil e rápido não necessariamente é o mais seguro. Um projeto de lei aprovado a toque de caixa poderia de novo esbarrar na cláusula pétrea sobre a presunção de inocência e ser derrubado no STF. Não poderia acontecer o mesmo com a emenda constitucional? Poderia, mas, a depender do encaminhamento da coisa, fica mais difícil.

A começar pela consistência de um procedimento resultante de entendimento entre Câmara e Senado. Por mais que admitamos a hipótese de os presidentes das Casas não morrerem de amores pelo assunto, como de resto deixaram bem claro quando o presidente do Supremo jogou a bola para o Congresso, há o peso do conjunto de deputados e senadores, cujos humores são tocados pela opinião pública em casos rumorosos como esse.

E, aqui, chegamos ao ponto inicial da nossa conversa sobre as semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa e a atmosfera em torno da prisão depois do julgamento em segunda instância. Vejam que Maia e Alcolumbre não puderam deixar o assunto de lado. Foram obrigados a tocar o barco. Da mesma forma como os grandes partidos (PT, MDB e PSDB) da época, que em 2009 se viram forçados a abandonar a proposital indiferença à Ficha-Limpa.

A proposta de iniciativa popular com mais de 1,6 milhão de assinaturas (o triplo do exigido para a criação de partidos) simplesmente dormia em comissão na Câmara sob a vista grossa de suas excelências de governo e oposição. A maioria não queria saber do assunto, e tudo sugeria que não iria adiante até que entrou em cena a opinião do público, incensada por uma ampla campanha de entidades civis, já sob o clima do escândalo do mensalão, cuja denúncia da PGR havia sido aceita em 2007 pelo Supremo (o julgamento seria concluído cinco anos depois).
  
Diante da pressão e com eleições marcadas para o ano seguinte, os parlamentares não tiveram escolha a não ser aderir e aprovar a inelegibilidade de candidatos condenados em segunda instância. Em maio de 2010 a lei foi aprovada na Câmara e no Senado. Tramitação rápida, mas muito mais simples do que a discutida agora por se tratar de questão eleitoral. No entanto, os principais pontos de semelhança — pressão popular, crescente apoio no Congresso e proximidade de eleições — sustentam a impressão de que a autorização de prisão depois da segunda instância é um rio que corre para o mar, não tem volta.

Isso, bem entendido, se houver mobilização da sociedade, debate aprofundado em audiências públicas no Parlamento, boa costura política e consistente fundamento jurídico, a fim de que não se agrida a cláusula pétrea da presunção de inocência e todo o esforço desande sob o crivo do STF, que obviamente será chamado a dar a última palavra quando, e se, a proposta passar no Congresso.

A pressa, nesse caso, pode funcionar como nefasta amiga da imperfeição. Também não seria aceitável a morosidade excessiva, típica das intenções protelatórias, porque o clamor está posto e não deixa margem a dúvida. Cabe às instituições encontrar o melhor jeito de adequar a demanda aos rigores da legalidade.

Sobre as manifestações populares a favor da volta da prisão em segunda instância:



Com Merval Pereira e Dora Kramer

domingo, 8 de dezembro de 2019

BOLSONARO E A REELEIÇÃO



Jair Bolsonaro, por um fenômeno até agora não esclarecido pelos nossos esclarecedores de questões nacionais, foi o único político de primeira grandeza no Brasil a entender que, para a maioria dos brasileiros, a polícia é uma coisa boa e bandido é uma coisa ruim. Noves fora os rematados idiotas de sempre, todo mundo sabe que policiais erram, que podem tratar mal o público e não investigar nem reprimir como deveriam os crimes cometidos, além de eles próprios cometerem uma série intolerável de atos criminosos. Mas também é sabido que não existe um único caso de bandido que esteja a favor do cidadão — e que qualquer policial, no fim das contas, é melhor que qualquer criminoso. Daí a “oposição”, parte da mídia, “movimentos sociais” e "defensores dos direitos humanos" tomarem partido contra as forças da ordem e a favor das forças do crime. E se mostrarem indignados, depois, quando a população prefere o capitão caverna a assassinos, ladrões e estupradores.

Segundo J.R. Guzzo, a grande questão da política brasileira, hoje, é a perspectiva real de Bolsonaro ficar no seu cargo não só pelos três anos de mandato a que ainda tem direito por conta da eleição de 2018, mas até 31 de dezembro de 2026. E não adianta fazer de conta que não é isso. É precisamente isso. Fala-se de tudo — da descomunal importância do presidente da Câmara para o futuro do Brasil e do Sistema Solar, do que se passa a cada minuto do dia na cabeça do presidente do Senado, dos entreveros de Bolsonaro com o sistema de pontos nas multas de trânsito. Discutem-se novos partidos, velhos partidos, centrão, centrinho, os filhos do presidente e o futuro de Lula: o que mais o STF pode fazer por ele?

Há, todos os dias, a crise da manhã, a crise da tarde e a crise da noite, com ameaça real, direta e imediata à sobrevivência do governo. Há de tudo — menos a discussão aberta da única coisa que de fato interessa: até quando Bolsonaro vai ficar? O resto é o resto.

Não se trata de um “Quiz” de adivinhação. Se o presidente ficar ”X” tempo, a sociedade brasileira terá uma cara; se ficar “X” + “Y”, terá outra. Não é mudança de governo. É mudança de vida. Daqui a três anos, se as coisas continuarem a andar do jeito que estão andando, o Brasil será um país tão diferente do que é hoje, mas tão diferente, que praticamente nada do que se discute no momento terá qualquer significado prático para o dia a dia dos brasileiros.

Se a história for ainda além, e Bolsonaro receber um segundo mandato — bom, aí estaremos entrando em território absolutamente virgem. É uma perspectiva que assusta até o fundo da alma toda a ordem política, econômica e social que manda hoje no Brasil, como tem mandado há décadas, ou mais do que isso. Assusta porque traz o insustentável peso da mudança para os que não querem que nada mude — ou que só mude aquilo que lhes interessa mudar. Mudam o sistema psicológico, a “ideologia”, os hábitos intelectuais, os valores, os usos e costumes.

Quem está contente com o Brasil como ele foi até hoje não pode estar contente com o Brasil desconhecido que talvez esteja vindo aí pela frente. Qual poderia ser ele? É uma perda de tempo, como se sabe, ficar preocupado em excesso com o futuro, porque ele virá de qualquer maneira. O que dá para fazer é uma lista de realidades — e ir checando, uma por uma, se elas estão mudando para melhor ou para pior. A economia, por exemplo. Pelos fatos que podem ser vistos hoje — e não pelos sentimentos que você tem a respeito deles — a situação tende a melhorar ou piorar?

O país, no futuro próximo, vai ter um outro STF e uma outra Justiça. A máquina pública deixará de crescer como cresceu nos últimos 50 anos. O Brasil, forçosamente, vai estar mais integrado às cadeias mundiais de produção. O “investimento público” deixará de ter o tratamento sagrado que tem hoje. Não haverá novas empresas estatais. As pressões da maioria sobre os donos da vida pública vão aumentar — entre outras coisas, não há nenhuma hipótese de que as redes sociais se tornem menores e mais silenciosas do que são hoje.

Todas essas coisas somadas, e uma infinidade de outras, são positivas ou não? Faça suas contas. O fato é que ninguém pode esperar uma vida melhor se não houver mudança nenhuma no lugar onde ela se tornou ruim.

Com J.R. Guzzo

sábado, 7 de dezembro de 2019

E DÁ-LHE ÓLEO DE PEROBA




A vida passa, o tempo voa, os governos mudam de Lula para Bolsonaro e o Brasil continua sem saber quem são os seus inimigos reais — aqueles que funcionam como um exército de ocupação, extorquem o seu dinheiro pelas mais diversas formas que o ser humano pode imaginar e impõem, no fim das contas, uma tirania não declarada sobre toda a população do país. Ou melhor: sabe-se muito bem quem são eles, até porque estão dia e noite em todas as plataformas da mídia. Mas não há mais ânimo nem meios nem força para combatê-los. 

O resultado é que fica todo mundo procurando saber o que há “de errado com esse país”, e o mais errado de tudo está na cara de todo mundo: a casta de parasitas que ocupa regiões inteiras do funcionalismo público nacional.

Concentram renda. Consomem recursos que pertencem a todos. Emperram o funcionamento da máquina que devia servir a população. Obrigam pessoas e empresas a obedecer regras que não existem na lei — são legisladores, executivos e juízes ao mesmo tempo. Levam o país a dispender três vezes mais esforço, trabalho e energia para avançar cada decimal de ponto no crescimento do PIB.

Grande parte da atividade realizada hoje pelo poder público brasileiro, talvez a maior parte, consiste na tarefa, jamais terminada, de atender essa gente — nomear, pagar, dar aumentos, apaziguar, fazer com que se reproduzam. Sua modalidade mais degenerada, provavelmente, são os cargos chamados DAS, uma manada que tem entre 20.000 e 25.000 pessoas só no governo federal. Ninguém, nem com os programas de computador mais irados, sabe ao certo quantos são. Consomem quantidades desconhecidas de dinheiro do erário em salários e benefícios — acima de R$ 1 bilhão por ano, certamente, mas podem estar custando muito mais que isso ao contribuinte.

Não têm, ao contrário do que se exige da imensa maioria dos servidores públicos, de prestar concurso ou demonstrar qualquer competência para ocupar os seus cargos. Eles são de “livre nomeação” do Poder Executivo, que os utiliza como moeda de troca para obter votos e apoio no Congresso.
São apadrinhados de senadores e deputados que chantageiam o governo 365 dias por ano com o mesmo problema: ou vocês nomeiam quem eu estou pedindo, ou então eu viro oposição na hora de votar seja lá o que for.

Isso é só um pedaço da tragédia. Nos níveis estaduais e municipais, a casta dos ocupantes de cargos de “livre provimento” deve andar por volta de 800.000 apaniguados. A despesa com eles, como ocorre com os demais números nessa salada, é incerta – mas tem sido calculada em alguma coisa entre R$ 30 bilhões e R$ 35 bilhões por ano.

Não se pode esquecer, enfim, os premiados com “funções especiais”, presentes também na área federal, e todos os que se beneficiam da usina de produzir trapaças no serviço público que funciona em tempo integral do Oiapoque ao Chuí. Em suma: quer saber por que falta tanta coisa, em termos das necessidades mais elementares para a população? Porque riquezas que são devidas a todos vão direto para a turma do “livre provimento” e dos políticos que a controlam. 

Há ainda muita coisa que poderia ser dita, mas será mais do mesmo. O fato é que está aí, nessa multidão que ocupa o verdadeiro centro nervoso do “debate político” no país, o mais intratável inimigo de toda a sociedade brasileira. Estão discutindo furiosamente, neste exato momento, a “liberação” de mais nomeações, fazendo um “esforço concentrado”, como eles próprios chamam as suas tentativas mais agressivas de aprovar com rapidez alguma coisa — em geral, alguma coisa da qual vão tirar proveito material imediato. Depois vão lhe dizer, nas mesas redondas de especialistas, que o Brasil está diante de graves problemas de “articulação política".

Como se sabe, o Congresso Nacional, uma das nossas “instituições”, roubou dos cidadãos deste país, em plena luz do dia, uma montanha de dinheiro para distribuir entre “os partidos”, com a desculpa velhaca de que precisam de recursos do erário público para pagar as despesas que têm de fazer no exercício da atividade política. É o infame “Fundo Partidário”. Na melhor das hipóteses, iriam meter a mão em 1,7 bilhão de reais. O governo tenta segurar o valor do assalto em 2 bi. Os deputados estão querendo mais de 4, simplesmente o dobro, para o ano que vem.

Não há uma única coisa em toda essa história que seja verdadeira. O dinheiro não vai para os “partidos” — vai, na prática, para as pessoas que mandam neles. É falso que, ao saquear dinheiro público, os políticos estejam evitando a extorsão de dinheiro privado para pagar suas campanhas eleitorais e outros gastos; vão fazer as duas coisas ao mesmo tempo, apenas isso. 

Os recursos do “Fundo Partidário” não se destinam a pagar despesas legítimas (vá lá) da ação política — os parlamentares querem usar esses bilhões para virtualmente tudo, do pagamento de diárias de motel a honorários de advogados criminalistas para defendê-los em seus processos na justiça. Quer saber quem são as pessoas honestas e quem são as desonestas no Congresso brasileiro? É muito fácil. Honesto, de verdade, só há um tipo: o que se recusa a usar a verba do “Fundo”.

É difícil encontrar uma maneira mais estúpida de se tomar decisões do que entregá-las a pessoas que não vão pagar nada se elas derem errado”, diz o pensador americano Thomas Sowell. Perfeito, professor. Eis um retrato maravilhoso de como as coisas funcionam neste país.

Com J.R. Guzzo.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

QUE PAÍS É ESTE?



No apagar das luzes do ano legislativo, a Câmara aprovou por esmagadora maioria o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, menina dos olhos do ex-juiz da Lava-Jato e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública. Lamentavelmente, foram retiradas do texto a Legitima defesa — que propunha a alteração do Código Penal para permitir “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” se o excesso em ações de autoridades públicas decorresse “de escusável medo, surpresa ou violenta emoção” —, a prisão após segunda instância — que dispensa explicações — e o plea bargain — confissão dos suspeitos de terem praticado crimes em troca de uma pena menor, sem necessidade de julgamento.

Como se vê, os efeitos detergentes promovidos pelo eleitorado no ano passado foram insuficientes. Prova disso é que o todo poderoso presidente da Câmara, Rodrigo Maia, citado como Botafogo nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht, que raramente vota, passou a presidência da sessão de ontem da Câmara ao deputado Marcos Pereira para votar a favor de um destaque que institui o juiz de garantias ao processo penal — que, em tese, “fiscaliza” a legalidade da investigação.

O fato é que, desde sempre, vimos dando a Herodes acesso à chave do berçário. Veja, por exemplo, a institucionalização do mensalão pelos punguistas do parlamento, sempre prontos a bater a carteira dos "contribuintes". A despeito de faltar dinheiro para tudo, do papel higiênico nas repartições ao giz nas escolas, passando pela saúde e segurança públicas, os nobilíssimos congressistas aprovaram o relatório preliminar que aumenta para R$ 3,8 bilhões o fundo eleitoral em 2020.

Para inflar os recursos das campanhas municipais, o Congresso prevê cortes em saúde, educação e infraestrutura. O Executivo desejava destinar R$ 2 bilhões para custear as disputas locais, mas presidentes e líderes de partidos que representam a maioria dos deputados e senadores articularam a elevação do valor do fundo em R$ 1,8 bilhão. O novo montante irá ainda à votação do relatório final na Comissão Mista do Orçamento, após o que o plenário do Congresso analisará a proposta em sessão prevista para o dia 17 de dezembro. Se mantido esse valor, o fundo será mais que o dobro em relação a 2018, quando foram distribuídos R$ 1,7 bilhão aos candidatos. O dinheiro sai do caixa da União (ou seja, do nosso bolso, pois o governo não gera recursos, apenas os administra).


"Nas democracias, as eleições precisam ser financiadas, e o financiamento privado está vedado. É preciso construir no financiamento público, mas tem de se verificar o valor e de onde virá o recurso para que a sociedade compreenda com o mínimo de desgaste possível para o Congresso", disse Botafogo. Se o Congresso não recuar, Jair Bolsonaro dificilmente vetará esse trecho do projeto, pois ele foi escrito (marotamente) de tal forma que seria preciso barrar todos os recursos para o financiamento das campanhas em vez de um veto parcial. E viva o povo brasileiro!

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Do jeito que as coisas vão, ainda vamos acabar com um problemão. É o que acontece quando a ciência dos “especialistas” diz uma coisa, e a vida real diz outra — no caso, como se ouve há onze meses, “o extremismo neoliberal” do governo em geral e do ministro Paulo Guedes em especial está “destruindo os sonhos” da população e arruinando a economia brasileira, provavelmente para sempre.

Só que está dando o contrário a cada vez que um dado oficial do desempenho da atividade econômica é divulgado: o que tinha de ser ruim, quando a gente vai ver, é bom. Acabou de acontecer com o resultado do PIB, que cresceu 0,6% no terceiro trimestre deste ano, o maior avanço desde o primeiro trimestre do ano passado. Para piorar, o desemprego também está caindo.

A solução para os “especialistas” é dizer que os números foram “uma surpresa”, ou “atípicos”, ou alguma bobagem desse tipo. Ou seja: nós estávamos certos, mas a realidade está errada. Outra saída é dizer que os níveis e crescimento “tendem a não se sustentar”. É muito usado também, no caso da queda do desemprego, dizer que está aumentando o “trabalho informal”, como se ganhar a vida por conta própria não fosse trabalhar.

Em relação às vendas de Natal, que estão com cara de bombar, a desculpa é que o “Natal é temporário”. Enfim, todo e qualquer avanço é condenado como “lento demais” — sem que ninguém consiga dizer em que outro lugar do mundo o ritmo de crescimento está na velocidade desejada pelos analistas.

Quer perder o seu tempo? Continue lendo e ouvindo quem lhe diz que essa “situação aí” está muito difícil.

Alguém precisa avisar a uma parte dos nossos comunicadores sociais que houve uma eleição para presidente da República um ano atrás, que um dos lados presentes no turno final ganhou, e que, em consequência desse fato, adquiriu o direito de fazer nomeações para cargos da administração federal que não exijam aprovação dos demais poderes, passagem por concurso público e outras exigências legais.

Ministros, por exemplo, mandarins do segundo escalão e mais uma infinidade de cargos da máquina estatal, podem ser escolhidos pelos vencedores das eleições segundo os critérios que acharem mais acertados — mesmo porque é isso, justamente, que os eleitores esperam que seja feito pelo candidato em que votaram. Nenhum desses fatos, porém, parece estar claro até agora para uma porção de gente boa nesse país.

Temos assim, a cada vez que alguém é nomeado para alguma função no bonde da União, um coro escandalizado de protestos – fulano de tal, escolhido para o cargo tal, “é de direita”. Ah, não diga — e daí? Esperavam o que? Que fosse de esquerda? Um não serve porque é contra as drogas e não gosta de rock. Outro, porque acha que a proclamação da República foi um golpe militar, ou é contra o aborto, o feriado da “Consciência Negra", o aumento das reservas indígenas, ou acha que a agricultura precisa de fertilizantes e defensivos químicos para produzir alguma coisa.

Mas são pessoas assim, e não o seu contrário, que a maioria dos eleitores quer ver no governo. Essa maioria pensa como elas. Imagina que estão corretas. Acha que deveriam ter sido nomeadas exatamente pelas razões que seus críticos invocam para dizer que não deveriam. Ou é isso, ou então vai ser preciso chamar aquela menina sueca para o Ministério do Ambiente.

Com J.R. Guzzo.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

TEMPOS ESTRANHOS




TEMPOS ESTRANHOS SÃO ESSES EM QUE VIVEMOS, QUANDO VELHOS E JOVENS SÃO ENSINADOS NA ESCOLA DA FALSIDADE. E O ÚNICO HOMEM QUE SE ATREVE A DIZER A VERDADE É CHAMADO DE UMA SÓ VEZ UM LOUCO E INSENSATO.”

O epigrama acima, atribuído a Platão, tem servido de inspiração para o vice-decano do STF demonstrar sua insatisfação com tudo e todos, mostrando-se, inclusive, irritado com uma advogada que, durante sustentação oral, dirigiu-se aos supremos togados usando o "desrespeitoso" pronome "vocês" — que na verdade é a forma sincopada de "vossas mercês": "Presidente", disse o primo de Fernando Collor e luminar do saber jurídico, "novamente um advogado se dirige aos integrantes do tribunal como 'vocês'! Há de se observar a liturgia". Faltam apenas 18 meses para a aposentadoria compulsória de sua excelência, que talvez ainda aproveite o tempo que lhe resta para propor a adoção daquelas ridículas perucas brancas, de crina de cavalo, que os juízes do Reino Unido usavam aboliram há mais de 10 anos por achá-las antiquadas e inadequadas ao tempos atuais (estranhos ou não).

Atribui-se a Aristóteles a divisão do Estado em três poderes independentes, e a Montesquieu a tripartição e as devidas atribuições do modelo mais aceito atualmente. A ideia era não deixar em uma única mão as tarefas de legislar, administrar e julgar, já que a concentração de poder tende a gerar abusos, e um poder que se serve em vez de servir é um poder que não serve. No Brasil contemporâneo, no entanto, nem o quarto poder escapa, já que parte da imprensa foi aparelhada pelos petralhas esquerdopatas, que não veem — ou fingem não ver — que o comunismo e o socialismo não produziram bons resultados em nenhum país do mundo, como comprovam a desgraça que se abateu sobre a Pérola do Caribe sob o jugo da Dinastia Castro, a calamidade que tomou conta da Venezuela sob a égide do Maduro que não cai do galho, as diferenças gritantes entre a Coreia do Sul e a do Norte.

Em Hong Kong, a ilha-­problema onde os jovens tomaram as ruas e há meses exigem, em última instância, voz ativa sobre seu destino, a única eleição mais ou menos livre permitida à população resultou em fragorosa — e aparentemente inesperada — derrota de Pequim. No mesmo dia, um consórcio de jornais publicou um relatório devastador sobre os campos de detenção na província de Xinjiang, no noroeste do país, onde 1 milhão de chineses da minoria muçulmana uigur foram internados a pretexto de combater o extremismo religioso. E por aí segue a procissão de exemplos.

Talvez por isso o PT seja o partido dos trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam e do ex-presidente ladrão que se ufanava (quiçá ainda se orgulhe) de ter chegado onde chegou sem jamais ter lido um livro na vida.

Falando em ex-presidentes, dos que foram eleitos pelo voto popular desde a democratização — ou que assumiram o cargo devido a impedimento do titular da vez —, somente Fernando Henrique não foi processado. Collor e Dilma não só foram penabundados do cargo (por corrupção e incompetência, respectivamente) como são réus na Justiça Penal, e ainda continuam soltos graças à morosidade e a leniência do Judiciário. Lula e Temer colecionam processos e já foram presos, mas aguardam em liberdade a tramitação das ações/julgamento dos recursos. É surreal!

No caso de Lula, a coisa é ainda pior. Embora tenha sido condenado em dois processos — por três instâncias no caso do tríplex no Guarujá e por duas no do sítio em Atibaia —, o picareta foi agraciado por uma decisão sob medida da banda podre do STF, que, por 6 votos a 5, restabeleceu o império da impunidade ao proibir que criminosos condenados em segunda instância aguardassem presos o julgamento de seus recursos nas Cortes superiores. Assim, o troçulho de Garanhuns assomou do esgoto a céu aberto em que se transformou o cenário político nacional e brinca de palanque ambulante, com total complacência do TSE, que parece achar natural candidatos a candidatos ao Palácio do Planalto fazerem comícios três anos antes das próximas eleições. Com a bênção do Judiciário, o sacripanta vermelho está liberado para mostrar ao mundo que, no País do Carnaval, um corrupto juramentado pode ofender impunemente autoridades que não têm contas a acertar com a Justiça. Mas não vai escapar da lei da Ficha Limpa. Para o dono da alma viva mais honesta do Brasil, as chances de disputar uma eleição são menores que as de ser canonizado pelo Vaticano.

Tempos estranhos, diz o ministro Marco Aurélio. Bota estranho nisso!

O óbvio ululou na tarde de ontem, quando a montanha suprema pariu o rato da vez, incluindo a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf, e a Receita Federal na tese sobre o compartilhamento de dados fiscais sigilosos, para fins penais, com o Ministério Público e a Polícia Federal, dispensando prévio aval judicial. O único voto dissonante foi o do ministro Marco Aurélio — coberto com a suprema toga pelo então presidente Fernando Collor, seu primo, que foi impichado do Planalto e teve os direitos políticos cassados, mas elegeu-se senador graças ao esclarecidíssimo povo das Alagoas, terra de Renan Calheiros, de Arthur Lira e de muitas gentes boas (ficou estranho, mas rimou).

O apaniguado de Collor sempre teve predileção especial por ser voto vencido e foi a encarnação do “espírito de porco” até a ex-presidanta Dilma nomear desembargadora sua filha Letícia, em mais uma demonstração de como o nepotismo se perpetua. A partir daí, o campeão das causas perdidas abraçou cruzadas que atendem aos interesses petistas e aos de nababos da advocacia de Brasília, que, de olho no filão milionário que os corruptos representam, defendem incondicionalmente a mudança da jurisprudência que autoriza a prisão de condenados em segunda instância.

Enfim, o Supremo precisou de seis sessões para concluir que órgãos de investigação servem para investigar, que a liminar absurda do presidente da Corte era absurda e que tudo fica como antes no Quartel de Abrantes. Daí a morosidade da Justiça tupiniquim, maior responsável pela sensação de impunidade (bom seria se fosse só sensação) que fomenta a corrupção endêmica da classe política neste arremedo de república, onde processos movidos contra acusados que têm cacife para contratar criminalistas estrelados levam décadas para ser concluídos — isso quando a prescrição não frustra a pretensão punitiva do Estado. Mas isso já é outra conversa.

Enquanto isso, Senado e Câmara Federal se mobilizam para agilizar o rito das Casas e aprovar o mais rapidamente possível a prisão após segunda instância, corrigindo o supremo erro crasso que restituiu aos condenados a possibilidade de aguardar soltos a decisão de seus recursos aos tribunais superiores, como foi durante míseros (mas nefastos) sete anos das últimas oito décadas. A Câmara instalou uma comissão que visa tratar do assunto por meio de uma emenda à Constituição; no Senado, Simone Tebet, presidente da CCJ, agendou para a próxima terça-feira a votação de um projeto de lei que modifica o Código de Processo Penal, cuja tramitação é mais simples e rápida de aprovar do que a emenda constitucional que tramita na Câmara. Entretanto, ainda que os senadores o aprovem, é preciso pressão da sociedade para que o projeto não seja engavetado quando chegar à Câmara.

Enquanto isso, na Assembleia Legislativa de São Paulo, cenas de baixaria, com direito a pugilato explicito, chocam (ou divertem, dependendo do ponto de vista) os paulistas e os demais brasileiros. Confira no vídeo:



Antes de encerrar, um texto do impagável J.R. Guzzo sobre as supremas barbaridades que conspurcam este arremedo de banânia:

O planeta Terra seria um lugar perfeitamente insuportável se todo o mundo, sem nenhuma exceção, dissesse sempre a verdade, o tempo todo, para todas as outras pessoas que conhecesse. Já imaginou? É melhor não imaginar. O fato é que esta vida precisa ter os seus momentos de hipocrisia, para funcionar com um mínimo de paz — mas também é fato que as autoridades da nossa vida pública não precisavam exagerar. É a velha história: gente que manda não perde praticamente nenhuma oportunidade de ficar cega para os seus próprios desastres, mas nunca é surda, nem por um minuto, para qualquer erro que possa ser cometido pelos outros.

O hipócrita, felizmente, é um bicho que só morde de verdade quando consegue esconder que está sendo hipócrita — quando a sua hipocrisia fica na cara de todo mundo, como vive acontecendo, o mal que faz não leva a lugar nenhum. É o caso, neste preciso momento, do ministro Dias Toffoli, que acaba de compartilhar com o resto da nação suas preocupações com a má imagem que os investidores estrangeiros fariam do Brasil depois de uma declaração do ministro Paulo Guedes sobre o AI-5. Teria o ministro sugerido a ressurreição do “Ato”, que está morto há 40 anos — quatro vezes mais, aliás, que o tempo durante o qual esteve vivo? Não. Ele disse o seguinte: “Não se assustem se alguém pedir o AI-5”, no caso de haver baderna na rua, em vez de oposição na política.

É livre, obviamente, o julgamento de cada um sobre o que disse Guedes. O que não tem cabimento é imaginar que Toffoli está sendo aquilo que ele finge que é — um cidadão aflito com o futuro do investimento externo no Brasil. Se há alguém nesse País que assusta o investidor, de qualquer nacionalidade, é ele mesmo, em pessoa — junto com os seus parceiros de STF que proibiram a prisão de criminosos condenados em segunda instância. Isso sim é construir a imagem de uma nação sem lei.

Para encerrar: nos tempos de antanho, quando não havia essa absurda patrulha do "politicamente correto" e podia-se contar piadas de papagaio sem o risco de ser processado pela ave, uma anedota dizia que, numa entrevista de emprego, o entrevistador perguntou ao candidato se ele era casado. "Sim", foi a resposta. "Com quem?", perguntou o entrevistador. "Com uma mulher", respondeu o candidato. E o entrevistador, já irritado: "O senhor conhece alguém que seja casado com um homem?". "Sim", respondeu o sujeito. "Quem?", insistiu o entrevistador. "A minha mulher", disse, candidamente, o candidato.

Havendo tempo e jeito, assista ao vídeo a seguir: