sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

QUE PAÍS É ESTE?



No apagar das luzes do ano legislativo, a Câmara aprovou por esmagadora maioria o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, menina dos olhos do ex-juiz da Lava-Jato e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública. Lamentavelmente, foram retiradas do texto a Legitima defesa — que propunha a alteração do Código Penal para permitir “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” se o excesso em ações de autoridades públicas decorresse “de escusável medo, surpresa ou violenta emoção” —, a prisão após segunda instância — que dispensa explicações — e o plea bargain — confissão dos suspeitos de terem praticado crimes em troca de uma pena menor, sem necessidade de julgamento.

Como se vê, os efeitos detergentes promovidos pelo eleitorado no ano passado foram insuficientes. Prova disso é que o todo poderoso presidente da Câmara, Rodrigo Maia, citado como Botafogo nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht, que raramente vota, passou a presidência da sessão de ontem da Câmara ao deputado Marcos Pereira para votar a favor de um destaque que institui o juiz de garantias ao processo penal — que, em tese, “fiscaliza” a legalidade da investigação.

O fato é que, desde sempre, vimos dando a Herodes acesso à chave do berçário. Veja, por exemplo, a institucionalização do mensalão pelos punguistas do parlamento, sempre prontos a bater a carteira dos "contribuintes". A despeito de faltar dinheiro para tudo, do papel higiênico nas repartições ao giz nas escolas, passando pela saúde e segurança públicas, os nobilíssimos congressistas aprovaram o relatório preliminar que aumenta para R$ 3,8 bilhões o fundo eleitoral em 2020.

Para inflar os recursos das campanhas municipais, o Congresso prevê cortes em saúde, educação e infraestrutura. O Executivo desejava destinar R$ 2 bilhões para custear as disputas locais, mas presidentes e líderes de partidos que representam a maioria dos deputados e senadores articularam a elevação do valor do fundo em R$ 1,8 bilhão. O novo montante irá ainda à votação do relatório final na Comissão Mista do Orçamento, após o que o plenário do Congresso analisará a proposta em sessão prevista para o dia 17 de dezembro. Se mantido esse valor, o fundo será mais que o dobro em relação a 2018, quando foram distribuídos R$ 1,7 bilhão aos candidatos. O dinheiro sai do caixa da União (ou seja, do nosso bolso, pois o governo não gera recursos, apenas os administra).


"Nas democracias, as eleições precisam ser financiadas, e o financiamento privado está vedado. É preciso construir no financiamento público, mas tem de se verificar o valor e de onde virá o recurso para que a sociedade compreenda com o mínimo de desgaste possível para o Congresso", disse Botafogo. Se o Congresso não recuar, Jair Bolsonaro dificilmente vetará esse trecho do projeto, pois ele foi escrito (marotamente) de tal forma que seria preciso barrar todos os recursos para o financiamento das campanhas em vez de um veto parcial. E viva o povo brasileiro!

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Do jeito que as coisas vão, ainda vamos acabar com um problemão. É o que acontece quando a ciência dos “especialistas” diz uma coisa, e a vida real diz outra — no caso, como se ouve há onze meses, “o extremismo neoliberal” do governo em geral e do ministro Paulo Guedes em especial está “destruindo os sonhos” da população e arruinando a economia brasileira, provavelmente para sempre.

Só que está dando o contrário a cada vez que um dado oficial do desempenho da atividade econômica é divulgado: o que tinha de ser ruim, quando a gente vai ver, é bom. Acabou de acontecer com o resultado do PIB, que cresceu 0,6% no terceiro trimestre deste ano, o maior avanço desde o primeiro trimestre do ano passado. Para piorar, o desemprego também está caindo.

A solução para os “especialistas” é dizer que os números foram “uma surpresa”, ou “atípicos”, ou alguma bobagem desse tipo. Ou seja: nós estávamos certos, mas a realidade está errada. Outra saída é dizer que os níveis e crescimento “tendem a não se sustentar”. É muito usado também, no caso da queda do desemprego, dizer que está aumentando o “trabalho informal”, como se ganhar a vida por conta própria não fosse trabalhar.

Em relação às vendas de Natal, que estão com cara de bombar, a desculpa é que o “Natal é temporário”. Enfim, todo e qualquer avanço é condenado como “lento demais” — sem que ninguém consiga dizer em que outro lugar do mundo o ritmo de crescimento está na velocidade desejada pelos analistas.

Quer perder o seu tempo? Continue lendo e ouvindo quem lhe diz que essa “situação aí” está muito difícil.

Alguém precisa avisar a uma parte dos nossos comunicadores sociais que houve uma eleição para presidente da República um ano atrás, que um dos lados presentes no turno final ganhou, e que, em consequência desse fato, adquiriu o direito de fazer nomeações para cargos da administração federal que não exijam aprovação dos demais poderes, passagem por concurso público e outras exigências legais.

Ministros, por exemplo, mandarins do segundo escalão e mais uma infinidade de cargos da máquina estatal, podem ser escolhidos pelos vencedores das eleições segundo os critérios que acharem mais acertados — mesmo porque é isso, justamente, que os eleitores esperam que seja feito pelo candidato em que votaram. Nenhum desses fatos, porém, parece estar claro até agora para uma porção de gente boa nesse país.

Temos assim, a cada vez que alguém é nomeado para alguma função no bonde da União, um coro escandalizado de protestos – fulano de tal, escolhido para o cargo tal, “é de direita”. Ah, não diga — e daí? Esperavam o que? Que fosse de esquerda? Um não serve porque é contra as drogas e não gosta de rock. Outro, porque acha que a proclamação da República foi um golpe militar, ou é contra o aborto, o feriado da “Consciência Negra", o aumento das reservas indígenas, ou acha que a agricultura precisa de fertilizantes e defensivos químicos para produzir alguma coisa.

Mas são pessoas assim, e não o seu contrário, que a maioria dos eleitores quer ver no governo. Essa maioria pensa como elas. Imagina que estão corretas. Acha que deveriam ter sido nomeadas exatamente pelas razões que seus críticos invocam para dizer que não deveriam. Ou é isso, ou então vai ser preciso chamar aquela menina sueca para o Ministério do Ambiente.

Com J.R. Guzzo.