A maior demonstração de que os vícios da velha política permanecem intactos num Congresso que se orgulha de ser “reformista” é a decisão de cortar verbas de impacto social, como para educação e saneamento, a fim de mais que dobrar o fundo eleitoral para a campanha das eleições municipais do ano que vem.
Transformar o financiamento público de campanhas eleitorais em pretexto para reduzir os gastos sociais no orçamento federal é o típico comportamento de políticos que vivem numa redoma, descolados da sociedade que representam. A esquerda alega que criticar o valor gasto em eleições é criminalizar a política. A direita trabalha para a volta do financiamento privado. Todos se vêm como servidores públicos injustiçados pelas críticas, e gostariam que mais que dobrar a verba para suas campanhas eleitorais fosse visto pela sociedade como um investimento na democracia.
O aumento sugerido, de R$ 1,7 bilhão na eleição de 2018 para R$ 3,8 bilhões agora, foi um pedido de nada menos que 13 partidos (PT, PSDB, MDB, PSL, PSD, Solidariedade, DEM, Republicanos, PSB, PDT, PTB, PP e PL). O argumento inicial era de que as eleições municipais são mais amplas, e exigiriam mais dinheiro que uma eleição presidencial, de deputados federais e estaduais e senadores. Não satisfeitos, os políticos encontraram um jeito de mais que dobrar o fundo e, para tal aberração, foram buscar em áreas do orçamento o dinheiro que lhes faltava.
O aumento sugerido, de R$ 1,7 bilhão na eleição de 2018 para R$ 3,8 bilhões agora, foi um pedido de nada menos que 13 partidos (PT, PSDB, MDB, PSL, PSD, Solidariedade, DEM, Republicanos, PSB, PDT, PTB, PP e PL). O argumento inicial era de que as eleições municipais são mais amplas, e exigiriam mais dinheiro que uma eleição presidencial, de deputados federais e estaduais e senadores. Não satisfeitos, os políticos encontraram um jeito de mais que dobrar o fundo e, para tal aberração, foram buscar em áreas do orçamento o dinheiro que lhes faltava.
O aumento, já aprovado em comissão, ainda tem de ser votado no plenário em reunião conjunta do Congresso. Se confirmado, as duas maiores bancadas, PT e PSL, juntas, terão quase R$ 800 milhões do fundo eleitoral, cerca de 20% do total para distribuir aos seus candidatos a prefeito e vereador.
Resumo da ópera: Para coibir a roubalheira privada, aumenta-se o saque ao orçamento público, como se não prejudicasse o país da mesma maneira. Especialmente num momento em que se pede sacrifícios à população. Teremos, ao final, mais uma crise, pois o líder do governo, Fernando Bezerra, garantiu que o Bolsonaro vetará qualquer aumento acima de R$ 2,5 bilhões.
Mudando de pato para ganso, há no ar uma forte impressão de que existem semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa, há nove anos, e a atmosfera que se forma agora em torno das propostas de autorização de prisão dos condenados em segundo grau de Justiça, seja em lei ordinária, como se quer no Senado, seja na Constituição, conforme sugestão originária da Câmara.
Resumo da ópera: Para coibir a roubalheira privada, aumenta-se o saque ao orçamento público, como se não prejudicasse o país da mesma maneira. Especialmente num momento em que se pede sacrifícios à população. Teremos, ao final, mais uma crise, pois o líder do governo, Fernando Bezerra, garantiu que o Bolsonaro vetará qualquer aumento acima de R$ 2,5 bilhões.
Mudando de pato para ganso, há no ar uma forte impressão de que existem semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa, há nove anos, e a atmosfera que se forma agora em torno das propostas de autorização de prisão dos condenados em segundo grau de Justiça, seja em lei ordinária, como se quer no Senado, seja na Constituição, conforme sugestão originária da Câmara.
A voz, ou melhor, a grita corrente, denuncia como manobra
protelatória o acordo ainda não escrito entre os presidentes da Câmara e do
Senado em prol da concentração de esforços na proposta de emenda constitucional
cujo teor, em miúdos, dá à segunda instância o caráter de trânsito em julgado,
podendo o réu recorrer de aspectos formais do processo, mas já sem direito
pleno à liberdade dado o esgotamento do exame das razões de autoria e
materialidade do crime.
O deputado Rodrigo
Maia e o senador Davi Alcolumbre
estariam, por essa versão, mancomunados com a ala dita garantista do Supremo
para fazer a proposta morrer de inanição. Isso porque a ideia defendida por
senadores de alterar a legislação ordinária mediante mudanças no CPP seria mais
fácil e rapidamente aprovada. Uma emenda constitucional precisa ser votada em
dois turnos nas duas Casas e ainda contar com quórum qualificado de 308
deputados e 49 senadores para ser aprovada.
Ocorre que o mais fácil e rápido não necessariamente é o
mais seguro. Um projeto de lei aprovado a toque de caixa poderia de novo
esbarrar na cláusula pétrea sobre a presunção de inocência e ser derrubado no STF. Não poderia acontecer o mesmo com
a emenda constitucional? Poderia, mas, a depender do encaminhamento da coisa,
fica mais difícil.
A começar pela consistência de um procedimento resultante de
entendimento entre Câmara e Senado. Por mais que admitamos a hipótese de os
presidentes das Casas não morrerem de amores pelo assunto, como de resto
deixaram bem claro quando o presidente do Supremo jogou a bola para o
Congresso, há o peso do conjunto de deputados e senadores, cujos humores são
tocados pela opinião pública em casos rumorosos como esse.
E, aqui, chegamos ao ponto inicial da nossa conversa sobre
as semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa e a atmosfera em torno da prisão depois do
julgamento em segunda instância. Vejam que Maia
e Alcolumbre não puderam deixar o
assunto de lado. Foram obrigados a tocar o barco. Da mesma forma como os
grandes partidos (PT, MDB e PSDB) da época, que em 2009 se viram forçados a abandonar a proposital
indiferença à Ficha-Limpa.
A proposta de iniciativa popular com mais de 1,6 milhão de
assinaturas (o triplo do exigido para a criação de partidos) simplesmente
dormia em comissão na Câmara sob a vista grossa de suas excelências de governo
e oposição. A maioria não queria saber do assunto, e tudo sugeria que não iria
adiante até que entrou em cena a opinião do público, incensada por uma ampla
campanha de entidades civis, já sob o clima do escândalo do mensalão, cuja
denúncia da PGR havia sido aceita em
2007 pelo Supremo (o julgamento
seria concluído cinco anos depois).
Diante da pressão e com eleições marcadas para o ano
seguinte, os parlamentares não tiveram escolha a não ser aderir e aprovar a
inelegibilidade de candidatos condenados em segunda instância. Em maio de 2010
a lei foi aprovada na Câmara e no Senado. Tramitação rápida, mas muito mais
simples do que a discutida agora por se tratar de questão eleitoral. No
entanto, os principais pontos de semelhança — pressão popular, crescente apoio
no Congresso e proximidade de eleições — sustentam a impressão de que a
autorização de prisão depois da segunda instância é um rio que corre para o
mar, não tem volta.
Isso, bem entendido, se houver mobilização da sociedade,
debate aprofundado em audiências públicas no Parlamento, boa costura política e
consistente fundamento jurídico, a fim de que não se agrida a cláusula pétrea
da presunção de inocência e todo o esforço desande sob o crivo do STF, que obviamente será chamado a dar
a última palavra quando, e se, a proposta passar no Congresso.
A pressa, nesse caso, pode funcionar como nefasta amiga da
imperfeição. Também não seria aceitável a morosidade excessiva, típica das
intenções protelatórias, porque o clamor está posto e não deixa margem a
dúvida. Cabe às instituições encontrar o melhor jeito de adequar a demanda aos
rigores da legalidade.
Sobre as manifestações populares a favor da volta da prisão em segunda instância:
Sobre as manifestações populares a favor da volta da prisão em segunda instância:
Com Merval Pereira e Dora Kramer