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segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

COM JEITO VAI



A maior demonstração de que os vícios da velha política permanecem intactos num Congresso que se orgulha de ser “reformista” é a decisão de cortar verbas de impacto social, como para educação e saneamento, a fim de mais que dobrar o fundo eleitoral para a campanha das eleições municipais do ano que vem. 

Transformar o financiamento público de campanhas eleitorais em pretexto para reduzir os gastos sociais no orçamento federal é o típico comportamento de políticos que vivem numa redoma, descolados da sociedade que representam. A esquerda alega que criticar o valor gasto em eleições é criminalizar a política. A direita trabalha para a volta do financiamento privado. Todos se vêm como servidores públicos injustiçados pelas críticas, e gostariam que mais que dobrar a verba para suas campanhas eleitorais fosse visto pela sociedade como um investimento na democracia.

O aumento sugerido, de R$ 1,7 bilhão na eleição de 2018 para R$ 3,8 bilhões agora, foi um pedido de nada menos que 13 partidos (PT, PSDB, MDB, PSL, PSD, Solidariedade, DEM, Republicanos, PSB, PDT, PTB, PP e PL). O argumento inicial era de que as eleições municipais são mais amplas, e exigiriam mais dinheiro que uma eleição presidencial, de deputados federais e estaduais e senadores. Não satisfeitos, os políticos encontraram um jeito de mais que dobrar o fundo e, para tal aberração, foram buscar em áreas do orçamento o dinheiro que lhes faltava. 

O aumento, já aprovado em comissão, ainda tem de ser votado no plenário em reunião conjunta do Congresso. Se confirmado, as duas maiores bancadas, PT e PSL, juntas, terão quase R$ 800 milhões do fundo eleitoral, cerca de 20% do total para distribuir aos seus candidatos a prefeito e vereador.

Resumo da ópera: Para coibir a roubalheira privada, aumenta-se o saque ao orçamento público, como se não prejudicasse o país da mesma maneira. Especialmente num momento em que se pede sacrifícios à população. Teremos, ao final, mais uma crise, pois o líder do governo, Fernando Bezerra, garantiu que o Bolsonaro vetará qualquer aumento acima de R$ 2,5 bilhões.

Mudando de pato para ganso, há no ar uma forte impressão de que existem semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa, há nove anos, e a atmosfera que se forma agora em torno das propostas de autorização de prisão dos condenados em segundo grau de Justiça, seja em lei ordinária, como se quer no Senado, seja na Constituição, conforme sugestão originária da Câmara.

A voz, ou melhor, a grita corrente, denuncia como manobra protelatória o acordo ainda não escrito entre os presidentes da Câmara e do Senado em prol da concentração de esforços na proposta de emenda constitucional cujo teor, em miúdos, dá à segunda instância o caráter de trânsito em julgado, podendo o réu recorrer de aspectos formais do processo, mas já sem direito pleno à liberdade dado o esgotamento do exame das razões de autoria e materialidade do crime.

O deputado Rodrigo Maia e o senador Davi Alcolumbre estariam, por essa versão, mancomunados com a ala dita garantista do Supremo para fazer a proposta morrer de inanição. Isso porque a ideia defendida por senadores de alterar a legislação ordinária mediante mudanças no CPP seria mais fácil e rapidamente aprovada. Uma emenda constitucional precisa ser votada em dois turnos nas duas Casas e ainda contar com quórum qualificado de 308 deputados e 49 senadores para ser aprovada.

Ocorre que o mais fácil e rápido não necessariamente é o mais seguro. Um projeto de lei aprovado a toque de caixa poderia de novo esbarrar na cláusula pétrea sobre a presunção de inocência e ser derrubado no STF. Não poderia acontecer o mesmo com a emenda constitucional? Poderia, mas, a depender do encaminhamento da coisa, fica mais difícil.

A começar pela consistência de um procedimento resultante de entendimento entre Câmara e Senado. Por mais que admitamos a hipótese de os presidentes das Casas não morrerem de amores pelo assunto, como de resto deixaram bem claro quando o presidente do Supremo jogou a bola para o Congresso, há o peso do conjunto de deputados e senadores, cujos humores são tocados pela opinião pública em casos rumorosos como esse.

E, aqui, chegamos ao ponto inicial da nossa conversa sobre as semelhanças entre o ambiente que levou à aprovação da Lei da Ficha-Limpa e a atmosfera em torno da prisão depois do julgamento em segunda instância. Vejam que Maia e Alcolumbre não puderam deixar o assunto de lado. Foram obrigados a tocar o barco. Da mesma forma como os grandes partidos (PT, MDB e PSDB) da época, que em 2009 se viram forçados a abandonar a proposital indiferença à Ficha-Limpa.

A proposta de iniciativa popular com mais de 1,6 milhão de assinaturas (o triplo do exigido para a criação de partidos) simplesmente dormia em comissão na Câmara sob a vista grossa de suas excelências de governo e oposição. A maioria não queria saber do assunto, e tudo sugeria que não iria adiante até que entrou em cena a opinião do público, incensada por uma ampla campanha de entidades civis, já sob o clima do escândalo do mensalão, cuja denúncia da PGR havia sido aceita em 2007 pelo Supremo (o julgamento seria concluído cinco anos depois).
  
Diante da pressão e com eleições marcadas para o ano seguinte, os parlamentares não tiveram escolha a não ser aderir e aprovar a inelegibilidade de candidatos condenados em segunda instância. Em maio de 2010 a lei foi aprovada na Câmara e no Senado. Tramitação rápida, mas muito mais simples do que a discutida agora por se tratar de questão eleitoral. No entanto, os principais pontos de semelhança — pressão popular, crescente apoio no Congresso e proximidade de eleições — sustentam a impressão de que a autorização de prisão depois da segunda instância é um rio que corre para o mar, não tem volta.

Isso, bem entendido, se houver mobilização da sociedade, debate aprofundado em audiências públicas no Parlamento, boa costura política e consistente fundamento jurídico, a fim de que não se agrida a cláusula pétrea da presunção de inocência e todo o esforço desande sob o crivo do STF, que obviamente será chamado a dar a última palavra quando, e se, a proposta passar no Congresso.

A pressa, nesse caso, pode funcionar como nefasta amiga da imperfeição. Também não seria aceitável a morosidade excessiva, típica das intenções protelatórias, porque o clamor está posto e não deixa margem a dúvida. Cabe às instituições encontrar o melhor jeito de adequar a demanda aos rigores da legalidade.

Sobre as manifestações populares a favor da volta da prisão em segunda instância:



Com Merval Pereira e Dora Kramer

sexta-feira, 17 de agosto de 2018

O AUMENTO DOS MINISTROS DO STF E A CRISE DE VERGONHA NA CARA


Antes da postagem do dia: O juiz Sérgio Moro resolveu adiar para o dia 14 de novembro o interrogatório de Lula e demais réus na ação penal envolvendo o Sito de Atibaia, que estava originalmente marcado para 11 de setembro). Segundo o magistrado “um dos acusados foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro e, apesar disso, apresenta-se como candidato à Presidência da República”; portanto “a fim de evitar a exploração eleitoral dos interrogatórios, seja qual for a perspectiva, reputo oportuno redesignar as audiências”.

Passemos ao tema de hoje:

Depois da repercussão negativa do reajuste que os ministros do STF se autoconcederam na semana passada, espera-se que Congresso reveja o percentual e aprove um limite menor. Se mantidos os 16,38% definidos por suas excelências, seus salários passarão dos atuais R$ 33.763,00 para R$ 39.293,00. Isso quando falta dinheiro para investir em segurança, saúde, educação, habitação e outros serviços públicos que realmente interessam à nação.

Mesmo defasados — segundo a Folha, a perda real chega a 15% em quatro anos —, os vencimentos dos magistrados superam em vinte vezes a média salarial dos trabalhadores tupiniquins (refiro-me aos que ainda tem emprego, naturalmente), o que já é um acinte, mas mais acintoso ainda é o argumento do ministro Lewandowski, para quem os valores recuperados pela operação Lava-Jato comprovam que o trabalho da Justiça tem trazido benefícios monetários ao país que justificam o reajuste.

Vá lá que a patuleia desinformada ignore a crise que o país atravessa, mas os ministros do Supremo não se podem dar a esse luxo. Mesmo que a capital federal — graças ao ex-presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira — seja um mundo à parte, nada justifica que os ilustres magistrados elevem seus proventos sem levar em conta a situação calamitosa das finanças públicas (somente a presidente Carmen Lúcia, a ministra Rosa Weber e os ministros Celso de Mello e Luís Edson Fachin foram contrários ao aumento).

Mas não é só. Promotores, procuradores e servidores de outras categorias do Judiciário têm seus salários atrelados ao dos ministros. Mantido esse reajuste, o aumento dos gastos chegaria a R$ 720 milhões por ano. Como o presidente da República, os ministros de estado e as ratazanas do Congresso também têm seus vencimentos baseados nesse “teto constitucional”, o rombo passaria dos R$ 3 bilhões — isso sem mencionar que outras categorias do funcionalismo certamente pleiteariam em juízo a concessão de reajustes similares.

Cerca de 70% da despesa primária do governo advém do pagamento de salários e aposentadorias. Como uma PEC aprovada pelo Congresso — quando Temer ainda tinha cacife político — proibiu o aumento o aumento indiscriminado dos gastos, esse reajuste teria de ser compensado com cortes nos 30% restantes, que são as despesas com saúde, educação, investimentos etc. É certo que esse escárnio ainda precisa ser aprovado pelo Senado e sancionado pelo presidente da República, mas é igualmente certo que o lobby do funcionalismo é poderosíssimo — tanto é que foi o grande responsável pelo malogro da reforma da Previdência, que previa isonomia entre a aposentadoria de servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada. Vale lembrar que, enquanto o aposentado “comum” recebe, em média, R$ 1,2 mil por mês, um servidor da União inativo embolsa sete vezes mais — sem mencionar as mordomias e outros penduricalhos.

Observação: Quando os ministros do STF ou outras categorias privilegiadas recebem vantagens como salários mais altos, aposentadorias polpudas, pensões para suas filhas solteiras e acintes que tais, alguém está pagando a conta. E o custo de um Estado que desperdiça ou paga salários fora da realidade não recai apenas sobre o lombo dos contribuintes — em geral, de classe média e empregados. Um Estado dominado por elites de rapina impõe custos ao resto da sociedade e destrói empregos que existiriam se a dívida pública ou os impostos não fossem tão altos.

Na quinta-feira 9, o relator no Congresso do projeto que serve de base para a elaboração do Orçamento, senador Dalírio Beber, afirmou que não há espaço para reajustes salariais de servidores públicos no ano que vem — nem para atender as despesas existentes, que dirá das a serem criadas. Quando foi relator Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2019, aprovada em julho pelo Congresso, Beber tentou incluir uma proibição de reajustes de servidores no texto, que seria uma blindagem contra o oportunismo que vemos no Supremo. Não obstante, como diz o ministro Gilmar Mendes, “nós somos supremos”.

Então, fazer o quê?

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